Powered By Blogger
Mostrando postagens com marcador celulares. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador celulares. Mostrar todas as postagens

sábado, 26 de dezembro de 2020

Telentrega nas prisões: 22 drones foram apreendidos levando drogas e celulares para cadeias do RS em 2020

Número é quase a metade dos registros de 2019, quando 43 aparelhos foram recolhidos

Fonte GZH

Susepe / Divulgação
Usado como espécie de pombo-correio para levar drogas e celulares para dentro das prisões, 22 drones foram apreendidos nas unidades prisionais do RS neste ano. O número é quase a metade do registrado no mesmo período do ano passado — em 2019, foram 43. 

Na prática, não significa que esse tipo de equipamento deixou de ser preocupação. Pelo contrário, os criminosos seguem usando diferentes técnicas para não terem aparelhos derrubados a tiros. Como resposta, a Secretaria da Administração Penitenciária (Seapen) traça estratégias para frear essas ações.  

Mais da metade dos drones apreendidos estava sobrevoando o Presídio Central, em Porto Alegre — foram 13 equipamentos. Um dos motivos apontados para isso é a alta população carcerária. Em novembro, a casa prisional abrigava 3.476 presos, enquanto a capacidade é para 1.824. Em segundo lugar, aparece a Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc), com quatro apreensões.  

"Tanto no Central quanto na Pasc, há número expressivo de presos. O perfil, especialmente na Pasc, é de alta periculosidade. E nos dois casos há envolvimento de organizações criminosas, presentes nessas unidades. No ano passado, o drone foi uma novidade e a resposta foi efetiva, no sentido de intervenção e abate" — avalia o secretário da Administração Penitenciária, Cesar Faccioli.  

Diretor do Presídio Central, o tenente-coronel Carlos Magno da Silva Vieira acredita que a série de ações para conter os arremessos com drones realizadas em 2019 ajudou a reduzir as investidas. Ele afirma que a facilidade para aquisição desses equipamentos é um fator que permite a utilização da tecnologia a favor do crime. Além das drogas, celulares são transportados dessa forma, permitindo o contato de presos com as ruas.  

"É um problema grave, mas que temos enfrentado. Algumas ações que estamos adotando não podem ser divulgadas, por segurança. Há uma legislação para o uso. Por outro lado, não é preciso justificar a finalidade da compra. Há uma desconexão" — avalia Magno.  

Os drones também ficaram mais difíceis de serem abatidos em razão da tecnologia avançada, que deixa os aparelhos silenciosos e permite que voem a alturas mais elevadas, tornando o abate com disparos uma caçada complexa. O operador pode ficar de quatro a cinco quilômetros de distância. As luzes, que poderiam facilitar a visualização, em geral são cobertas com fita isolante.

"Os agentes têm de buscar capacitação para superar esse nível de informações" — diz Faccioli.  

Dificuldades

Em um dos casos registrados neste ano na Pasc, os agentes localizaram primeiro uma garrafa pet, pintada de preto, amarrada a um fio. Começaram a puxar e o drone acabou desabando no chão. A linha tinha cerca de 300 metros. Dentro da garrafa, encontraram seis celulares, chips, carregadores e porções de drogas. Entorpecentes e telefones são os principais produtos recolhidos, mas já houve até talheres de metal apreendidos.  

A entrega malsucedida só foi descoberta porque os servidores estão acostumados a conviver com as tentativas frequentes de arremessos. Mantêm os olhos e ouvidos atentos, especialmente à noite, quando os aparelhos sobrevoam a unidade, protegidos pelo breu. O horário entre 20h30min e 5h30min é o mais crítico. Em alguns casos, os criminosos usam dois equipamentos ao mesmo tempo. Os drones são derrubados com tiros, quando é possível vê-los.  

"Ficou mais difícil de abatê-los, pela forma como estão voando. Ano passado, tentavam entregar diretamente com o drone nas janelas, mais baixo. Agora, o equipamento vem a mais de 300 metros de altura. Fica só o pacote, no escuro, amarrado na corda de nylon. Às vezes, só escutamos o barulho e ficamos procurando o pacote, não enxergarmos o drone, que é pintado e tem as luzes tapadas por fitas isolantes"— descreve o diretor da Pasc, Eduardo Saliba.  

