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sábado, 2 de março de 2019

Moro se encolhe diante da histeria nas redes sociais e revela fragilidade

A valentia que sobrava ao juiz desapareceu no primeiro episódio em que sua autoridade foi colocada em xeque como ministro da Justiça de Jair Bolsonaro

Sergio Moro

Ilona Szabó
Conhecida apenas em, círculos restritos, apesar de seu invejável currículo de pesquisadora na área da segurança pública, Ilona Szabó transformou-se, graças à histeria das redes sociais, na mulher que expôs a fragilidade do ministros da Justiça, Sergio Moro, no confuso jogo de forças do governo de Jair Bolsonaro. Um dia depois de nomear Ilona como suplente no Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, onde seria uma entre 26 membros, Moro foi obrigado a recuar por determinação de Bolsonaro. Pressionado por uma corrente de histeria nas redes sociais, Bolsonaro decidiu com o fígado, sem avaliar o prejuízo para a imagem do seu ministro mais popular.
Horas antes, em entrevista ao Gaúcha Atualidade, Moro havia defendido a indicação de Ilona com o argumento de que um conselho consultivo precisa de vozes plurais. Argumento irretocável: se todos os membros de um conselho pensam igual, morre o debate. Ao final da frase, fez uma ressalva de que a nomeação ainda estava sendo avaliada.
Cientista política com mestrado em estudos de conflito e paz pela Universidade de Uppsala, na Suécia, Ilona Szabó nada perde com a desnomeação. Ao contrário, ganhou uma visibilidade que não tinha no Instituto Igarapé, como especialista em redução da violência e política de drogas. O ministro, sim, perde estatura e abre margem para que se questione sua capacidade de influenciar o governo em questões cruciais do país, já que sucumbiu em um episódio menor.
Na mesma entrevista ao Atualidade, Moro já havia titubeado na resposta a uma pergunta sobre o porte de armas. Disse que não poderia falar em abstrato, ainda que a questão fosse concreta: como ministro da Justiça, é contra ou a favor à liberação do porte de armas? O abrandamento do discurso em relação ao caixa 2, como se não tivesse qualquer relação com corrupção, já havia plantado uma semente de desilusão entre os admiradores do juiz, que viram com preocupação a sua mudança de lado, já que no governo ficaria sujeito às injunções políticas.
Se para a retirada da criminalização do caixa 2 do pacote anticrime e sua apresentação em projeto à parte havia uma justificativa prática, a de que poderia atrapalhar a aprovação de outras medidas, para a desnomeação de Ilona Szabó a explicação é bizarra: "repercussão negativa em alguns segmentos". Equivale a dizer que o governo age movido pelo som dos tambores nas redes sociais e não avalia o estrago de queimar a imagem de um dos ministros mais importantes. 
Regidos pelo maestro Olavo de Carvalho, de seu púlpito nos Estados Unidos, seguidores de Bolsonaro nas redes sociais regozijam-se de ter conseguido excluir "do governo" uma inimiga que fez campanha pelo desarmamento, acha que presos devem ser tratados com dignidade para que não saiam da prisão mais violentos do que entraram, questiona os resultados da política nacional antidrogas e não votou em Bolsonaro. Dois filhos do presidente engrossam o coro dos que que celebram o recuo usando a hashtag #grandedia, como se a capitulação de Moro fosse a salvação do governo na guerra santa contra a mídia. 
Naturalmente, esse movimento não é uniforme entre os bolsonaristas, mas teve força suficiente para fazer o presidente desautorizar Moro. O general Paulo Chagas, candidato derrotado do PSL ao governo do Distrito Federal, fez um alerta interessante em seu perfil no Facebook, ao abordar o assunto:
"Se estamos convictos de que o desarmamento está errado, nossa obrigação é vencer os argumentos dos desarmamentistas em debates francos e públicos, caso contrário esse Conselho será mais uma convenção de convencidos, natimorto para o fim a que se destina e tão ridículo quanto foi a tal Comissão da Verdade! Vencer sem enfrentar o adversário não é vitória nem luta, é mero exercício físico ou de retórica!"
 NOTA DO MINISTÉRIO
"O Ministério da Justiça e Segurança Pública nomeou Ilona Szabó, do Instituto Igarapé, como um dos vinte e seis componentes do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), órgão consultivo do Ministério. A escolha foi motivada pelos relevantes conhecimentos da nomeada na área de segurança pública e igualmente pela notoriedade e qualidade dos serviços prestados pelo Instituto Igarapé. Diante da repercussão negativa em alguns segmentos, optou-se por revogar a nomeação, o que foi previamente comunicado à nomeada e a quem o Ministério respeitosamente apresenta escusas. Assessoria de Comunicação do Ministério da Justiça e Segurança Pública"
NOTA DE ILONA SZABÓ
"Ganha a polarização. A pluralidade é derrotada.
Agradeço o convite do Ministro Sergio Moro para compor o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), e lamento não poder assumir o mandato devido à ação extremada de grupos minoritários. O país precisa superar a intolerância para atingir nossos objetivos comuns na construção de um país mais justo e seguro.
O Instituto Igarapé desde sua fundação trabalha de forma independente e em parceria com as instituições de segurança pública e justiça criminal no Brasil e em diversos países do mundo. Continuaremos abertos a contribuir com interlocutores comprometidos com políticas públicas baseadas em evidências. O Brasil, mais que nunca, precisa do diálogo democrático, respeitoso e plural. Ilona Szabó, diretora-executiva do Instituto Igarapé."

sexta-feira, 27 de abril de 2018

Os presos com as maiores condenações no RS

Sentenças ocorreram por assalto a carro-forte, estupro de crianças, homicídios e tráfico de drogas

Os dez presos com o maior tempo de condenação no Rio Grande do Sul têm perfis distintos: assaltante de carro-forte, estuprador de crianças, homicidas e traficante de drogas. Juntos, somam mais de dois mil anos de pena.
Por lei, o tempo de cumprimento da pena não pode ser superior a 30 anos. Caso ocorram novas condenações, as penas serão unificadas para que o limite máximo seja atendido. Entretanto, o professor de direto penal e procurador de Justiça Criminal do Ministério Público, Gilberto Thums, observa que, mesmo com isso, os presos podem ultrapassar os 30 anos encarcerados.
"É plenamente possível que o preso permaneça 50 anos na cadeia. Mas ele não está preso por um crime só ou pelos crimes que ele foi inicialmente condenado, são mais outras condenações. Ninguém fica preso mais de 30 anos por causa de um crime" — salienta o professor da Fundação do Ministério Público (FMP). 
Thums explica que a unificação das penas altera o dia da contagem da pena e, com isso, o prazo de 30 anos começa a valer partir dali. Para o professor, o limite de 30 anos é considerado como "luz no túnel" para o preso, uma "esperança" para ganhar liberdade.
Por outro lado, o preso pode conseguir a redução da pena ao trabalhar ou estudar enquanto está preso. Cada três dias de trabalho significa a redução de um dia da sentença. A possibilidade é conhecida como remição da pena. 

