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domingo, 26 de setembro de 2021

MP abre inquérito para apurar suposta improbidade e marca audiência de vereador do PSL

Recém chegou como vereador de Porto Alegre e agora já tem denúncias da Susepe, da Câmara e do MP... Já está mal o agente penitenciário Alexandre Bobadra

O Ministério Público (MP) instalou inquérito para apurar suposta prática de atos de improbidade administrativa pelo vereador de Porto Alegre Alexandre Bobadra (PSL), apontou a existência de “robusta prova indiciária” e, ao concluir que a fase probatória está finalizada, agendou depoimento do investigado para o dia 7 de outubro.

As informações constam nos despachos da Promotoria de Defesa do Patrimônio Público, cuja consulta é pública. Bobadra é investigado por ter acumulado os salários de vereador e de agente penitenciário estadual, a partir de 1º de janeiro de 2021, mesmo sem trabalhar na segunda função. Somente entre janeiro e março, em valores brutos, ele recebeu R$ 40,3 mil. O caso foi revelado em reportagem do Grupo de Investigação da RBS (GDI). Em manifestação de defesa, Bobadra nega qualquer ilicitude e afirma ter “vasta documentação” para comprovar a legalidade dos seus atos perante o MP (veja contraponto na íntegra ao final)

Desde janeiro, o parlamentar emendou licenças paternidade, saúde e prêmio, além de um período de férias, para manter-se vinculado à função, recebendo o soldo sem a necessidade de cumprir escala na Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe).

Os artigos 38 da Constituição e o 156 da lei complementar 10.098 dizem que o vereador somente poderá acumular funções do setor público caso haja compatibilidade de horários. Ou seja, se não há como exercer o mandato de vereador e cumprir carga horária da outra função pública, o parlamentar deve se licenciar do cargo efetivo. 

A análise dos fatos e documentos aqui reunidos permite concluir pela presença de indícios probatórios de conduta ímproba praticada por Alexandre Bobadra, consistente na vulneração de princípios regentes da administração pública, notadamente o da legalidade, o da moralidade e da lealdade com as instituições, bem como prejuízo ao erário”, despachou o promotor Cláudio Ari Mello, no ato de instauração do inquérito civil, em 7 de julho.

No trâmite processual, consta comunicado da Susepe informando que Bobadra “não solicitou afastamento de suas funções após ter sido eleito e empossado vereador”. É registrado que ele requereu, em 1º de março de 2021, a troca da sua lotação na Susepe para que pudesse fazer uma escala de trabalho diferenciada e “sem previsão legal”. Ele tentou deixar a Escola dos Serviços Penitenciários, de horário comercial diário, para concorrer a plantões apenas às sextas, sábados e domingos na Divisão de Segurança e Escolta, o que foi considerado ilegal, diz o MP. 

Está inequivocamente demonstrado que Alexandre tinha conhecimento e compreensão da impossibilidade de conciliar os horários para se manter em atividade nos dois cargos públicos”, anotou o promotor.

Enquanto recebia os salários sem trabalhar, Bobadra acumulava licenças na Susepe. Uma delas foi a licença-prêmio entre 1ª de março e 29 de maio, na qual foram detectadas possíveis irregularidades pela própria Susepe após a publicação da reportagem do GDI. 

O formulário de requerimento continha falha ou rasura no número de dias de licença solicitados, não estava corretamente datado (o que impossibilitava saber a data do protocolo do requerimento), bem como não foi assinado pela chefia imediata do servidor”, registra o MP. 

A própria Susepe, após o caso tornar-se público, declarou em processo administrativo “a total incompatibilidade de horários” entre as atribuições de vereador e de agente penitenciário. A licença-prêmio concedida ao parlamentar acabou anulada. A Susepe modificou a situação funcional de Bobadra para “em licença para exercer mandato público efetivo” a partir de 1º de janeiro de 2021. Em ato administrativo, o órgão penitenciário ainda requisitou a restituição aos cofres públicos dos salários recebidos sem trabalhar. O MP, nos autos, busca junto ao governo estadual alguma comprovação sobre a realização ou não do ressarcimento ao erário. 

Em agosto, o inquérito foi redistribuído para a promotora Roberta Brenner de Morares. Em setembro, ela considerou que “as provas necessárias aos encaminhamentos finais já foram produzidas” e designou audiência para ouvir Bobadra no dia 7 de outubro. 

CONTRAPONTO 

Por telefone, o vereador Alexandre Bobadra se manifestou em três tópicos, assegurando a legitimidade e a legalidade dos seus atos. Diz o parlamentar:

1 - Foi juntada perícia comprovando que não houve rasura nenhuma no pedido e concessão de licença-prêmio.

2 - O pedido de remoção interna na Susepe foi feito em dezembro de 2020. Temos vasta documentação a respeito.