Há casos em que as encomendas são depositadas nos pátios em tênis, caixas de leite ou bolas de futebol. Para driblar essa situação, os pentes-finos foram intensificados e o pátio é verificado todos os dias. Há episódios nos quais os operadores desistem da entrega ao perceberem que foram avistados, devido aos disparos para o alto.  

O governo estuda utilizar os drones como aliados da segurança nas prisões, como ferramenta de vigilância nas unidades. Os aparelhos também poderão ser usados pela inteligência e durante operações. Até o momento no RS, cinco servidores se capacitaram para operar drones — o processo para aquisição dos equipamentos está em andamento. Os aparelhos apreendidos não são usados, segundo a Seapen, porque normalmente estão danificados.  

A aquisição do antidrone — que emite ondas eletromagnéticas e rompe o contato do controle remoto com o aparelho — está em estudo pelo governo do RS. Em dezembro de 2019, São Paulo foi o primeiro Estado a adquirir esse tipo de equipamento. O uso de tecnologia de maneira geral para conter o ingresso de ilícitos é uma das apostas da Seapen. Foram instalados oito scanners corporais e cinco bloqueadores de celular estão em processo de aquisição por meio do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) — a única unidade que conta com o bloqueio de sinal telefônico é a Penitenciária Estadual de Canoas.  

Arremessos

Em terceiro lugar em apreensões de drones está a Penitenciária Estadual de Bento Gonçalves, na Serra. Delegado regional da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe), Marcos Ariovaldo Spenst diz que na região as empreitadas com os equipamentos são menos comuns, mas os arremessos preocupam. Faccioli confirma que houve aumento das tentativas de ingressar drogas nas unidades por meio dos arremessos.  

"Aumentamos muito, em torno de 50%, as nossas operações, qualificamos os protocolos de revistas. Investimentos em inteligência. Fizemos análise de ocorrências com base na territorialidade" — enumera Faccioli.   

Outra aposta do governo é o uso de telas de proteção sobre os pátios e janelas das unidades. A intenção é que todos os projetos novos sejam realizados já com a proteção e que as unidades antigas passem a contar com as telas. A próxima meta é usar a mão de obra prisional para a produção. 

Variação nas apreensões

·        2019: 43 

·        2020: 22 

·        Queda de 48,8% 

Onde foram apreendidos*

·        Presídio Central: 13

·        Pasc: 4

·        Bento Gonçalves: 2

·        5ª Região Penitenciária (Pelotas): 1

·        10ª Região Penitenciária (Porto Alegre): 1 

·        8ª Região Penitenciária (Vale do Rio Pardo): 1

*Nos três últimos não foi informada a casa prisional.  

Fonte: Secretaria da Administração Penitenciária do RS (Seapen)

terça-feira, 25 de setembro de 2018

Agente penitenciário é preso suspeito de facilitar entrada de drogas no presídio de Osório

Este é o segundo caso em que agentes públicos são investigados na penitenciária de Osório em dois anos

A Polícia Civil prendeu na manhã desta terça-feira (11) um agente penitenciário de 38 anos suspeito de facilitar a entrada de objetos e drogas na Penitenciária Modulada Estadual de Osório, no Litoral Norte. A operação é resultado de uma investigação de mais de três meses.
"As informações partiram da direção e dos próprios apenados que denunciaram o agente. Foram três meses de investigações que resultaram na segunda prisão de agentes penitenciários em dois anos na penitenciária de Osório" — destaca o delegado João Henrique Gomes. 
As investigações apuraram ainda que o servidor cobraria valores de apenados para facilitar a entrada de bebidas alcoólicas, drogas e celulares para presos do regime semiaberto. Na residência do suspeito foram apreendidos diversos documentos, carregador de pistola, munições e objetos pertinentes aos crimes investigados.
Ainda conforme o delegado, as investigações prosseguem para apurar a participação de mais agentes da penitenciária de Osório. A ação, que tem como objetivo combater os crimes de corrupção passiva e tráfico de drogas, recebeu o nome de Operação Ponto Cego. 
O agente preso está na delegacia de Osório, onde aguarda definição da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) para onde será levado. Ele deve responder a um processo disciplinar e ter suspenso o vínculo funcional com o Estado.