Veja lista com os 10 presos que receberam as maiores penas no RS

Número 1 - Adriano da Silva

Idade: 40 anos

Pena: 264 anos e 5 meses

Conhecido por "serial killer de Passo Fundo", Adriano da Silva foi sentenciado pela morte de nove meninos na região norte do estado. Os crimes ocorreram entre agosto de 2002 a janeiro de 2004. Dos nove assassinatos, seis ocorreram em Passo Fundo e outros três em Sananduva, Soledade e Lagoa Vermelha. 
O criminoso tinha o costume de asfixiar as vítimas até a morte e depois ocultar o corpo. Para atrair as vítimas, oferecia dinheiro ou algum trabalho em lugar ermo, como um moinho desativado ou uma fazenda. Normalmente escolhia vítimas de origem humilde.
O homem também se valia da força e de técnicas de artes marciais para imobilizar as vítimas. Em 2006, ele afirmou à justiça que cometia os crimes por "vício de matar". 
Silva é paranaense, onde foi sentenciado pelo roubo seguido de morte de um taxista em 2001. Ele  cumpriu seis meses de pena, mas acabou fugindo da prisão, vindo para o Rio Grande do Sul, onde passou a usar nomes falsos. Para esse latrocínio, a pena foi fixada em 27 anos de prisão. 
Hoje ele está preso na Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc), a 58,5 quilômetros de Porto Alegre. Até o momento já cumpriu 15 anos de prisão.

Número 2 - Edgar da Silva Freitas

Idade: 46 anos

Pena: 263 anos

Conhecido por Jacaré, Edgar da Silva Freitas já acumula 29 condenações que lhe renderam 263 anos de prisão.  A primeira sentença saiu em agosto de 1992, quando ele tinha 20 anos. Foi condenado a seis meses no regime semiaberto por um crime contra a administração pública. Menos de dois meses depois, em 9 de abril, saiu condenação por furto, a ser cumprida no regime semiaberto.  
Antes daquele mês terminar, Jacaré acabou matando uma pessoa. Mas a sentença só acabou saindo em 1995. Além desse, há outros dois assassinatos em sua ficha criminal, cometidos em 1992 e 1995. Para esses crimes, as penas variam entre cinco a oito anos.  
Ele também se envolveu em um latrocínio (roubo seguido de morte) ocorrido em 2007 em Carazinho, no norte do Estado. Com esse e outros crimes associados, Jacaré acabou acumulando inicialmente 70 anos de pena - a maior condenação de todo histórico criminal. Além dele, outras três pessoas participaram do crime, um deles um adolescente de 15 anos. O grupo roubou R$ 200 e um relógio de um homem, que depois foi morto. 
Além de assassinatos e roubos, Jacaré também responde por um estupro. O crime ocorreu em 1999, na região central do Estado, e rendeu 12 anos de prisão. 

Número 3 - Antônio Nunes Pereira 

Idade: 40 anos

Pena: 205 anos e três meses

Conhecido por Toninho, era líder das gangues dos mixarias, ligada ao tráfico de drogas na zona leste de Porto Alegre. Tem envolvimento na morte de ao menos dez pessoas e acumula 13 condenações. Em 2003, matou um homem enquanto dormia. Segundo a sentença, a vítima estava cuidando de uma casa de um desafeto do grupo quando foi assassinada. "Impuseram verdadeiro Estado paralelo, mantendo a população da localidade amedrontada. Diversas famílias tiveram de deixar a região", observa a decisão judicial. Por esse crime, foi condenado a 16 anos e seis meses por homicídio qualificado, cometido por motivo torpe, vingança, e mediante recurso que dificultou a defesa da vítima.
Outra vítima foi morta no meio da rua por não pagar dívida com o tráfico de drogas. O crime ocorreu em setembro de 2004. O mesmo aconteceu com Jorge Luís Macedo Mauer, em setembro de 2003. Antes de ser assassinato, a vítima foi torturada, sendo amarrada, colocada no porta-malas de um carro e levada para um local isolado, segunda denúncia do MP. Ali foi espancada com chutes e pontapés e morto. A companheira dele afirmou que o homem foi assassinado por dívida de R$ 50. 
A última morte ocorreu em abril de 2005. Na época, Toninho matou a tiros um adolescente com a ajuda de cinco comparsas na Quinta do Pontal, zona leste de Porto Alegre. Segundo a denúncia do Ministério Público, a vítima pertencia a mesma facção dos seis envolvidos e tinha "conhecimento de diversos fatos delituosos". Por esse crime, foi condenado a 19 anos de prisão. 

Número 4 - Osmar Gilvan Silva de Lima

Idade: 48 anos

Pena: 204 anos e sete meses

Considerado um dos assaltantes mais perigosos do Rio Grande do Sul, conta com 25 condenações por crimes cometidos em diversas cidades gaúchas e catarinenses. Em pelo menos dois roubos, também estuprou as vítimas. Um dos casos ocorreu em 1997, em Giruá, no norte do Estado. Só pelo estupro foi condenado a 10 anos de prisão e foi sentenciado a mais 17 anos de reclusão por formação de quadrilha e roubo; somando 27 anos. O outro caso de estupro, em meio a um assalto, ocorreu em 1999, em Catuípe, no noroeste do Estado. Pelos crimes foi condenado a sete anos e seis meses de detenção. 
Em roubo em Abelardo Luz, no oeste de Santa Catarina, também teve envolvimento em um sequestro. Devido aos crimes, foi condenado a mais de 12 anos de prisão.
Além dos roubos, o criminoso responde por dois processos por tráfico de droga. Um deles foi por uma situação ocorrida em janeiro de 2005. Na época, foram encontradas duas pedras de crack, pesando 64 gramas, na porta da cela em que cumpre pena na Pasc. Quatro meses depois foi apreendido com ele 70 gramas de maconha, que seria negociada por com outros presos da Pasc. A droga foi encontrada em um buraco embaixo da cama, coberto  com uma tampa de concreto. 
Hoje, Osmar está preso no regime fechado na Pasc. Por trabalhos feitos na penitenciária, já conseguiu reduzir 682 dias da pena. Entretanto, em sua ficha criminal constam 292 dias em que esteve na condição de foragido. 

Número 5 - Nelson Paz dos Santos

Idade: 49 anos

Pena: 204 anos e quatro meses

Cometeu série de roubos e sequestros entre o final da década de 1980 e começo da década de 1990. Por um dos crimes, ocorrido na região de Alegrete, foi condenado a 37 anos de prisão - considerada a maior pena de seu histórico criminoso. Pelo último roubo antes de ser preso, em maio de 1990, foi condenado a 12 anos e seis anos de reclusão.
Após ficar 22 anos preso, obteve indulto, deixando a penitenciária em maio de 2011. Menos de dois meses depois, participou com comparsas de um assalto à praça de pedágio de Farroupilha, na serra gaúcha. O crime ocorreu durante a madrugada, com uso de fuzis e pistolas. O grupo levou dinheiro das cabines e de um cofre, que foi aberto com explosivos. Na fuga, houve perseguição e troca de tiros com policiais, mas o grupo acabou preso em um matagal no interior de Caxias do Sul. Só pelo roubo, foi sentenciado a mais de oito anos de prisão. Ainda foram acrescidos a pena cinco anos de prisão pelo crime de resistência à prisão e mais três anos por formação de quadrilha. 
Até agora, Santos já cumpriu 32 anos da pena, de acordo com o relatório do Tribunal de Justiça, e cumpre a condenação na Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc), na Região Carbonífera. Em março do próximo ano deve ter progressão de pena, o que precisa ser analisado pelo judiciário antes de ser atendido.