3 - Não pretendo me manifestar mais para não prejudicar a minha audiência do dia 7 de outubro.

sábado, 3 de abril de 2021

Como MP e Polícia Civil agem para conter influência de líderes de facção que retornam ao RS

Estratégia, informações de inteligência e trabalho integrado entre instituições da segurança pública tentam conter avanço dos assassinatos

Em julho de 2017, 27 líderes do crime organizado foram transferidos para prisões federais

A análise da necessidade de transferência de presos para penitenciária federal passa pela compilação de informações de agências de inteligência de Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe), Brigada Militar (BM), Polícia Civil e Ministério Público. Quando um nome começa a ser mencionado em mais de uma delas, é o sinal de alerta para sua importância e periculosidade. Conter o avanço de assassinatos em Porto Alegre mesmo com o retorno de líderes de grupos criminosos violentos para o sistema prisional gaúcho — ou mesmo reforçar pedidos para permaneçam fora do Rio Grande do Sul — requer estratégia, informações inteligência e trabalho integrado entre instituições da segurança pública. Na terça-feira (30), GZH mostrou como a volta paras as cadeias do Estado de três presos transferidos para penitenciárias federais entre 2017 e 2018 tem impactado no aumento da violência em regiões da Capital. Com a comunicação com o mundo externo restabelecida, passam a focar na expansão de territórios para venda de drogas, o que gera disputa entre facções rivais.

Os pedidos, que também contêm informações de ocorrências e inquéritos, são elaborados por Secretaria da Segurança Pública (SSP), Polícia Civil e BM e referendados pelo MP, com o objetivo de demonstrar que um conjunto de instituições defende determinadas remoções. A análise das transferências passa pelo crivo de um colegiado juízes do Estado e depois é encaminhada para o magistrado federal. Quando um preso vai para o sistema federal e retorna, esse trabalho volta para a estaca zero.

Com atuação na 1ª Vara do Júri da Capital desde 2004, a promotora Lucia Helena Callegari tem convicção que a remoção de presos diminui a criminalidade do dia a dia e impacta na estrutura de políticas de segurança pública com reflexos na rua:

"A remessa para o presídio federal desestrutura a facção, não tenho dúvida disso. Não só tira o acesso a celular, mas o contato com todos os subordinados e mesmo aquele contato direto com quem entra e sai do sistema, o que permite entrega de recados. Nada acontece sem que o líder tenha conhecimento. Se não deu a ordem para matar, dá o aval, o que também é ruim."

Em 2017, começaram as transferências de primeiro escalão dos grupos, seguidas por operações nos anos posteriores que também miraram segundo e terceiro níveis hierárquicos das organizações criminosas. 

O MP também recorre dos pedidos de transferências que não são aceitos pelo Judiciário e reúne elementos para manter a remoção dos que ainda seguem no sistema federal. Dentro desse contexto, são determinantes a colaboração de integrantes da própria facção, por meio de delação premiada, e a apreensão e análise celulares.

"Mostramos o quanto foi positiva a permanência e como o retorno é difícil em termos de sociedade. As remessas e as escolhas são muito estudadas, não são aleatórias, passam pelo crivo de diversas instituições. A nossa missão é desorganizar o crime e o Estado estar à frente das ações deles. Essa disputa não é só sobre quem mata, mas também a forma como se mata e como se exibe isso"  — argumenta a promotora.

A diretora do Departamento de Homicídios da Polícia Civil, delegada Vanessa Pitrez, reconhece que manter A queda indicadores de homicídios com líderes dentro da cadeias do RS é mais desafiador. Requer trabalho de inteligência mais apurado que possibilite a polícia se antecipar a ocorrência dessas mortes.

"Quando se tem qualquer sinal que está para acontecer uma disputa pelo domínio do tráfico em certa localidade, usamos estratégias para frustrar essas ações, como o trabalho focado em prender alguns executores mesmo que seja por outros homicídios."

Um dos principais focos da polícia para conter o acirramento das disputas sangrentas é fazer com que os inquéritos responsabilizem a última instância de comando do grupo. Outro são as operações contenção, para saturação de áreas toda vez que se identifica a iminência de um novo conflito, reforçando a presença da polícia para prender foragidos e aumentar sensação de segurança da comunidade local. Uma dessas ações foi feita logo depois atentado, em outubro do ano passado, quando criminosos passaram de carro disparando contra um veículo estacionado em frente à emergência do Hospital Cristo Redentor. Na época, o foco da saturação foram áreas do bairro Sarandi, na Zona Norte.

Também cabe à polícia reunir informações para reafirmar a necessidade de retorno dessas pessoas ao sistema federal, como forma de minimizar seu comando e a ordem de novos assassinatos. Nisso reside a importância de formar prova que responsabilize os líderes pelo mando de mortes nas ruas, dando argumentos contundentes para embasar os pedidos de remoção.

"80% dos presos que vão para o federal, vão pelos homicídios, não vão por causa de tráfico e porte de arma. Uma pequena parcela vai por envolvimento em roubo a banco ou por integrar organização criminosa de roubo de veículo. O que manda eles para o sistema federal são inúmeros homicídios, que são os crimes mais graves e que mantêm o preso provisório mais tempo na cadeia até que ele seja julgado. Quando o preso vai para penitenciária federal, ele fica adormecido lá, inviabilizado. Mas não sai daquela posição de comando. Não perde a posição e status e, quando retorna, quer mostrar força" — explica a delegada.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2021

Dez anos após megaoperação, Justiça reconhece prescrição de crimes de tortura em cadeias de Caxias do Sul

Na época, 35 agentes penitenciários foram denunciados e afastados das funções, mas processo nunca analisou provas ou oportunizou defesa. Quantidade de réus, sobrecarga de processo e falta de juízes estão entre as explicações para a extinção da punibilidade.