Por meio de nota, a Susepe afirmou que a atitude do agente penitenciário é "inaceitável" e "posturas como essas são exceções". Leia a nota na íntegra:

"A Susepe acompanhou hoje (11) a Polícia Civil na prisão de um agente penitenciário que trabalha na Penitenciária Estadual Modulada de Osório (PMO). Já há algum tempo a Direção do Estabelecimento Prisional desconfiava que o servidor tivesse alguma ligação com o crime, tendo, por isso, a Superintendência designado um corregedor penitenciário para acompanhar especificamente o agente. A suspeita se confirmou durante uma Revista Geral na PMO. Esta ação foi provocada pela Susepe, que solicitou ao Ministério Público e à Policia Civil as averiguações das suspeitas, o que resultou na prisão do servidor, o qual, em seguida, foi conduzido à Cadeia Pública de Porto Alegre. Enquanto isso, todas as medidas de averiguação e sindicância terão continuidade. A Susepe reitera que é inaceitável esse tipo de atitude de um servidor, sendo implacável na reprovação e na repressão a esse tipo de conduta, na certeza de que posturas como essas são exceções que só confirmam a regra geral de lisura e comprometimento de todo o nosso quadro funcional."

sexta-feira, 24 de agosto de 2018

Celulares nos presídios aos presos

Marcos Rolim (*)
A ampla maioria dos agentes penitenciários jamais vendeu nem venderá celulares em presídios. Pelo contrário, esse contingente está diariamente comprometido com tarefas penosas, sem apoio algum do Estado, em regimes de trabalho sem qualquer racionalidade, segurando cadeias superlotadas com efetivos muito abaixo do que seria o mínimo necessário, em espaços produtores de sofrimento não apenas para os internos.
Por Sul21
 Em abril desse ano, tratei aqui dos telefones em presídios no texto “Telefones, prisões e começos” (leia em: https://goo.gl/nPh9Sa). Esta semana, matéria de Zero Hora abordou o mesmo assunto, revelando que, em dez anos, foram apreendidos 72 mil celulares em presídios gaúchos. O jornalista ouviu algumas pessoas, eu entre elas. Na entrevista ao telefone, chamei a atenção para a necessidade de uma nova política que reduza drasticamente o lucrativo mercado clandestino de venda de celulares, sustentando um caminho similar ao que foi construído nos EUA e em vários outros países, onde todas as prisões oferecem a possibilidade dos presos realizarem chamadas por telefones fixos (tipo orelhões), pagando por isso e sabendo que todas as conversas são gravadas. Afirmei, então, que:
As apreensões se repetem e renovam o mercado. Basta um agente corrupto. Há clientela e tem quem forneça. Esse material não entra por visita, mas por nítida prática de corrupção. Hoje, 90% dos aparelhos vêm de servidores que vendem para presos.
Por conta disso, vários servidores da SUSEPE se sentiram ofendidos, como se eu tivesse dito que 90% da categoria é corrupta (!) Outros, claro, percebendo a oportunidade de instrumentalizar politicamente o tema, reproduziram a distorção como se “90% dos celulares serem vendidos por agentes” fosse o mesmo que “90% de agentes vendendo celulares”. Um olhar atento sobre a matéria sequer autorizaria essa interpretação, mas, enfim, os que a reproduziram vivem no mundo da pós-verdade.
Para aqueles que não conhecem minhas posições, assinalo que a ampla maioria dos agentes penitenciários jamais vendeu nem venderá celulares em presídios. Pelo contrário, esse contingente está diariamente comprometido com tarefas penosas, sem apoio algum do Estado, em regimes de trabalho sem qualquer racionalidade, segurando cadeias superlotadas com efetivos muito abaixo do que seria o mínimo necessário, em espaços produtores de sofrimento não apenas para os internos. São servidores muitas vezes ameaçados, expostos a risco dentro e fora dos estabelecimentos, a quem não se oferece formação continuada, nem os recursos tecnológicos elementares para que promovam segurança e se protejam.