Número 6 - José Carlos dos Santos

Idade: 38 anos

Pena: 188 anos e 10 meses

A habilidade que José Carlos dos Santos adquiriu pilotando retroescavadeiras teria sido um dos motivos que levou o candelariense a se envolver no ataque a carros-fortes no início dos anos 2000. A técnica mais usada pelo bando consistia em arremessar um caminhão contra o blindado, em local ermo, e bloquear a via com outro veículo para impedir a chegada da polícia. Em poucos anos, Seco deixaria de lado o apelido de "Zé das Retros" e se tornaria o foragido número 1 do Estado por conta dos ataques a bancos e carros-fortes
A prisão do assaltante ocorreu em 13 de abril de 2006, em um posto de combustíveis às margens da BR-386, em Paverama, no Vale do Taquari. Em um cenário de guerra, o criminoso e um comparsa dentro de um Audi, embretados no posto, trocaram tiros de fuzis com quatro policiais civis. A poucos metros, clientes de um restaurante se jogaram no chão para não serem atingidos pelos tiros. Os dois assaltantes acabaram baleados e capturados. Por este confronto, Seco foi condenado a 28 anos e quatro meses de prisão. 
Três dias antes, na noite de 10 de abril, um bando liderado por Seco tinha atacado a sede da transportadora de valores Proforte, em Santa Cruz do Sul, no Vale do Rio Pardo. Um caminhão-guincho foi arremessado contra a parede do bunker, o que permitiu que os criminosos invadissem o local e roubassem R$ 4 milhões. Armados com fuzis, dispararam na direção de uma viatura da Brigada Militar, mataram o capitão André Sebastião Santos dos Santos, 34 anos, com um tiro na cabeça, e feriram outra policial.  
Pelo ataque à transportadora e a morte do oficial, Seco foi condenado a 36 anos e três meses de prisão. Mas ele acumula nove condenações por crimes cometidos em diferentes cidades gaúchas, como Veranópolis, na Serra, onde um ônibus com estudantes foi usado para interceptar um carro-forte, em 2005. O assaltante, que passou mais de uma década na Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc), integrou em julho do ano passado a leva de criminosos que foram encaminhados para presídios federais, durante a Operação Pulso Firme

Número 7 - Sandro Alixandro de Paula

Idade: 34 anos

Pena: 186 anos e 10 meses

Natural de Mato Grosso do Sul, já acumula 25 condenações, a maioria por roubo. Em um dos assaltos por pouco não matou três policiais militares. O crime ocorreu em Marau, no norte do Estado em 2003. Segundo a denúncia do Ministério Público, ele e três comparsas _ um deles uma mulher – tentaram cometer um assalto. Os criminosos fugiram quando perceberam aproximação policial. Houve perseguição e na fuga, disparam em direção aos PMs, que revidaram. De Paula conseguiu fugir com três comparsas, mas a mulher acabou presa. Só por esse crime foi condenado a 19 anos e nove meses de prisão. 
Também foi condenado por extorquir vítimas de roubo de veículo, por pelo menos dez vezes, em um esquema coordenado dentro da Penitenciária Estadual do Jacuí (PEJ). Do lado de fora da prisão, a extorsão também ocorria próximo de estações de trem em Canoas. O esquema tinha a participação de um policial militar, que acessava o sistema de Consultas Integradas - a partir da senha de um colega - e obtinha dados de veículos roubos e furtados na época. Uma das vítimas chegou a entregar R$ 6,5 mil. Por esse crime, a sentença foi de mais de 10 anos de prisão. 


Número 8 - Paulo Sérgio Guimarães da Silva

Idade: 47 anos 

Pena: 184 anos e 10 meses 

O serial killer Paulo Sérgio Guimarães da Silva, o Titica, que ficou conhecido como o Maníaco da Praia do Cassino, em Rio Grande, acumula 184 anos e 10 meses de condenação, pelo assassinato de sete pessoas, um estupro, três roubos e duas tentativas de roubo. Os crimes foram cometidos entre dezembro de 1998 e março de 1999, na praia do Cassino, no litoral sul do Estado. Uma adolescente, de 14 anos, foi atingida por um disparo na nuca e ficou tetraplégica. O caso levou pânico à cidade por meses 
Em 11 de dezembro de 1998, os estudantes Felipe Martins dos Santos, 21 anos, e Bárbara Oliveira da Silva, 22, foram mortos com três tiros de revólver calibre 38 cada um. Os corpos foram deixados ao lado do Palio do rapaz na beira da praia do Cassino. Em 10 de março de 1999 os servidores da Justiça Federal do município Márcio Rodrigues Olinto, 30 anos, e Anamaria Xavier Soares, 31, foram feitos reféns e levados para Pelotas, onde foram mortos com disparos de pistola na nuca. Dez dias depois, o estudante Petrick de Castro Almeida, 18 anos, é morto com um tiro na nuca quando caminhava à noite na beira da praia do Cassino com uma amiga. A adolescente sobreviveu, mas fica tetraplégica. Seis dias após, o vendedor de revistas de Porto Alegre Sílvio Luiz Kleinberg Ibias, 36 anos, e a professora de Rio Grande Adriana Nogueira Simões, 28, foram mortos com tiros de pistola, e os corpos, abandonados nos molhes da Barra de Rio Grande. 
O pescador se dizia inspirado no motoboy paulista Francisco de Assis Pereira, o Maníaco do Parque, condenado a 124 anos de cadeia por estupros e assassinatos de mulheres. No dia em que foi capturado, o Maníaco do Cassino relatou com detalhes à polícia, como tinha assassinado suas vítimas. O pescador da cidade de Rio Grande contou que após matar, esperava a polícia chegar ao local do crime para ver o que as pessoas da comunidade iriam comentar. Capturado em abril de 1999, ele foi transferido para a Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (PASC), onde segue preso. 

Número 9 - Alcione Romero Garcia

Idade: 52 anos

Pena: 171 anos e 9 meses 

Tem 31 condenações por crimes cometidos em Porto Alegre, sendo 27 delas por crimes ocorridos principalmente entre os anos de 2004 e 2005. Das condenações, 26 são por roubo e extorsão.
Em um dos crimes, levou mais de R$ 20 mil em joias de um apartamento no bairro Bela Vista, na Zona Norte. Na época, Alcione e um comparsa renderam a zeladora do prédio e, para ter acesso à moradia, fizeram com que ela chamasse uma das funcionárias do apartamento até a entrada do edifício. Quando a mulher desceu, outras duas empregadas de outros apartamentos chegaram ao prédio. Todas foram rendidas e levadas até a moradia, onde havia outra faxineira. Inicialmente elas foram mantidas no quarto do casal e depois, três delas foram trancadas em um banheiro. As outras duas acompanharam os criminosos até a saída para fuga. Além de joias, a dupla levou relógios, filmadora, máquina fotográfica e computador de mão, um casaco de couro e tênis. Por esse crime, Alcione foi condenado a dez anos de prisão. 
Em 2014, o Ministério Público pediu a unificação das penas de oito processos. A justificativa para os pedidos era a semelhança entre os crimes e a ocorrência em datas próximas. Dois deles ocorreram com diferença de três dias, um no bairro Moinhos de Vento, e outro, no Rio Branco.
O Ministério Público salientou semelhanças entre os crimes: com uso de arma de fogo, ameaça às vítimas e roubo de bens, e sempre com a companhia de um comparsa e de outras pessoas não identificadas. Entretanto, os desembargadores do Tribunal de Justiça (TJ-RS) entenderam que as similaridades "não autorizam o reconhecimento da continuidade delitiva, tendo em vista que, claramente, concretizou-se uma situação de reiteração delitiva".  Hoje, está na Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc).  