Em uma das operações mais abrangentes do sistema prisional caxiense, 254 policiais militares de Porto Alegre subiram a Serra em 17 de junho de 2010 e invadiram a, na época, Penitenciária Industrial de Caxias do Sul (a antiga Pics). Liderada pelo Ministério Público (MP), a força-tarefa buscava provas de crimes de corrupção que estariam acontecendo na Pics e também na Penitenciária do Apanhador. Seis meses depois, 35 agentes penitenciários e três apenados foram denunciados por tortura, narcotráfico e formação de quadrilha. Pouco mais de dez anos após a denúncia, o processo não teve nenhuma audiência e a 2ª Vara Criminal reconheceu que os crimes prescreveram. O resultado: o Estado perdeu, em primeira instância, o direito de responsabilizar os réus. O formato da denúncia que dificultou o cumprimento de mandados, o volume excessivo de processos na vara responsável pelo andamento do processo e a falta de juízes são as explicações para uma megaoperação terminar sem culpados.

A decisão pela extinção da punibilidade foi assinada pela juíza Gabriela Irigon Pereira em 19 de novembro de 2020. A magistrada argumenta que sequer foi iniciada a instrução do processo (quando seriam citados os réus para apresentarem defesa), que a maioria dos réus mora fora de Caxias do Sul (o que dificulta intimações e audiências) e que a pauta de audiências da 2ª Vara Criminal já está preenchida até junho de 2022. Ou seja, o processo ultrapassaria os 12 anos sem sequer analisar as provas ou apresentação de defesa dos acusado. Gabriela explica que, ao final do processo, as penas seriam abaixo de quatro anos, o que levaria a prescrição conforme estabelecido no artigo 109 do Código Penal.

"Foi uma operação muito grande e a ação penal foi feita de uma forma que, na prática, não funciona. Depois de alguns anos, se percebeu que este formato não funciona e já não se trabalha mais assim. Não se denunciam 38 pessoas na mesma ação penal, porque isso inviabiliza o resultado. Não temos estrutura para 38 mandados de citação, 38 advogados peticionando no mesmo processo, 38 pedidos de carga, pedidos de vista, numa época que o processo era físico. Torna lenta demais a tramitação" — explica a magistrada.

Outra dificuldade foram os quase três anos em que a 2ª Vara Criminal ficou sem um juiz titular entre 2014 e 2016. No período, a Vara foi atendida em substituição pelo juiz da violência doméstica, que desta forma não tinha tempo suficiente para atender a um processo tão volumoso e sem réus presos.

"Quando cheguei em 2016, tentamos desmembrar em processos menores. Esses 38 réus viraram grupos de réus para cada crime imputado. Se desmembrou em 11 novos processos para tentar dar o andamento e buscar um resultado final exitoso, que é uma sentença de mérito, seja condenatória ou absolutória. Só que, depois de seis anos, nenhum dos réus estava mais em Caxias do Sul."

Quando um réu mora em outra cidade, o instrumento utilizado pela Justiça são as cartas precatórias. Trata-se de um pedido feito pelo magistrado ao juiz de outra cidade, para que aquele Fórum intime o acusado do processo. A juíza Gabriela aponta que o vai e vem de documentos não funciona em um processo com tantos réus.

"A nossa estrutura em um processo físico é deficitária, numa vara grande mais ainda, que ficou tanto tempo sem um juiz titular e num processo desse tamanho... O risco de prescrição é muito grande. Depois de quatro anos remando nestas precatórias, chegamos a conclusão que era tarde demais, se perdeu a chance de dar uma resposta" — admite a magistrada.

Prevista em lei, a prescrição é a perda do direito estatal de punição, que é calculada conforme a pena prevista para o crime denunciado. Quando a Justiça perde o prazo para o julgamento, o réu não é nem condenado, nem absolvido, a sentença é extinção da punição. É uma sentença administrativa.

Provas não foram analisadas e réus não foram oportunizados a se defender

Ao contrário do que geralmente ocorre, neste caso a culpa da demora não foi da defesa. Apesar de reconhecer que há muitos subterfúgios de advogados que são legítimos, mas atrasam o trâmite de um processo, a juíza da 2ª Vara Criminal aponta que o processo não chegou sequer nesta etapa.

"O que aconteceu nesse caso, que nos engessa, é que são precatórias de citação, que é o início, quando o réu formalmente é cientificado que está sendo acusado de um crime. Essa peça é obrigatória, sob pena de nulidade, e se ele mora em outra comarca precisa ser citado por carta precatória. Até isso acontecer, realmente o processo não vai andar. Nesse caso, a maioria dos réus estava pendente de precatória ou de intimação para apresentar resposta à acusação, pois é um direito se defenderem nos autos. 

