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sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Código Penal completa 75 anos em transformação e precisando de novas mudanças

O CP passou por alterações, mas especialista acredita ser necessário muito mais para atualizá-lo
Eduardo Velozo Fuccia / A Tribuna
Traficante e viciado já foram equiparados com o mesmo tratamento penal. Traição conjugal era considerada crime de adultério. Manter relação sexual consentida com mulher virgem maior de 14 anos e menor de 18, aproveitando-se de sua suposta ingenuidade ou confiança, caracterizava o delito de sedução.
Já revogadas, essas situações eram previstas na redação original do Código Penal (CP), que nesta segunda-feira (7) completa 75 anos de edição, embora tenha entrado em vigor no dia 1º de janeiro de 1942. O mais importante diploma legal em matéria penal do Brasil sofreu várias alterações ao longo do tempo e perdeu crimes para leis específicas. 
Um exemplo dessas perdas, os compositores Moacyr Bombeiro e Popular P. transformaram em versos, na letra de Malandragem dá um tempo. Imortalizados na voz do sambista Bezerra da Silva e na regravação do grupo Barão Vermelho, eles contam que “o 281 foi afastado, o 16 e 12 no lugar ficou (sic)”.
Para quem não tem familiaridade com o universo jurídico, cabe a explicação: 281 era o artigo do CP que tratava sobre o “comércio clandestino ou facilitação de uso de entorpecente”, não diferenciando as figuras do usuário e do traficante. Porém, com o advento da Lei 6.368, de 1976, ele foi revogado.
Primeira a tratar especificamente sobre a questão das drogas, a nova legislação previu com penas distintas nos artigos 12 e 16, respectivamente, as condutas de quem trafica e de quem apenas porta drogas para consumo próprio. A Lei 6.368/76 foi substituída pela 10.409, de 2002, que, por sua vez, foi revogada pela Lei 11.343, de 2006.
Duas partes
Outros crimes tratados inicialmente no CP também migraram para leis penais esparsas, como são chamadas aquelas que não estão embutidas no código. Atualmente, elas passam de 100. Como alguns exemplos, podem ser citados o Estatuto de Desarmamento, a Lei de Crimes Hediondos e o Código de Trânsito Brasileiro.
Elaborado durante o Estado Novo, no Governo de Getúlio Vargas, o CP tem duas partes: a Geral, que dispõe sobre a aplicação da lei penal e foi completamente repaginada com a reforma instituída por lei de 1984, e a Especial, que define os crimes e estabelece as suas penas, sendo alterada pontual e gradativamente.
Algumas transformações do texto original do CP decorrem de comportamentos antes reprimidos, que passaram a ser socialmente aceitos ou tolerados. O fato de o código ser de um tempo no qual não se cogitava o crime como atividade empresarial, como se verifica atualmente nas facções criminosas, contribui para outras mudanças. 
Entrevista
Doutor e mestre em Direito Penal, respectivamente, pela Universidade Complutense de Madri e pela Universidade de São Paulo, o cientista criminal Luiz Flávio Gomes não reúne apenas experiência acadêmica. Também militou como promotor de Justiça, juiz de direito e advogado, acumulando visão ampla sobre a matéria.
Em entrevista para A Tribuna, Luiz Flávio discorre sobre os 75 anos do CP e defende a edição de um novo código, mas salienta que, por si só, uma nova legislação não é suficiente para solucionar problemas. “Não basta uma lei moderna. As pessoas têm que ter certeza do castigo, o que não acontece no Brasil”, justifica.
Considerando o seu tempo de existência, o contexto histórico do País na época de sua elaboração e as alterações já sofridas, o Código Penal está ultrapassado ou só virou uma colcha de retalhos?
Extremamente desatualizado. Hoje há mais crimes fora do Código Penal do que dentro. São tantas as leis especiais, que ele se tornou subsidiário. A legislação penal no Brasil está confusa.
Eventual edição de um novo CP, mais moderno e adequado à realidade, surtiria o efeito desejado, ou dependeria da atualização de outras legislações, como a Lei das Contravenções Penais, o Código de Processo Penal e a Lei de Execução Penal?
Por si só, o Código Penal não previne a delinquência, porque o crime existe com ou sem ele. Não existe estrutura para aplicar a lei e a polícia deve ter melhores condições. A grande maioria dos delitos não é investigada e processada. Impera a impunidade. Mas sou a favor que se revogue a Lei das Contravenções Penais e tudo seja juntado em um só código.
Então, o senhor defende a extinção das leis especiais, que tratam sobre determinados crimes, para tornar a legislação penal mais enxuta e melhor sistematizada?
Sim, tudo estando no Código Penal facilitaria. Mas também é preciso preencher as lacunas existentes, porque não existe no Brasil, por exemplo, o crime de terrorismo. Também é preciso revogar, como já disse, as contravenções e os crimes que deveriam ser tratados como infrações de mero caráter administrativo, como o do Artigo 164 (introdução ou abandono de animais em propriedade alheia).
Em linhas gerais, um novo código penal deveria ser guiado por quais diretrizes?
Todos os crimes que envolvam a vida humana, que são violentos, devem ter uma execução (regime de cumprimento de pena) mais severa. Para o resto, penas alternativas são suficientes. A exceção fica por conta dos delitos relacionados à corrupção, cujo empobrecimento do réu é pena mais eficaz do que a prisão. Nestes casos, o criminoso deve perder tudo.
E o tráfico de drogas?
O empobrecimento do réu também é a melhor solução, porque os traficantes objetivam lucro e muitas vezes atuam com estrutura de empresa. As penas devem ser mais rigorosas apenas quando o crime envolver menores.