Número 10 - Cleber Renato Vilela de Oliveira

Idade: 60 anos

Pena: 165 anos e 10 meses 

Cumpre pena desde 1977, mas já escapou da prisão diversas vezes, quando aproveitava para cometer crimes. Em janeiro de 1988, matou uma pessoa na região de Bagé e, um mês depois, participou de um assalto que resultou na morte outra pessoa. Pelos dois crimes, foi condenado a 39 anos de prisão.
Em outra fuga, estuprou três mulheres na Galeria Malcon, no Centro de Porto Alegre, em um intervalo de pouco mais de um mês, entre novembro e dezembro de 2003. As vítimas eram abordadas pelo homem, levadas até uma sala vazia e obrigadas a manter relações sexuais com ele. Segundo a denúncia do Ministério Público, as mulheres eram ainda ameaçadas por Oliveira, que estava armado. Uma das vítimas chegou a ser vendada durante o estupro. Além dos crimes sexuais, ele também roubou dinheiro, celular e pertences das vítimas. Só foi capturado no final de janeiro de 2004. 
Oliveira foi condenado a mais de 17 anos de prisão pelos estupros, oito anos por atentado violento ao pudor e 13 anos por roubo. Após o crime, uma das vítimas chegou a processar o Estado uma vez que o crime ocorreu após fuga do sistema prisional. Entretanto, os desembargadores do TJ-RS entenderam que não ficou comprovado "nexo causal entre a fuga do apenado e o estupro, tão pouco ficou demonstrada a culpa do Estado". Com isso, a vítima teve que pagar ainda R$ 800 das custas processuais. 
Por já ter cumprido mais de 30 anos de prisão, a defesa pediu diversas vezes a progressão de regime de Oliveira. Entretanto, todos foram negados. A última recusa veio do Superior Tribunal de Justiça, em 16 de abril deste ano. Hoje ele está preso no Presídio Regional de Bagé.

domingo, 22 de abril de 2018

Depois de 10 anos...o IGP terá uma obra de estrutura de sete andares toma forma na entrada de Porto Alegre

Ficha técnica
Sete andares
40,6% das obras concluídas
11.734.44 m2 de área construída
Valor da obra – R$ 28, 97 milhões
Repasse da União – R$ 25, 92 milhões
Do Estado – R$ 3,052 milhões

Cimento, poeira, pedreiros, engenheiros, arquiteto e barulho. Próximo à entrada de Porto Alegre, um prédio de sete andares toma forma. Em construção, o edifício que custará
R$ 28,9 milhões é uma das promessas para mudar o cenário da perícia criminal no Estado. Hoje, o Instituto-Geral de Perícias (IGP) convive com falta de funcionários, com fechamento de unidades no Interior e com mais de 16,4 mil perícias atrasadas nos últimos seis meses.
O contrato para construção do prédio foi fechado em 2015, com previsão de término das obras para 2017. Naquele ano, foi assinado um aditivo, permitindo que o Estado não perdesse a verba federal. Agora, a obra deve ficar pronta em fevereiro de 2019.
A intenção é centralizar serviços e economizar quase R$ 1 milhão por ano após a saída de espaços alugados. O Departamento de Criminalística, por exemplo, está em um prédio locado de três andares na região central de Porto Alegre, desde 2014.
Conforme a supervisora técnica substituta do IGP, Carine da Silva Azambuja, a economia com o aluguel vai permitir que esses recursos sejam reinvestidos.
"Apesar de o dinheiro do aluguel não ser o mesmo da compra de materiais, essa economia possibilita maior investimento em materiais de consumo, como os utilizados nas análises de laboratórios" — observa a perita criminal do IGP.
Três andares serão reservados apenas para laboratórios, mas também haverá outros espalhados pelo edifício (veja gráfico). Um deles será destinado para a análise de incêndios, explosões e desabamentos. Outro espaço terá foco em acidentes de trânsito. O segundo pavimento será praticamente exclusivo para a balística.
Ali, haverá quatro salas de disparo, com linhas de tiro. Três delas são menores e outra mais larga, para simular rajadas a distância. Uma também será usada para demonstrar disparos na água. Conforme o arquiteto e responsável pela obra, Júlio Cesar Amantéa Ferreira, essas salas receberão revestimento especial, com blocos duplos de concreto e chapas de ferro. A proposta é evitar que um projétil escape para o lado de fora do prédio.
"Os blocos de concreto têm resistência superior ao normal e são duplos para dar mais segurança, assim como as chapas de ferro" — explica Ferreira.
Alguns laboratórios, como o de química, devem receber pisos uretânicos (com resistência química e a atritos) que vão servir para evitar a proliferação de bactérias, por exemplo.
A obra está 40,6% pronta. Hoje, pelo menos 80 operários trabalham no local. No próximo mês, o ritmo será acelerado e 150 pessoas atuarão na construção. É que está previsto para maio o começo dos acabamentos da rede elétrica, da instalação de tubulação de gases e forros internos.

800 funcionários poderão atuar no local

Após a entrega do prédio, em fevereiro de 2019, a mudança e ocupação dos espaços devem ser gradativas. Segundo a supervisora técnica substituta do IGP, alguns laboratórios situados em espaços alugados atualmente têm produtos químicos e equipamentos especiais, que requerem cuidados especiais na transferência.
Para Carine, a centralização das atividades no prédio vai permitir maior rapidez para a realização dos laudos periciais, reduzindo o tempo de deslocamento dos servidores envolvidos no cumprimento da mesma solicitação. No prédio, devem trabalhar 800 funcionários entre papiloscopistas, fotógrafos, peritos, técnicos e agentes administrativos.
"Atualmente, temos cerca de 15 mil solicitações mensais de perícias. Sabemos que pode haver consequente ampliação na quantidade de laudos expedidos, mas não sabemos ainda em números" — enfatiza.

Déficit de servidores no instituto é de 62%

Para o presidente do Sindicato dos Servidores do IGP (Sindiperícias), Henrique Bueno Machado, o prédio vai permitir a concentração de vários setores em um mesmo lugar, que hoje estão espalhados pela Capital.
"Estar em um único endereço sempre ajuda, pois permite intercâmbio de informações entre as equipes e facilita a logística."
O sindicalista pondera que, apesar da nova estrutura, é preciso recompor o quadro de servidores. Na última quinta-feira, o governo anunciou a convocação de 106 aprovados do último concurso: são 35 peritos criminais, 35 peritos médico-legistas e 36 técnicos em perícias. Com os novos funcionários, o índice de "efetivo ideal" passará dos atuais 38% para 44%, de 648 para 754 servidores, de acordo com Machado. Por lei, o instituto deveria ter 1,7 mil vagas previstas.
Machado é presidente do sindicato desde 2014, mas é servidor no IGP há 20 anos, passando por diferentes laboratórios:
"A situação sempre foi precária. Com construção do prédio, irá resolver as condições de trabalho."
Para o diretor do Departamento de Homicídios, delegado Paulo Grillo, a construção irá trazer melhorias ao já qualificado trabalho da perícia.
"Nossa relação com o IGP é estreita e com o trabalho deles conseguimos solucionar muitos casos, pois o material genético, papiloscópico e do banco genético é uma das provas mais importantes para a solução de crimes" — analisa.
Conforme Grillo, quando há necessidade de priorizar alguma investigação, os pedidos são prontamente atendidos pelo IGP, apenas havendo pequena demora nos resultados de balística, segundo ele, devido à alta demanda.