Como não se iniciou a fase de instrução do processo, as provas apresentadas pela investigação policial também não foram analisadas. Conforme a denúncia assinada por 12 promotores de Justiça, existiam vídeos de detentos sendo espancados por agentes penitenciários, documentos falsos, interceptações telefônicas e depoimentos de presos."

"A prova inicial foi feita na fase do inquérito e há indícios de um crime que pode ser grave. Mas, a prova judicial nunca se chegou nesta fase. Não se pode falar em falha da polícia ou do MP na investigação e confecção de provas. O problema foi (a denúncia) ser feita neste formato com tanto réus, em uma vara esgotada, com volume excessivo de processos, e numa vara sem titular por muito tempo."

O que diz o MP

Procurado pela reportagem, o Ministério Público afirma que recorreu da decisão judicial de prescrição e aguarda julgamento do recurso. A acusação está sob responsabilidade de dois promotores de Porto Alegre que não quiseram se manifestar sobre o processo e não foram identificados pelo órgão.

Réus devem postular indenização

Uma decisão de prescrição só agrada aqueles que são culpados dos crimes que foram acusados e, assim, escapam da prisão. Para aqueles que são inocentes ou tiveram participação menor nos fatos relatados, a decisão extingue a oportunidade de provar sua inocência.

Com exceção dos três denunciados que eram apenados na época e continuaram presos por outros crimes, os outros 35 réus eram agentes penitenciários que não possuíam antecedentes criminais. Alguns deles sofreram sanções administrativas da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe), incluindo exonerações, outros foram transferidos para outras cidades gaúchas e teve os que optaram por antecipar suas aposentadorias para evitar constrangimentos. Três réus morreram ao longo dos 10 anos de processo.

"Foi o que sempre dissemos: 'a montanha pariu um rato'. Naqueles dias da investigação parecia que tinham encontrado fatos gravíssimos. No decorrer do processo, foi verificado que a gravidade era menor e várias alegações não ficaram comprovadas. Resultou a ser um processo que não foi prioritário. Perdeu a gravidade inicial pela prova inconsistente. Passou a ser secundário o que ocasionou esta prescrição" — afirma o advogado Vitor Hugo Gomes, que representa quatro réus.

O defensor argumenta que a prescrição num caso deste equivale a uma absolvição e que os acusados podem ter direito a serem ressarcidos dos prejuízos que tiveram.

"Até eventuais indenizações (por parte do Estado). Claro, eles não querem aparecer diante desta situação toda. Mas referem diversos problemas diante desta situação (de acusação), tanto financeiros quantos psicológicos. Muitos ficaram desempregados, sem dinheiro e moralmente abalados diante da sociedade. Um dos colegas deles se suicidou neste período, fato que foi noticiado e a provável causa é este processo" — relata Gomes.

Um dos réus considera que a investigação "foi enganada por um grupo de marginais". Após o afastamento das funções de agente penitenciário, o homem de 36 anos virou advogado e trabalha em Porto Alegre. Assim como os demais denunciados, ele pede para ter a identidade preservada para não ser ainda mais exposto.

"Os marginais que se diziam vítimas de tortura estavam, na verdade, tentando algum tipo de benefício. Esses servidores afastados eram atuantes, combatiam o tráfico de drogas naquela cadeia e, por esta razão, não eram bem vistos por aquela massa carcerária. É a desculpa mais batida dentro do sistema prisional, inventar uma situação de vítima de agressão ou maus-tratos para tentar ser transferido ou conseguir algum benefício. É uma inversão de valores muito grande" — defende-se.

O réu lembra que as denúncias aconteceram após a inauguração da Penitenciária Estadual do Apanhador, cadeia que prometia ser modelo de cumprimento de pena, mas hoje é base para facções criminosas ordenarem seus crimes. Sobre a decisão de prescrição, o advogado declara que "o próprio MP percebeu o erro e deixou o tempo resolver".

"É um misto de indignação com justiça. Indignação porque perdemos colegas ao longo deste processo, vítima da depressão causada por este processo degradante que deixou um rastro de destruição muito grande na vida destas pessoas. Ao mesmo tempo é de alívio e justiça, porque ninguém foi punido por essas mentiras de marginais. Por isso iremos atrás dos nossos direitos. Queremos reparar a questão administrativa que muitos servidores sofreram" — afirma o réu, que garante que a inocência dele e dos colegas teria sido provada caso o processo tivesse tramitado de forma célere.

Prescrição é comum em crimes com pena menor

A prescrição de um crime pela demora no andamento de processos é a derrota da Justiça criminal. Infelizmente, com varas criminais sobrecarregadas e poucos juízes, essa é uma realidade enfrentada no judiciário gaúcho. A situação é mais comum em crime de menor potencial ofensivo, justamente por suas penas baixas.

"Existe mais do que deveria. A prescrição nos acompanha em varas criminais, principalmente em processos de crimes de penas mais baixas. Em casos de roubos, crimes sexuais e tráfico, é muito difícil prescrever. Mas em crimes de furto, receptação e estelionato, e crimes de trânsito, as chances de prescrição são bem maiores. A razão é esse excesso de processos em tramitação" — admite a juíza Gabriela.