E esse percentual de 90% de celulares nos presídios serem resultado da corrupção, de onde saiu? Qual minha fonte para tal afirmação? Chegaremos lá, acompanhem o argumento. Todos os que visitam um presídio ou que trabalham nele deveriam, obrigatoriamente, se submeter a procedimentos de segurança de tal modo que se evite a entrada de objetos como armas, drogas, celulares e carregadores. Nos países mais civilizados, onde o Poder Público oferece segurança com base na lei e no respeito às pessoas, os presídios contam com scanners pessoais e aparelhos de raio X similares aos que existem em aeroportos, entre outros recursos, e todos se submetem a eles, incluindo servidores, fornecedores, advogados, magistrados e autoridades políticas. No Brasil, muitos estabelecimentos penais não contam sequer com detectores de metal e, quando esses aparelhos existem e funcionam, seu emprego não é universal. Em compensação, sempre tivemos a “Revista Íntima” procedimento ilegal e inconstitucional (por violação ao direito à intimidade disposto no art. 5º, X, da CF) que exige das visitas que se desnudem, que se agachem sobre um espelho, que pulem, que arregacem o ânus e a vagina, para que se saiba se esconderam algo em suas cavidades. Crianças não são submetidas ao procedimento, mas se usarem fraldas, essas deverão ser trocadas sob inspeção e, em todas as oportunidades, assistem ao processo a que se submetem suas mães. Estamos tratando de mulheres pobres que irão visitar seus companheiros ou seus filhos e que são submetidas a esse tipo de prática vexatória e humilhante por conta da desídia e da incúria do Estado. No dia que tivermos madames visitando apenados ricos e poderosos, esse tipo de procedimento será considerado indigno por todos, claro.
Em 8 de outubro de 2014, o juiz Sidinei Brzuska prolatou sentença memorável a respeito da “Revista Íntima”, proibindo tal prática no Presídio Central de Porto Alegre e determinando que fossem observadas as normas de revista vigentes em São Paulo, estabelecidas pela Lei 15.552/2014, até que eventual Lei do RS dispusesse de outra forma. Observe-se que o Estado de São Paulo é, reconhecidamente, um dos mais rigorosos do País na área da execução penal e já havia, então, abolido a Revista Íntima. Muito bem, na fundamentação de sua decisão, o magistrado observou:
(….) estatisticamente, a quantidade de bens apreendidos na sala de revista não encontra representatividade dentro do contexto geral do sistema carcerário do Rio Grande do Sul, conforme levantamento feito pela própria SUSEPE:
Basta mencionar que, em 2012, do total de 93.562,81g de maconha e das 10.776 pedras de crack que ingressaram nos estabelecimentos prisionais do Rio Grande do Sul, apenas 8.068,67g e 1.036 pedras, respectivamente, foram apreendidos na sala de revista. Já em 2013, do total de 34.903,05g de maconha e das 4.361 pedras de crack que ingressaram nos estabelecimentos prisionais, apenas 3.166,50g e 384 pedras, respectivamente, foram aprendidos na sala de revista.
Isso significa dizer que apenas 10% da droga aprendida nos estabelecimentos penais, foi apanhada com os visitantes.