Hoje, famílias esperam laudos durante meses

A rapidez no atendimento poderá encurtar o sofrimento de famílias que aguardam por perícia criminal no Rio Grande do Sul. Em 2017, a auxiliar de recursos humanos Sandra de Vargas Cordeiro, 39 anos, teve de esperar três meses para conseguir o laudo de necropsia de seu filho, Eduardo Cordeiro Vigil, 20, após um acidente de trânsito.
"Foi um transtorno muito ruim. Quando ele faleceu, me prometeram o laudo para 20 dias e aquilo se arrastou por meses. Precisava do laudo para dar entrada no DPVAT e pagar a funerária. No fim, acabei passando por mal-educada" – conta a mulher.
Após o acidente, em maio, Eduardo ainda ficou internado por dois meses em atendimento na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) de um hospital de Porto Alegre. Durante o período, a família, que é de Bagé, precisou se dividir entre as duas cidades.
Em 13 de julho, Eduardo acabou morrendo. Por ter falecido em decorrência de um acidente de trânsito, o corpo precisou passar por perícia na sede do DML, em Porto Alegre.
"Aquele dia cheguei ali às 6h e só liberaram o corpo às 18h. Além de perder meu único filho, tive de resolver coisas e só esbarrei em burocracia."

sábado, 16 de setembro de 2017

Bloqueador de celular nas cadeias

Exemplo que vem do Norte

Passadas as fases de testes, que duraram cerca de 30 dias, começou a funcionar no início de julho o sistema de bloqueio no Complexo Prisional Francisco de Oliveira Conde e na unidade de segurança máxima Antônio Amaro Alves, em Rio Branco, no Acre, que concentram 2.885 presos - 47% da população carcerária do Estado. Juntas, estão em uma área total de 113 mil metros quadrados, distante 300 metros de vilas da capital. Para o diretor-presidente do Instituto de Administração Penitenciária, Martín Fillus Hessel, o investimento de R$ 172 mil mensais só gerou resultados positivos.
"Durante a fase de testes, alguns celulares continuavam funcionando, houve mudança de tecnologia das operadoras, mas a resposta da empresa contratada foi imediata. Com os ajustes, deixamos todos os presos no "escuro" sem interferir no entorno" - explicou.
Assim como no Rio Grande do Sul, os detentos ordenavam execuções, roubos e estruturavam suas organizações de dentro do sistema prisional.
"Melhorou consideravelmente. Ainda não temos dados estatísticos, mas percebemos a diminuição dos assassinatos cometidos por ordens de presos. Claro que os recados ainda chegam às ruas pelas visitas, advogados, mas parecem ter se reduzido" - destaca.
O Ministério Público instaurou, em julho ainda, um inquérito civil público para apurar denúncias sobre possíveis falhas no início da operação. O promotor de Justiça responsável e coordenador do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), Bernardo Fiterman Albano, classificou os problemas como ajustes de "sintonia fina":
"Correções foram feitas e agora está funcionando muito bem. Nosso setor de inteligência identificou que conseguimos dificultar muito a comunicação dos presos. Antes, a gente prendia, mas eles continua- vam ordenando da mesma forma de dentro dos presídios" - relata.
Para evitar retaliação, o governo tomou medidas prévias de segurança, como transferência de presos para penitenciárias federais, para alas com regime disciplinar diferenciado, colocou novas esteiras de raio X, detectores de metal entre outros equipamentos. Ainda assim, de 5 e 6 de agosto, houve uma onda de ataques criminosos em quatro ônibus em Rio Branco e Feijó, em um quiosque em Tarauacá, e contra a garagem da prefeitura de Sena Madureira. Em quatro dias, 40 pessoas foram presas. 

Criminosos tendem a reagir

Diretor do Presídio Central, o tenente- coronel Marcelo Gayer reconhece o poder das facções que ordenam assassinatos de dentro da cadeia. Ele não questiona a necessidade de instalação dos bloqueadores, mas ressalta que os recados continuarão a transpor os limites das cadeias.
"As ordens vão continuar por meio de visitas, advogados e etc. Só demorarão mais para chegar ao destinatário" - diz.
Diretor da Susepe, Ângelo Carneiro complementa com exemplos:
"Em 2010, pegamos visitas saindo da Pasc (Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas) com recados escritos em papel. Mandavam matar por carta. Tem solução, mas os presos sempre vão correr atrás para burlar a segurança."
Gayer alerta ainda que qualquer mudança na rotina das cadeias pode ter reflexo na rua e possíveis rebeliões.
"Se for tomada alguma atitude que dificulte a ação criminosa, eles vão utilizar todas as artimanhas possíveis para mudar o cenário" - diz, cogitando vandalismo contra ônibus, prédios públicos e até homicídios como forma de intimidação.
Não podemos abdicar por medo de facção, dia Schirmer
Foi o que aconteceu em 2016, no Rio Grande do Norte, quando o governo contratou uma empresa paulista para fazer o bloqueio do sinal em três de 33 unidades. O contrato, com vigência de cinco anos, prevê o pagamento de R$ 29 mil por mês. Tão logo os equipamentos foram instalados na Penitenciária de Parnamirim, em 28 de julho, uma série de ataques ocorreu em 42 cidades. Ônibus, carros, prédios e bases policiais foram alvo de incêndios, depredações e tiros. Os crimes, 118 ao todo, aconteceram entre o dia 29 de julho - um dia após a instalação dos bloqueadores em Parnamirim - e 15 de agosto. Não houve mortos.
Em novembro, foi a vez da Cadeia Pública de Nova Cruz receber o sistema e, em 7 de dezembro, a tecnologia chegou à Penitenciária de Alcaçuz, onde aconteceu uma rebelião durante a fase de testes que destruiu parte dos equipamentos. Ao menos 26 detentos morreram no dia em que integrantes de uma facção invadiram os pavilhões rivais - ação não relacionada à instalação dos bloqueadores. Após o massacre, a empresa prestadora do serviço fez os reparos, mas o sistema ainda não foi religado.
Especialista em segurança, Juan Fandino destaca que o celular é o principal meio de comunicação entre os presos e as quadrilhas e que a troca de informações precisa ser interrompida:
"A polícia precisa estar preparada, a reação pode ser brutal."
Schirmer garante que não há motivo para temer:
"Não podemos abdicar do que é bom para a segurança por ameaça de facção. Se for assim, temos de fechar as portas."

Por que não chega aqui?

R$ 10 MILHÕES em caixa, RS busca modelo ideal. Enquanto isso, execuções são ordenadas de dentro de cadeias, como o Presídio Central