Para evitar a extinção de punibilidade, principalmente em casos de grave violência, o Poder Judiciário conta com três estratégias:

Plataforma virtual
A adoção da tecnologia pelo sistema judiciário gaúcho foi acelerado pela pandemia de coronavírus. O Tribunal de Justiça planeja a digitalização de todos os processos, inclusive os criminais que até então era postergado. Desta forma, o acesso aos autos e o envio de documentos ficam mais fáceis. Mais que isso, o distanciamento social levou a praticamente todos os juízes a manusear uma plataforma para realização de audiências por videoconferência:

"É algo positivo diante desta pandemia. Ao permitir que se ouça uma testemunha que mora em outra comarca no ato, que a audiência seja feita com réus em casas prisionais diferentes, com uma vítima numa outra cidade, com o seu advogado em outra comarca, todos lincados nesta plataforma virtual... Foi um ganho muito grande. Com processos eletrônicos e audiências virtuais, se reduz bastante o tempo de tramitação, é muito mais rápido a ciência dos atos e irá reduzir este tempo das precatórias. Pois, agora, podemos fazer a intimação por telefone, por um aplicativo de envio de imagem. O êxito é grande, estamos vendo um resultado muito positivo" — exalta a juíza Gabriela.

Mudança nas denúncias
Essa é uma postura aperfeiçoada com o tempo. O Ministério Público têm evitado fazer denúncias com dezenas de réus. Mesmo em casos de conluio ou crime organizado, a denúncia é feita em grupos separados por cada crime investigado e datas que ocorreram. Segundo a juíza Gabriela, o ideal são grupos de quatro ou cinco réus.

Vara contra o crime organizado
Outra mudança estudada pelo Tribunal de Justiça é uma vara especializada contra o crime organizado. Este colegiado com cinco juízes atenderia a esses processos mais complexos e que demandam ter um número maior de réus. A escolha é por transformar a 17ª Vara Criminal de Porto Alegre em uma vara de competência estadual, para atender a todo o estado.

"Este tipo de processo irá migrar para esta vara que conta com cinco juízes que atuarão em colegiado para sua segurança. Irá dar um resultado muito positivo, pois são processos grandes, com muitos réus. O nosso cartório, por vezes, atua um dia inteiro em um único processo desses, pois toma muito tempo. Essa migração, portanto, ajudará a dar vazão da nossa demanda" — aponta a juíza da 2ª Vara Criminal de Caxias do Sul.

RELEMBRE O CASO

16 de abril de 2010 - Vídeos de agentes penitenciários agredindo apenados da Penitenciária Estadual do Apanhador são vazados para o público. O caso teve repercussão nacional. Dois dias depois, foi realizada uma intervenção e a Brigada Militar assumiu o controle da maior cadeia da Serra, que havia sido inaugurada em 2008 para ser um modelo para o Estado.

18 de junho de 2010 - Uma megaoperação acontece ao amanhecer, com a entrada de 254 policiais militares de Porto Alegre na Penitenciária Industrial de Caxias do Sul. As buscas por documentos e prova era resultado de uma investigação iniciada em 2009 sobre corrupção de agentes penitenciários, regalias e espancamentos de presos. Três apenados de confiança destes agentes penitenciários foram transferidos. Ninguém foi preso.

7 de dezembro de 2010 - A investigação sobre a Pics e o Apanhador resulta na denúncia de 35 agentes penitenciários e três detentos. O grupo é acusado de formar uma quadrilha que torturava presos nas duas cadeias caxienses. Os supostos crimes eram encobertos por registros manipulados. Os fatos foram descobertos a partir de depoimentos de presos, por interceptações telefônicas e pela apreensão de documentos durante a megaoperação. A denúncia foi assinada por 12 promotores. Entre os fatos relatados, estão surras de "boas-vindas" a detentos transferidos, repasse de armas para "presos de confiança" e registros de ocorrências policiais como autolesões de apenados.

11 de abril de 2011 - O afastamento dos 35 agentes penitenciários envolvidos nas denúncias de tortura contra apenados foi publicado no Diário Oficial do Estado.

quinta-feira, 4 de abril de 2019

“A questão das facções criminosas é objeto de foco central deste governo” , afirma futuro secretário de Administração Penitenciária

Procurador de Justiça Cesar Luis de Araújo Faccioli está se aposentando da carreira no Ministério Público gaúcho para assumir nova pasta nos próximos dias