No que se refere ao problema dos aparelhos celulares, segundo a planilha de dados indicadores da SUSEPE, Área de Segurança e Execução Penal, em 2012, foram apreendidos 5.755 aparelhos de telefone celular por “outros meios”, 2.394 com presos e 268 com visitantes. No ano de 2013, até o mês de agosto, foram apreendidos 4.207 aparelhos de telefone celular por “outros meios”, 1.552 com presos e 371 com visitantes, ou seja, de um total de 13.908 aparelhos celulares, somente 649 foram encontrados com visitas.
Não se pode, portanto, atribuir aos visitantes dos presos a responsabilidade pelo problema que envolve os telefones celulares. Afinal, somente 4,6% dos aparelhos apreendidos no Estado do Rio Grande do Sul, nos anos acima mencionados, foram pegos com as visitas.
Mais adiante, o Juiz de Direito mostra, ainda, que, no Presídio Central, o percentual de apreensões de celulares com as visitas, nos anos de 2012, 2013 e 2014, representou 02% do total de celulares apreendidos.
Muito bem, a evidência que amparou minha estimativa foi, assim, produzida pela própria SUSEPE e referida em fundamentação de importante sentença judicial que eu pensava ser amplamente conhecida.
Na verdade, no período considerado pelo magistrado, 95,4% dos telefones celulares não entraram nos presídios pelas visitas, o que mostra que minha estimativa foi conservadora (considerei, de fato, a necessidade de uma margem para situações diversas não ligadas à corrupção). Se tomarmos essa proporção como a média da última década, estamos falando de cerca de 68.688 celulares apreendidos com presos. Se não entram pelas visitas, então como entram? Bem, há casos registrados e que se repetem especialmente em alguns estabelecimentos de arremessos de celulares por sobre os muros da prisão. Sim, sem dúvida. Ocorre que essas tentativas são quase sempre frustradas pelo trabalho dos agentes e não há como se sustentar que 68 mil celulares tenham chegado às mãos de internos por esse caminho. Seria ficcional, resultado de ingenuidade ou má fé. Celulares não chegam até os presos por caminhos misteriosos, nem por arremessos, nem por drones. Também não foram teletransportados. O processo que os conduziu foi alimentado por uma antiga lei: a da oferta e da procura. Quanto mais rigorosas forem as normas e a vigilância contra a entrada de celulares e quanto maiores e mais frequentes forem as apreensões, maior o valor do aparelho intramuros. Se fosse simples introduzir um celular em um presídio, se as visitas o fizessem com naturalidade, não haveria um próspero mercado ilegal nas instituições.
O mercado existe e é, obviamente, fortalecido pelas apreensões – ainda que essa dinâmica não seja percebida. Um celular comum pode valer muito na cadeia. Há situações já documentadas no Brasil de celulares sendo vendidos por até 15 mil reais, como se soube na Paraíba, em 2016 (leia aqui: https://goo.gl/PuJdSK ). O valor aparentemente recordista de venda de celulares em prisões brasileiras foi alcançado em um dos mais rigorosos presídios, o de Presidente Prudente, em São Paulo, onde estão algumas das lideranças do PCC. Nesse estabelecimento, o Ministério Público descobriu que alguns agentes cobravam 25 mil reais por aparelho (leia aqui: https://goo.gl/Kze4fD). Em todo o Brasil, casos de prisão de servidores (agentes ou não) envolvidos com a venda de celulares e drogas têm se multiplicado, o que está correlacionado ao aumento da lucratividade derivada das dificuldades impostas. O mercado é uma instituição fortíssima. Nisso, os liberais têm toda a razão.
(*) Doutor e mestre em Sociologia e jornalista. Presidente do Instituto Cidade Segura. Autor, entre outros, de “A Formação de Jovens Violentos: estudo sobre a etiologia da violência extrema” (Appris, 2016)