Abraçada ao pai, uma menina de quatro anos tentava sobreviver ao tiro que lhe atingiu o pescoço no fim da tarde do dia 20 de outubro de 2016. Seu pai, o empresário Marcelo Oliveira Dias, 44 anos, não sabia de onde partiam os disparos e nem quem havia conspirado contra ele, no estacionamento do Zaffari da Avenida Cavalhada, em Porto Alegre. Nem poderia. A ordem foi dada de dentro do Presídio Central. Também da cadeia foi sentenciada a execução de Orides Telles da Silveira, 47 anos. Seu corpo foi encontrado aos pedaços, envolto em sacolas plásticas, às margens da BR-386, em Canoas, em 6 de maio de 2017. Desmandos dos presos, como estes, poderiam ser evitados com o bloqueio do sinal de celular, medida já utilizada por Estados como São Paulo, Minas Gerais, Acre e Rio Grande do Norte. O sistema impede a comunicação por telefone dos detentos com a rua e, por consequência, com a organização criminosa, enfraquecendo-a.
"Se os celulares forem bloqueados, as gangues ficam sem cabeça. A estrutura interna é prejudicada. É como se tirasse o oxigênio delas" - resume o colombiano Juan Mario Fandino Marino, doutor em sociologia pela Universidade de Wisconsin (EUA), professor e pesquisador aposentado da UFRGS.
Os bloqueadores emitem ruído eletrônico mais forte do que o das operadoras (leia gráfico ao lado), formando uma espécie de camada protetora na casa prisional e deixando os telefones dos presos sem serviço. Em julho, o Ministério da Justiça destinou à implantação de bloqueadores no RS verba de R$ 10.968.653,89. Testes estão sendo feitos, mas conforme o diretor do Departamento de Segurança e Execução Penal da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe), Ângelo Carneiro, os projetos até agora não atenderam os requisitos impostos pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), como não interferir na comunicação no entorno. O Central, por exemplo, está localizado em um bairro na zona leste da Capital, com casas construídas a menos de 10 metros do muro.
"Nos apresentam soluções magníficas, mas quando chega na prova de conceito (teste) aparecem as falhas. Muitas empresas não conseguem neutralizar pontualmente aquela penitenciária, deixando a interferência chegar em áreas externas. Ou eliminam uma operadora, mas outras continuam pegando. Acontece, ainda, de o sinal ficar mais forte e, de repente, se sobrepor ao ruído" - diz Carneiro, garantindo que mais de 10 empresas foram consultadas apenas neste ano.
Conforme o engenheiro de radiofrequência Antônio Neger, que presta consultoria para 30 casas prisionais do país, essas dificuldades são superadas com planejamento e implantação corretas do sistema. É imprescindível que o ruído eletrônico seja mais forte em todas as cerca de 60 subfaixas de frequência das operadoras e que os emissores sejam posicionados com ângulos e potências apropriados.
"O que acontece é que a técnica utilizada por algumas empresas não é a mais adequada. A questão não está no equipamento, mas no planejamento do projeto, disposição das antenas e potência do ruído. Hoje em dia, a gente consegue ter um nível de precisão extremamente alto. Dá para bloquear em todo o presídio e deixar a sala do diretor recebendo sinal de telefone, por exemplo" - explica Neger.
É difícil, mas não é impossível, diz engenheiro de Telecomunicações
Especialista em tecnologia de segurança pública e guerra eletrônica, Renato Queiroz exemplifica:
"Temos no Brasil soluções nacionais de bloqueio que estão maduras e funcionando muito bem. No complexo prisional de Rio Branco, no Acre, o sinal está totalmente bloqueado e, na vizinhança, o celular funciona normalmente."
Por diferentes motivos, as operadoras aumentam a potência do sinal de comunicação, mudam a frequência ou passam a utilizar novas tecnologias para contornar problemas de cobertura e melhorar o serviço. Essas correções fazem com que os bloqueadores precisem ser ajustados constantemente. Há, inclusive, uma resolução da Anatel que obriga as prestadoras de serviços de radiocomunicações a informarem, com antecedência, alterações de potência, implantação de novas estações, mudança de localização ou desativação de antenas que modifiquem os níveis de sinal presentes nas áreas de bloqueio, mas isso nem sempre acontece. O engenheiro de telecomunicações Rodrigo Matos, gerente de soluções de uma empresa catarinense especializada em segurança prisional, sugere que a prestadora do serviço de bloqueio mantenha contato com as operadoras e com a Anatel para antecipar esses ajustes. Matos reconhece, ainda, a dificuldade de implantação dos bloqueadores em presídios como o Central, rodeado por residências.
"É preciso fazer um projeto específico, bem pensado e executado para que o sinal não afete as casas mais próximas e nem deixe buracos de cobertura no presídio. É difícil, mas não é impossível. A cada nova tecnologia que surgir, tem de atualizar os bloqueadores para não ficarem obsoletos" - pontua.

As diferenças em contratar o serviço e comprar o equipamento

Desde que o serviço foi regulamentando pela Anatel, em 2002, os Estados começaram a comprar equipamentos e testá-los. No entanto, a evolução da telefonia móvel torna, em meses, os aparelhos defasados. Então, empresas especializadas passaram a oferecer os bloqueadores como prestação de serviço, fornecendo pacote que vai da instalação à manutenção, incluindo todos os gastos. O ônus do acompanhamento de evolução tecnológica das operadoras e dos ajustes deixaram de ser dos Estados e recaíram sobre as prestadoras de serviço.
O custo estimado para implantação no Central, por exemplo, varia de R$ 70 mil a R$ 300 mil por mês, e o Rio Grande do Sul está pendendo para a contratação em detrimento à compra. A busca se concentra em empresas que ofereçam não apenas o serviço de bloqueio, mas uma série de soluções que evite a entrada de produtos ilícitos.
"Estamos trabalhando no aluguel de um conjunto para segurança penitenciária que acabe com a entrada de celulares e drogas, que auxilie na guarda, impeça o arremesso, evite fuga e bloqueie o sinal" - comenta o diretor da Susepe, Ângelo Carneiro.
No ano passado, um projeto entregue à Secretaria da Segurança Pública (SSP) pelo diretor do Central, tenente- coronel Marcelo Gayer, previa a instalação de bloqueadores de sinal celular, de drones, colocação de novas câmeras de monitoramento para diminuir o número de aparelhos arremessados e manutenção do sistema por dois anos. Conforme a SSP, as sugestões são repassadas à área técnica para avaliação.
"A gente não pode perder mais tempo nem dinheiro. Não dá para contratar qualquer empresa. Lá na Pasc (Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas), temos antenas que não funcionam" - diz Gayer.
A Susepe estima que 90% dos telefones que entram nos presídios são arremessados para o pátio. Isso acontece, principalmente, devido à proximidade das zonas urbanas. Muitas casas prisionais foram construídas em áreas afastadas, mas a urbanização as abraçou, facilitando o arremesso e dificultando a instalação dos bloqueadores.
Conforme o secretário da Segurança Pública, Cezar Schirmer, até o final do ano será definida a forma de contratação e a tecnologia a ser adotada.
"O sistema prisional é o elo frágil da segurança pública no Brasil e no RS. Acabar com o uso de celular por presos é apenas um dos nossos desafios" - disse.
Marcelo Kervalt/ZH

sábado, 29 de julho de 2017

Líderes do crime isolados em prisões federais

Três mil agentes de 19 instituições atuaram na transferência de 27 condenados por delitos graves no Rio Grande do Sul

Foi durante uma reunião de trabalho, em março, que a cúpula da segurança pública gaúcha reconheceu: medidas preventivas e captura de bandidos tinham efeito quase nulo na escalada da violência no Estado. Não era mais possível conviver com decapitações e esquartejamentos, tampouco dar explicações sobre crimes bárbaros como um pai executado por engano em estacionamento de supermercado e uma mãe assassinada por ladrão em frente à escola do filho.
"Solução tradicional para problemas que não se resolvem, exige mudanças. Não pode ser mais do mesmo" – sentenciou Cezar Schirmer, titular da Segurança Pública (SSP).
A frase foi a senha para desencadear a Operação Pulso Firme, maior ofensiva realizada no Estado, com a participação de 3 mil agentes de 19 instituições estaduais, federais e da prefeitura de Porto Alegre. A ação foi tornada pública na madrugada de sexta-feira, com a transferências de 27 condenados gaúchos para penitenciárias federais em Mato Grosso do Sul, Rondônia e Rio Grande do Norte. A maioria deles é considerada líder de facções que comandavam crimes de dentro das cadeias gaúchas.