Cesar Luis de Araújo Faccioli defende a volta de APs ao controle do Presídio Central
O procurador de Justiça Cesar Luis de Araújo Faccioli, 59 anos, está se aposentando da carreira no Ministério Público gaúcho para assumir nos próximos dias a nova Secretaria Estadual de Administração Penitenciária. Nesta entrevista concedida ontem à tarde, por telefone, Faccioli fala de algumas de suas ideias, como geração de vagas nas cadeias, a volta de agentes penitenciários ao controle do Presídio Central, e o fim imediato de presos em delegacias, algemados até em cestas de lixo.
Qual o seu maior desafio na secretaria?
O prioritário é cumprir a LEP (Lei de Execução Penal). O primeiro passo é enfrentar o déficit de vagas. A primeira onda de ações imprescindíveis é abrir novas vagas. 
O déficit carcerário chega a 10,1 mil vagas. E há presos cumprindo pena em casa, por falta de espaços nas cadeias. Como solucionar esse problema?
A ideia em relação a vagas prisionais é evoluir para novas possibilidades que já acontecem no Brasil e também fora. Uma alternativa inevitável, diante de limitações fiscais gravíssimas que enfrentamos, é abrir parcerias com o segundo setor, por meio das PPPs (parceria público-privada), e com o terceiro setor, se possível com o modelo Apac (Associação de Proteção e Assistência aos Condenados, sistema que conta com a administração e tem participação de presos). Queremos resolver a questão das vagas o mais rápido possível. O plano começa a ser construído a partir da minha posse. Tentaremos fazer com a velocidade que a gravidade exige. 
O Presídio Central é uma constante fonte de preocupação no setor devido à superlotação e ao predomínio de facções criminosas. O que fazer para combater esse problema? E a Brigada Militar seguirá administrando o Presídio Central?
Nós temos ideias, algumas compartilhadas outras ainda não com o secretário de Segurança (Ranolfo Vieira Junior) e com o governador Eduardo Leite. Já aderi às diretrizes do programa RS Seguro. Lembro que o trabalho da Brigada Militar no Presídio Central era uma intervenção emergencial, precária e de curto prazo, mas por várias circunstâncias, conhecidas por todos, isso não foi possível. Alinhamos com o secretário de Segurança e o governador a ideia de, o quanto antes possível, retomar a gestão pelo sistema penitenciário. Embora a competência e a importância histórica da gestão da BM, significa, na prática, menos PMs na atividade-fim. A questão das facções criminosas é objeto de foco central deste governo. Inclusive está como eixo central do Programa RS Seguro. Vamos construir estratégias. Esse planos serão construídos a partir da posse e das primeiras reuniões.
Há prazo? Será possível reassumir o Central com recursos humanos disponíveis?
Exatamente por isso que estou sendo contido em relação a projeções de prazo, pois temos de trabalhar com a realidade das limitações do quadro e das questões orçamentárias e fiscais para a expansão imediata.
A Pasc deixou de ser considerada de segurança máxima, tanto que o governo passado solicitou a transferência de lideranças para penitenciárias federais. É necessária a criação de uma unidade de segurança máxima no Estado?
Já iniciei este debate com a Secretaria de Segurança. Existe um diagnóstico, do qual compartilho. Há necessidade de uma penitenciária de segurança máxima. Se não uma nova obra, ao menos espaços ou reforma ou permuta.  
Como o senhor avalia o fato de audiências judiciais serem canceladas porque a Susepe não dispõe de recursos para levar presos até os fóruns?
Isso vem trazendo problemas para a execução criminal e, como em muitos casos, há custos extras com retrabalho, com mais impacto aos combalidos cofres públicos. Um dos eixos do sistema prisional é a adoção de novas tecnologias, como exemplo, as videoconferências, que já acontecem e têm se revelado eficientes. 
Temos visto cenas de pessoas capturadas que ficam em delegacias algemadas em micro-ônibus, em barras de ferro, em cesta de lixo e até em transformador de energia. Como o senhor pretende resolver essa questão?
A curtíssimo prazo, uma das metas do governo é garantir a ausência de qualquer detento em delegacias de polícia e em viaturas. Sabemos que houve avanço na última administração, mas a situação recrudesceu.  A ideia é uma gestão eficiente do próprio sistema. Assim que tomar posse, vamos construir essa solução. Não poderia entrar em detalhes agora, mas é compromisso do governo. São soluções paliativas para “apagar este incêndio”. Resolvida essa questão, segue-se as metas de médio e longo prazo, que é busca de expansão de vagas. 
Uma das causas deste problema é a falta de vagas no semiaberto. Hoje, temos 600 presos com progressão autorizada para o semiaberto, mas ainda ocupando espaços de presos que estão em delegacias. Como resolver a questão do semiaberto, já que governos anteriores investiram em controle por meio de tornozeleiras eletrônicas?
Essa questão está dentro da diretriz de cumprimento geral da LEP. Em relação ao semiaberto, buscaremos o aprimoramento de monitoramento de dados e de cumprimento de sentença. Controle rigoroso e eficiente do semiaberto é fundamental. A tornozeleira é equipamento útil, mas não é um regime prisional. Temos de melhorar o sistema e abrir novas vagas para o exato cumprimento da LEP. Nos parece o déficit mais visível neste primeiro diagnóstico.

quarta-feira, 8 de agosto de 2018

Testemunhas depõem sobre caso de 49 agentes penitenciários suspeitos de fraudes em diárias da Susepe