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Seco comanda seus negócios de dentro da Pasc: "Que falta faz estar na rua"

Grampos telefônicos mostram criminoso falando como se estivesse livre, atuando junto com os parceiros na rua

Conversas sobre levar filhos para a creche e em torno de um serviço de pintura em uma casa poderiam soar como diálogos banais entre pais de família, para quem não soubesse quem são os interlocutores. Tem sido assim, usando códigos e meias-palavras, que criminosos como José Carlos dos Santos, o Seco, tratam de seus negócios por celular, dentro e fora da cadeia.
Não é preciso ouvir muito do que Seco fala a partir de sua cela na Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc) para atestar: ele age como um empresário de ramo diversificado. Trata de assaltos, tráfico de drogas, apoio a comparsas, compra de armas, clonagem e venda de carros, determina depósitos bancários e organiza a compra e aluguel de imóveis em regiões onde deseja comercializar drogas.
Normalmente demonstrando bom-humor, muitas vezes fala como se estivesse livre, atuando junto com os parceiros na rua. Chama os parceiros de "amigão" e também conversa amenidades, como a preocupação com o excesso de chuvas.
"Ele tem um jeito de falar, como "nós fizemos, nós fomos", que parece que ele está junto, na rua, participando" — comenta o delegado de Roubos, Joel Wagner.
Seco, de fato, lamenta não estar em liberdade exibindo a habilidade e ousadia que surpreenderam a polícia em ataques a carros-fortes 10 anos atrás.
"Que que eu ia te dizer, amigão, que falta faz eu na rua, hein?" — diz o assaltante a um parceiro, ao comentar a ação desastrada de outra quadrilha que atacou um carro-forte sem sucesso.
 Ele conta ter no visto noticiário:
"Eu não consegui ver direito, só vi na televisão e na internet (dentro da Pasc). Só arranharam a casa do gato (referência a danos ao carro-forte)."
Nos diálogos interceptados, também revela como costuma manter a ordem sobre seus negócios. Em um registro feito pela Polícia de Santa Maria, homem identificado como o Seco diz ao interlocutor que dará aviso a um comparsa, e que de uma próxima vez, mandará "passar fogo". O homem teria repassado droga com baixa qualidade ao grupo.
"É que, aí no Interior, eles dão essas... Se é aqui na Capital, já tinha arrancado a cabeça dele".
Quadrilha comandada por Seco tomou bocas de fumo em Santa Maria

Já as tratativas para a pintura de uma casa flagradas pela polícia em escutas autorizadas pela Justiça eram, segundo a investigação, um plano para atacar o sítio de um empresário em Carlos Barbosa e, além de roubar, sequestrá-lo. A fala sobre levar os filhos para a creche, num sábado, nada mais era, conforme a polícia, do que a explicação sobre a quantidade de comparsas que estava sendo enviada à região para apoiar a ação.

"Ainda bem que a creche funciona sábado, tenho que levar muitos filhos, né" — diz a Seco um homem identificado pela polícia como Paulo Henrique Rodrigues da Silva, o Paulinho Guri.
No mesmo diálogo, a dupla fala sobre o empresário alvo do ataque manter no sítio "cadernos". É uma referência a armas, já que no local havia um stand de tiro. A ideia do ataque não teria sido de Seco. Acomodado em sua cela na Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc), ele recebeu a proposta por telefone, de um antigo comparsa que, segundo a polícia, é Adelar Correa, conhecido como Lai ou Jaca.
"Tem uma casa para pintar. Precisaria umas duas pessoas para ajudar a pintar" — informa a Seco um interlocutor identificado como Adelar.
Seco diz que vai pensar se tem interesse de participar da ação. Em outra conversa, já mais informado sobre a oportunidade, Seco diz a Paulinho que o negócio "é nervoso" e que vão "encher a guaiaca", em referência ao potencial do que pode ser encontrado em valores na casa. O ataque foi executado, mas o empresário não apareceu no local. Os criminosos ficaram em torno de 10 horas no sítio, mantendo caseiros e um filho deles como reféns.

Em outra conversa, que seria com Adelar, Seco se diverte porque o parceiro não consegue informar uma conta bancária por mensagem, e precisa ditar. Na cela, Seco faz a anotação para mandar fazer um depósito. Ao falar com um parceiro de Santa Maria, o assaltante recebe a oferta de uma arma, uma pistola:

"Tu não te interessa numa plus, linda, linda, com quatro carregador, nova, na caixa? É cinco conto".
Leia as últimas notícias
"E vem os pente cheio?" — pergunta Seco.
Assim é a rotina de Seco na Pasc, ao telefone: um homem de negócios.

Por: Adriana Irion/ZH