A ação foi estudada por cinco meses. Ainda em março, foi reforçado o patrulhamento na Grande Porto Alegre com 350 PMs vindos do Interior, acrescido de duas centenas de agentes da Força Nacional. Em meio a análises de planos por técnicos da SSP em parceria com policiais civis, militares e agentes penitenciários, brotou a ideia de transferir para fora do Estado os responsáveis pelas mortes nas ruas que, sabidamente, estavam dentro das cadeias.

Um fator contribuiu para a decisão: o isolamento na penitenciária federal no Paraná de Jackson Peixoto Rodrigues, o Nego Jackson, em fevereiro, e de José Dalvani Nunes Rodrigues, o Minhoca, na prisão federal de Mato Grosso, em março, coincidiram com a redução de homicídios em Porto Alegre. Líderes de facções criminosas – refugiados no Paraguai, onde foram presos –, os dois são acusados de comandar dezenas de assassinatos na Capital.

O passo seguinte foi buscar apoio de outras instituições ao plano de transferir líderes de facções para penitenciárias federais e “cortar a cabeça pensante” dos crimes nas ruas. Em Porto Alegre, Schirmer se reuniu com a direção do Ministério Público, com a presidência do Tribunal de Justiça e teve três encontros com generais do Comando Militar do Sul.

Em Brasília, o secretário foi ao gabinete do então ministro da Justiça, Osmar Serraglio. Responsável pelo Departamento Penitenciário Nacional, Serraglio era figura importante para que o projeto se concretizasse com aval da Justiça Federal, que decide sobre transferências para prisões da União.
 

Em junho, o sinal verde do ministério da justiça

A queda de Serraglio no final de maio, e a chegada do novo ministro da Justiça, Torquato Jardim, fizeram Schirmer retomar o assunto em junho, quando recebeu o sinal verde para as transferências. O objetivo da SSP era remover 46 apenados, mas 19 nomes foram vetados, uma parte por juízes gaúchos e outra por magistrados federais.

"O ideal seria transferir 200 criminosos, mas esses 27 dão mostra das nossas intenções" – afirmou Schirmer em entrevista coletiva, na qual o governo do Estado e autoridades comemoraram a ofensiva como “marco do enfrentamento ao crime”. O governador José Ivo Sartori saudou a integração com 19 instituições e disse que ela representa uma conquista nacional.
"Esse trabalho deve ser contínuo e permanente. Este será um final de semana diferente para os gaúchos" – enfatizou Sartori.
A ação teve início na madrugada de quinta-feira (veja no quadro ao lado), quando a Superintendência dos Serviços Penitenciários concentrou os 27 presos na Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc). A maioria dos transferidos estava detida no Presídio Central de Porto Alegre e na própria Pasc. Na madrugada de sexta, antes de serem levados em camburões para a Base Aérea de Canoas, todos baixaram a cabeça e, em fila indiana, dirigiram-se às viaturas. No meio da manhã, o grupo embarcou em dois aviões da Aeronáutica com destino às penitenciárias federais de Porto Velho (RO)Mossoró (RN), e Campo Grande (MS), sendo nove presos para cada. A remoção de Charqueadas até Canoas mobilizou PMs do patrulhamento ostensivo, bombeiros e policiais rodoviários federais. Foram bloqueados trechos da BR-290 e da RS-401 para permitir a passagem do comboio, gerando congestionamentos nas rodovias.

Os presos escolhidos para deixar o Estado comandavam de dentro do sistema prisional o tráfico de drogas, ordenavam execuções, assaltos a banco e roubos de carros. Por serem líderes das maiores facções gaúchas e manterem contato com seus subordinados nas ruas, há receio de que essas transferências causem uma onda de violência no Estado. Questionado sobre essa possibilidade, Schirmer ressaltou:

"Estamos atentos, preparados para tudo, para o que der e vier".
O secretário ainda destacou que a chegada às ruas do Estado de 1.018 novos PMs neste mês foi para prevenir essa possível reação.

Participaram desta cobertura Cid Martins, Eduardo Matos, Eduardo Torres, José Luís Costa, Marcelo Kervalt/ZH

Impacto incerto para a redução da violência

A transferência de mais de duas dezenas de líderes de facções gaúchas para presídios federais foi vista como demonstração de força das autoridades de segurança pública contra as organizações criminosas. Porém, o impacto do plano na redução da violência ainda é incerto. Especialistas ouvidos por ZH analisam que, isolada, a ação surte efeito tímido na queda dos indicadores de violência em razão da capacidade de reorganização da estrutura das quadrilhas. Por isso, o isolamento dos líderes precisa estar associado a outras estratégias de combate e prevenção da violência.
"Essa operação vai ao encontro de uma necessidade, porque, no Rio Grande do Sul, havia descontrole na segurança. Mas, por si só, não resolve o colapso no sistema prisional nem rebate a criminalidade. Em um primeiro momento, enfraquece as facções, mas, se não houver continuidade de políticas públicas, ocorrerá rearticulação que pode recrudescer esses grupos com poder de violência ainda mais aprofundado" – avalia o coordenador do Núcleo de Segurança Cidadã da Faculdade de Direito de Santa Maria, Eduardo Pazinato.
Na sua análise, a desestruturação imediata das facções confere aos órgãos de segurança oportunidade de combate efetivo dos grupos. Para desarticulá-los, Pazinato sugere o incremento de operações integradas entre as instituições e a ampliação de políticas públicas direcionadas a moradores de regiões conflagradas na tentativa de afastá-los do crime.

Experiência em Santa Catarina e São Paulo como referência

Não se trata de um diagnóstico unânime. O professor de Tecnologia em Segurança Pública e Gestão Pública da Feevale Charles Kieling observa que os grupos comandados pelos líderes transferidos seguirão em atividade, inclusive ditando ordens de dentro dos presídios. Isso porque, com o isolamento do “chefe”, o segundo na hierarquia da organização deve assumir a liderança e dar continuidade às ações.

"É uma retaliação do Estado contra os grupos, para diminuir o seu poder de comando. Para a sociedade, a operação parece resolver a situação, quando, na realidade, nada muda. Já existe uma dinâmica de funcionamento que confere vida ao crime. As autoridades precisam trabalhar para desmantelar essa dinâmica, e aí está toda a dificuldade" – considera Kieling.
Os especialistas ainda alertam para o risco de reações violentas das facções, a exemplo do ocorrido em outras regiões. Em Santa Catarina, há quatro anos, 40 criminosos foram levados para presídios federais em meio a uma onda de ataques contra delegacias, batalhões e ônibus a mando do Primeiro Grupo Catarinense (PGC). As transferências acirraram ainda mais os ânimos, e a situação só arrefeceu com o reforço da Força Nacional e a integração de ações entre as autoridades de segurança.

Situação ainda mais grave ocorreu em São Paulo. Em 2001, o Primeiro Comando da Capital (PCC) promoveu rebeliões em 29 penitenciárias em protesto à transferência de líderes da facção que estavam no Carandiru, na capital paulista. Cinco anos depois, as forças de segurança decidiram transferir mais de 700 presos ligados à organização. Em resposta, o PCC realizou motins e deu início a uma onda de mais de 200 ataques, matando mais de cem pessoas. À época, a capital paulista viveu momentos de pânico e as ruas ficaram desertas.

É justamente com o poder do PCC que o analista criminal e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública Guaracy Mingardi relaciona o isolamento dos líderes de facções gaúchas. No Rio Grande do Sul, o crime segue sob controle de grupos locais que, a partir de agora, entrarão em contato com comandantes de quadrilhas nacionais.