Acusação identificou desvios em pelo menos 769 notas fiscais falsas de hotéis

A 11ª Vara Criminal do Foro Central de Porto Alegre realiza nesta terça-feira (31) uma série de audiências para ouvir dezenas de testemunhas no caso de 49 agentes penitenciários denunciados em 2015 por fraude em diárias da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe). Os desvios superaram R$ 1,5 milhão em apenas um ano, mas o Ministério Público acredita que podem chegar a R$ 11 milhões.
Estão sendo ouvidas as testemunhas que residem em Porto Alegre e que envolvem dez réus investigados por crimes contra a administração geral. Na quarta e na quinta-feira serão ouvidas, por videoconferência, testemunhas de outros municípios.
Devido à complexidade dos fatos, o caso foi dividido em três processos. Além deste, há outro sobre crimes contra a administração em geral e um terceiro envolvendo ação de improbidade administrativa. Todos eles têm audiências marcadas para agosto e setembro deste ano. Além da Capital, há testemunhas dos três processos em Pelotas, Ijuí, Charqueadas, Santa Rosa, Taquara, Montenegro, Santo Ângelo, Santa Maria, Cerro Largo, São Luiz Gonzaga, Tucunduva, Bento Gonçalves, além de Florianópolis, Curitiba e Sinop, no Mato Grosso. Alguns deles, bem como réus, pelo menos dois, não estão sendo localizados. 
Em 2015, o Ministério Público denunciou 49 agentes penitenciários envolvidos em esquema para fraudar diárias da Susepe. Só em 2014, o prejuízo foi superior a R$ 1,5 milhão.
Entre os denunciados há dois suspeitos que eram supervisores da divisão de monitoramento eletrônico na época das investigações. Ao todo, foram apontados mais de 900 fatos criminosos resumidos em peculato e falsidade ideológica. Os envolvidos foram investigados na chamada Operação $u$epe, da Promotoria Especializada Criminal.
Na ocasião, foram cumpridos mandados de busca e apreensão em quatro hotéis da Capital para a localização de registros relativos aos hóspedes dos estabelecimentos, nos anos de 2013 e 2014, bem como as segundas vias das notas fiscais emitidas naqueles anos. Alguns dias depois da ação, a Susepe trocou toda a chefia de monitoramento.
As investigações identificaram desvio de diárias envolvendo 158 agentes penitenciários, que utilizaram nas prestações de contas junto à Susepe pelo menos 769 notas fiscais falsas de hotéis. As notas foram apresentadas por agentes penitenciários que desempenhavam suas funções no monitoramento eletrônico, para a comprovação de hospedagem em Porto Alegre. Os agentes moravam na cidade e estavam lotados apenas formalmente no Interior com o intuito de obter os valores.

terça-feira, 23 de maio de 2017

MP-RS deflagra operação contra desvios de recursos na Escola do Serviço Penitenciário

Conforme a investigação, entidade pagava por serviços não prestados e compras falsas. Ex-diretor, servidores e empresários são investigados

O Ministério Público do Rio Grande do Sul deflagrou, nesta segunda-feira (15), uma operação contra desvios de recursos na Escola do Serviço Penitenciário (ESP), vinculada à Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe). São cumpridos mandados de busca e apreensão, e um de sequestro de uma motocicleta BMW, que teria sido comprada com dinheiro oriundo da fraude.
De acordo com a investigação, um ex-diretor da entidade e servidores são suspeitos de pagarem por serviços e compras não realizadas. A fraude aconteceria por meio de simulação das transações. São investigados os crimes de peculato, falsidade documental e lavagem de dinheiro cometidos entre 2015 e março de 2017.
Os mandados de busca e apreensão são cumpridos em duas residências dos investigados e em duas empresas.
Motocicleta BMW que teve ordem de apreensão emitida pela Justiça a pedido do Ministério Público (Foto: MP-RS/Divulgação)
Utilizando notas fiscais falsas, fornecidas por empresários, os suspeitos atestavam as falsas compras e contratações de serviços. Conforme a documentação obtida pela investigação, a maior parte das despesas suspeitas era referente a produção de materiais gráficos voltados para o ensino, como apostilas, pastas e folhas, além de serviços de manutenção elétrica e equipamentos de ar-condicionado.
Outros servidores eram responsáveis pelo adiantamento dos valores, recebimento dos materiais e serviços não prestados, bem como da prestação de contas.
A investigação conseguiu apurar que as duas empresa que prestavam serviços gráficos, com a ajuda e conivência de servidores, pertenciam à mesma pessoa. Uma das empresas sequer poderia emitir notas fiscais por conta da situação junto à Receita Estadual.
Uma das notas fiscais é referente a compra de folhas A4, sendo que o material estava disponível no almoxarifado da Susepe, sem a necessidade de uma nova compra. Durante diligência, a polícia descobriu até que a empresa responsável pela nota sequer comercializava o material.
Em uma outra nota, a empresa relatou ter vendido um toldo para a escola. Quando indagado pela Controladoria Geral do Estado do Rio Grande do Sul, o ex-diretor suspeito relatou que se tratava de um erro no preenchimento da nota fiscal fornecida pela gráfica, e que ao invés de toldos, foram fornecidos adesivos que funcionavam como lacres de cartas.
Os procedimentos supostamente fraudulentos eram realizados por meio de “adiantamento de numerário”, modalidade de pagamento de despesas emergenciais, que pode ser aplicado para despesas de até R$ 8 mil.
A Susepe informou por meio de nota que a investigação foi iniciada a partir de informações repassadas pela corregedoria da superintendência e pela Procuradoria do Estado.
"A instituição manifesta repúdio sobre qualquer ato ilícito de servidores penitenciários contra a administração pública e vai colaborar com todas os procedimentos para esclarecer os fatos", finalizou o comunicado.

quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Único coisa boa do Pacote: modificar o cálculo do dinheiro repassado mensalmente aos demais poderes

Executivo teria deixado de repassar R$ 1,8 bilhão caso medida que vincula verbas para Tribunal de Justiça, Assembleia Legislativa, Ministério Público, Tribunal de Contas, Defensoria Pública e Justiça Militar à arrecadação, proposta nesta semana, estivesse valendo desde 2011

Se a proposta de modificar o cálculo do dinheiro repassado mensalmente pelo governo estadual aos demais poderes estivesse implementada, o Palácio Piratini teria reforçado seu caixa em R$ 1,8 bilhão desde 2011 – em valores não corrigidos. O montante representa pouco mais do total necessário para pagar a folha do funcionalismo do Executivo, que custa em torno de R$ 1,4 bilhão, em um único mês.

Item do pacote de medidas apresentado pelo governador José Ivo Sartori para enfrentar a crise financeira, a proposta de emenda à Constituição (PEC) vincula os recursos de Tribunal de Justiça, Ministério Público, Assembleia Legislativa, Tribunal de Contas, Defensoria Pública e Justiça Militar à arrecadação efetivamente realizada. Envolto com resistências, a medida desassocia o montante repassado mensalmente (duodécimo) para os poderes do orçamento previsto e o relaciona à receita efetivada.

No modelo atual, o governo indica uma perspectiva de arrecadação, que não se concretiza, para equilibrar os gastos com a receita, uma vez que a peça orçamentária não pode conter déficit. Ocorre que o Estado arrecada menos do que a receita prevista, e o dinheiro repassado aos demais poderes não atende a essa proporcionalidade. Dessa forma, o Executivo tem de arcar com o aperto financeiro sozinho, alega o governo. A medida não prevê, entretanto, aumento da transferência caso a arrecadação supere o prognóstico.

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Entendemos ser justo e adequado fazermos o repasse do duodécimo na exata dimensão da receita, ainda mais em um Estado como o nosso, que, cada vez em maior volume, tem uma despesa bem maior do que a receita prevista. Estamos em uma situação de calamidade financeira e é natural que o governo reproduza a percepção popular. Se tem de haver sacrifícios, que sejam compartilhados por todos" – afirma o secretário estadual da Fazenda, Giovani Feltes.

Instituição que recebe a fatia maior do duodécimo, o Tribunal de Justiça (TJ-RS) descarta o argumento de que não divide a conta da crise. O Judiciário sustenta que o percentual repassado pelo Executivo para os outros poderes corresponde a uma quantia ínfima do orçamento estadual.

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Alguns números trazidos pelo Executivo mostram como essa providência é de pouquíssima importância para a questão do Estado, mas de grande relevância para a questão interna do Judiciário. Isso é devastador dentro do tribunal. Desarruma o que está razoável sem arrumar o que está mal" – defende o presidente do Conselho de Comunicação Social do TJ-RS, desembargador Túlio Martins.
Mudança pode impactar quadro de servidores Para entrar em vigor, a PEC precisa ser aprovada em dois turnos na Assembleia Legislativa por três quintos dos deputados gaúchos – o que equivale a 33 votos. Dentro da própria Secretaria da Fazenda, há dúvidas sobre a admissão da medida, uma vez que os parlamentares votarão um corte no seu próprio orçamento. Mas o presidente em exercício da Casa, Adilson Troca (PSDB), diz que o projeto “tem de ser aceito”.

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Temos de entender que o Estado está passando por uma dificuldade muito grande. Na minha opinião, não é justo que todo mundo faça sacrifício e a gente não" – argumenta o deputado.

Na Assembleia, estima-se que o primeiro impacto da medida, que, somente neste ano, retiraria R$ 78 milhões da conta do Legislativo, seria no pagamento dos servidores – hoje, 92% do orçamento vai para ativos e inativos. Já no âmbito do Judiciário, caso a proposta seja aceita, não deve ocorrer qualquer nomeação para suprir o déficit superior a 2 mil servidores e juízes.

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Enquanto o Executivo não tem reajuste e ainda recebe os salários parcelados, os servidores do Judiciário tiveram reajustes, recebem em dia, e os membros ainda ganham integralmente auxílio-moradia e pagamentos retroativos do auxílio-moradia e da refeição. Eles ainda são o primo rico" – observa Darcy Carvalho dos Santos, especialista em finanças públicas.

DÉBORA ELY

O QUE É
-Proposta de emenda à Constituição passa a vincular os repasses aos órgãos dos poderes Legislativo e Judiciário, ao Ministério Público e à Defensoria Pública do Estado à receita corrente líquida efetivamente arrecadada, limitados ao que estava previsto no orçamento. Hoje, os repasses são feitos conforme o que foi aprovado na lei orçamentária, independentemente da arrecadação ter sido confirmada ou não.
O IMPACTO
-O governo do Estado estima redução de 12,5% nos repasses – R$ 575,5 milhões por ano.