"Nos presídios federais, esses líderes encontrarão pessoas ligadas ao PCC e ao CV (Comando Vermelho, do Rio de Janeiro), a nata da criminalidade nacional, ganhando know-how de grupos muito mais organizados e com muito mais dinheiro. No futuro, esses criminosos retornarão sabendo mais do que antes, com mais capacidade organizativa e ideologia. Inicialmente, a transferência é boa, mas, a médio prazo, pode se tornar ruim se não houver controle na volta" – alerta Mingardi.

Fim da guerra?

A Lei de Execuções Penais recomenda que o preso cumpra pena próximo ao seu lar. Isso até poderá ser alegado pelos defensores dos apenados transferidos para longe do RS. Tenho certeza que a lei tinha intenção de recuperar prisioneiros. Mas será que os exportados podem ser chamados de recuperáveis?

A maioria está envolvida nessa orgia de cabeças arrancadas que caracteriza a moderna guerra de facções. Feito Césares romanos, decidem desde suas celas (sempre as melhores da cadeia) quem vai morrer. Isso é recuperação? Se perante a lei a transferência é polêmica, entre a população tenho certeza que será saudada. Até pela esperança de que a matança diminua.

São poucos os estudos a respeito. Em 2013, análise baseada no Sistema Integrado de Informações Penitenciárias mostrou que, após a ida de líderes de facções para penitenciárias federais, o número de presos envolvidos em motins nos presídios estaduais caiu 61%. A constatação: as regras rígidas do sistema federal inibem os demais presos a praticarem atos que os levariam a essas prisões.

Lógico que as transferências geram efeitos colaterais. A primeira, a longo prazo, é que esses líderes não serão ressocializados. Mas será que são ressocializáveis? O outro é que as facções podem ordenar represálias, a mando dos seus chefes. Talvez venha um período de turbulência. Mas os fatos mostram que, em Estados como São Paulo, as estatísticas criminais recuaram após a remoção dos líderes do submundo.

Nas cadeias, operação deve levar a reorganização

Qual o impacto que a transferência de líderes de facções criminosas para penitenciárias federais pode produzir no sistema penitenciário gaúcho? Na opinião de autoridades, não devem ocorrer reflexos negativos. Na sexta-feira o clima estava calmo tanto na Cadeia Pública, o antigo Presídio Central, quanto na Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc).

De acordo com o diretor da Cadeia Pública, tenente-coronel Marcelo Gayer, houve uma reunião entre ele, a juíza da Vara de Execuções Criminais Patrícia Fraga Martins e presos das três galerias que perderam seus plantões (líderes) com a Operação Pulso Firme. O oficial afirma que a própria Brigada Militar (BM) se encarregará de escolher os novos representantes. Se confirmada essa informação, já será dado um passo à frente no sentido de retomada, pelo Estado, do poder das galerias da maior prisão gaúcha.

Ainda há muito por ser feito, principalmente em relação à superlotação, que impede a realização de um efetivo controle de detidos e apenados. Curiosamente, a Operação Pulso Firme foi realizada em um 28 de julho, exatos 30 anos do motim que marcou a criação da Falange Gaúcha, primeira facção do Estado. Na sequência, outras rebeliões, fugas constantes e mortes decorrentes de disputas internas no grupo criminoso transformaram o sistema penitenciário gaúcho em um barril de pólvora.

Por conta do constante clima de tensão, em 1995 o governo estadual decidiu entregar o controle do Presídio Central à BM. A medida, batizada de Operação Canarinho, era para ser provisória, com duração de apenas seis meses. No entanto, já passa de 22 anos. Ao longo do tempo, adaptando-se a uma função não prevista entre suas atribuições, a BM foi conduzindo uma série de rearranjos, visando harmonizar o sistema. O processo envolveu, em alguns aspectos, outras instituições, como o Ministério Público e até o Poder Judiciário, com acordos tácitos e explícitos para reduzir a violência e a tensão no interior da prisão.
 

Superlotação ainda é problema no Estado

Uma das medidas foi a separação de presos conforme a facção à qual pertencem. Outra, a criação da figura do plantão (ou “prefeito”, na linguagem dos presos), a quem cabe encaminhar as demandas de sua respectiva galeria. As solicitações individuais incluem os atendimentos técnicos (médico, psicológico e jurídico) e as transferências. No caso das coletivas, geralmente são relacionadas a problemas estruturais, como falta d’água ou de energia elétrica.

Com esse sistema, que se vale de reuniões com a participação pacífica de todos os líderes, houve uma expressiva redução das mortes internas e dos atritos entre a guarda e a massa carcerária. Porém, no caminho da pacificação havia a superlotação, a entrada de celulares e o interesse econômico das facções.

Abrigando 300 homens, em média, as maiores galerias tornaram-se território impenetrável para a própria guarda, quando os presos estão presentes. A dinâmica interna, então, ficou completamente nas mãos dos grupos organizados. E os líderes, com as facilidades oferecidas pela telefonia móvel e seus aplicativos, seguiram ordenando e comandando crimes praticados do lado de fora dos muros da prisão.

Em consequência, o sistema passou a dar uma aparência de tranquilidade, sem mortes e motins. Salvo a descoberta, em fevereiro passado, de um túnel que estava sendo aberto da rua para o presídio, e que possibilitaria a fuga de cerca de 400 presos. Os financiadores da obra, de acordo com investigações policiais, estão entre os transferidos na sexta-feira.

Na contrapartida da calmaria, os índices de criminalidade dispararam do lado de fora. Por conta dessa realidade, o Estado aposta suas fichas nas transferências dos líderes. Porém, essa medida pode se tornar paliativa se a superlotação não for combatida. Novas lideranças se formam, os celulares continuam funcionando bem, e as facções seguem com o controle do crime nas ruas.

Traficante transferido movimentou R$ 60 milhões

Enquanto era transferido nesta sexta-feira para uma penitenciária federal pela Operação Pulso Firme, o traficante Juliano Biron da Silva tinha suas finanças como alvo de outra ação, batizada de Harpia. Mais de 300 policiais, sob coordenação da Divisão de Inteligência do Departamento de Investigações do Narcotráfico (Denarc), apreenderam quase R$ 5 milhões em bens, mas a estimativa é de que o criminoso tenha movimentado R$ 60 milhões.

Foram cumpridos quatro mandados de prisão temporária, 33 de condução coercitiva e 45 de busca e apreensão nas cidades de Porto Alegre, Canoas, Cachoeirinha, Gravataí, Novo Hamburgo, Tramandaí, Imbé, Cidreira e Palmares do Sul. Os presos seriam responsáveis por coordenar os negócios adquiridos por Biron a partir da venda de entorpecentes. Entre os conduzidos para depor está Dirlei Silveira, que administra sete lancherias Skillus na Região Metropolitana e no Litoral, pertencentes ao traficante.

"Comprovamos tudo por meio de técnicas de investigação, movimentação bancária, análises contábeis e fiscais, bem como monitoramento policial. Biron dava as ordens de dentro da cadeia" – explicou o delegado Marcio Zachello.
O Denarc obteve o sequestro dos bens identificados, a maioria de propriedade de Biron de forma indireta. São 88 contas bancárias no nome de 38 pessoas, 20 veículos avaliados em R$ 1,3 milhão e 16 imóveis calculados em R$ 2,7 milhões.

Biron tem terrenos, um apartamento de R$ 800 mil em Balneário Camboriú (SC), um prédio em Canoas, casas na praia, sítio no Vale do Sinos, pub em Cachoeirinha, revenda de veículos em Canoas, duas transportadoras, uma delas em Santa Catarina, e investimentos em produtoras de eventos.

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