Legislação diz que parlamentar pode acumular
funções se houver compatibilidade de horário, mas Alexandre Bobadra (PSL)
emendou licenças e férias para manter remuneração de agente penitenciário sem
cumprir escalas
Alexandre Bobadra se elegeu vereador em 2020
Leonardo Contursi / Câmara de Porto Alegre
O vereador Alexandre Bobadra (PSL) está acumulando, desde janeiro,
os salários de parlamentar na Câmara de Porto Alegre e o
de agente penitenciário pelo Estado do Rio Grande do Sul. No primeiro mês de
2021, logo após assumir mandato, chegou a receber o somatório de R$ 36,2 mil de
fontes públicas em valores brutos. A legislação em vigor diz que o vereador
somente poderá se manter ativo, recebendo o salário do cargo efetivo, em caso
de haver compatibilidade de horários e o consequente cumprimento da carga
horária. No caso específico, Bobadra teria de obedecer escala na Superintendência de Serviços Penitenciários
(Susepe). Caso não haja a compatibilidade, o
parlamentar deve ser afastado da função, sem receber a remuneração do cargo
público efetivo enquanto estiver no exercício da vereança. É o que dizem os
artigos 156 da lei complementar 10.098 e o 38 da Constituição Federal.
Apesar
das normas, Bobadra recebeu salários de agente penitenciário em janeiro,
fevereiro e março sem trabalhar. Ele não se afastou da função e, desde janeiro,
vem requerendo diferentes modalidades de licenças e períodos de férias,
acumulando os vencimentos de vereador e de agente penitenciário. A licença que
mantém o parlamentar atualmente fora da escala laboral está sob suspeita de
irregularidade, tendo sua revisão determinada pelo governo estadual após
questionamento da reportagem.
O
advogado Fabiano Barreto da Silva, que atua na defesa de Bobadra, afirma que a
situação “jurídico-funcional está absolutamente regular” e que, “no que tange
aos valores recebidos do erário estadual a título de salários deste ano, nada
de irregular existe (veja contraponto na íntegra ao final).”
Conforme dados do Portal Transparência do governo estadual,
Bobadra obteve remunerações brutas de R$ 21,7 mil em janeiro, incluindo uma
função gratificada de diretor de escola do serviço penitenciário, R$ 9,1 mil em
fevereiro e R$ 9,5 mil em março. A carga horária que deveria ter sido cumprida
é de 40 horas semanais. No mesmo período, ele contou com o vencimento de R$
14,5 mil ao mês, em valores brutos, pelo exercício do mandato.
Na
condição de parlamentar, os compromissos mínimos de Bobadra são as sessões
plenárias às segundas e quartas-feiras, às 14h. É costumeiro que as reuniões se
estendam até o início da noite. Nas manhãs de quarta-feira, às 11h, ele tem a
reunião de líderes partidários, considerando que é o único integrante da
bancada do PSL.
Nas
terças-feiras, às 14h, tem encontro da Comissão de Defesa do Consumidor,
Direitos Humanos e Segurança Urbana (Cedecondh), da qual é presidente. Afora
isso, são comuns a qualquer mandato de vereador a presença em bairros e em
instituições públicas e privadas, além de reuniões políticas no gabinete da
Câmara, nos partidos e na prefeitura. É com essa agenda que Bobadra precisa
conciliar os plantões de agente penitenciário.
A
reportagem questionou a Secretaria da Administração Penitenciária (Seapen), que
congrega a Susepe, se o vereador havia cumprido as escalas de trabalho,
atestado a efetividade e em qual penitenciária havia feito isso.
A pasta
respondeu que Bobadra está requerendo o direito de acumular as funções de
vereador e de servidor público, tendo apresentado documentação para isso, o que
está em análise de compatibilidade em processo administrativo. Também foi
informado pela Seapen que, desde janeiro, Bobadra emenda benefícios que o
mantêm afastado do trabalho: “Tomamos conhecimento que o servidor está em gozo
de licença desde o início do ano. Sucessivamente, uma licença-paternidade,
depois férias, depois uma licença de saúde curta e, por fim, licença-prêmio”,
diz a Seapen, em nota.
O titular
da secretaria, Cesar Faccioli, determinou a análise detalhada da atual
licença-prêmio concedida ao vereador por suspeita de
"inconformidade".
“Diante
da possibilidade de aparente inconsistência do ato de concessão da
licença-prêmio, considerando que se trata de competência administrativa da
Susepe, já no sábado (17 de abril) o secretário orientou o superintendente (da
Susepe) a revisar o ato referido, caso confirmada inconformidade. Ainda
recomendou que a análise incluísse também os atos relativos aos demais
afastamentos”, informou a Seapen.
CONTRAPONTO
O que diz o vereador e agente penitenciário Alexandre Bobadra
(PSL)
O
advogado Fabiano Barreto da Silva enviou nota à reportagem.
“1 – A
situação jurídico-funcional do servidor público Alexandre Bobadra está
absolutamente regular, tanto junto ao Estado do Rio Grande do Sul, como à
Câmara Municipal de Vereadores.
2 –
Quando da posse no cargo de vereador, estava de licença-paternidade, a qual
findou-se em 25/01/2021.
3 – De
26/01/2021 até 24/02/2021, esteve no gozo de férias regulares, conforme artigo
7º, XVII da Constituição Federal e 67 do Estatuto dos Servidores do RS.
4 – De
25/02/2021 a 28/02/2021, esteve no gozo de licença saúde, conforme autorizado
pelo inciso I do artigo 128 do Estatuto dos Servidores do RS.
5 – De
1º/03/2021 até o dia 29/05/2021, estará gozando de licença prêmio, conforme
artigo 150 do Estatuto dos Servidores do RS.
6 – Por
tais motivos e, principalmente, por restar-lhe exatos 40 dias de afastamento
legal e regular das funções junto ao Estado do Rio Grande do Sul, o vereador
Bobadra ainda não requereu o afastamento das funções perante a Seapen para o
exercício do mandato eletivo.
7 – No
entanto, desde já registra que talvez não seja feito tal pedido de licença,
pois além de ser permitida a cumulação pela Constituição Federal, conforme o
inciso III do artigo 38 e, pela alínea “a” do inciso III do artigo 156 do
Estatuto dos Servidores do RS, tem-se que as escalas regulares de trabalho
inerentes a todos os agentes penitenciários permitem, na prática, a plena
compatibilidade de horários e consequentemente a cumulação do cargo com o
mandato.
8 –
Eventualmente, no futuro, caso o servidor/vereador Alexandre Bobadra constate a
ocorrência de qualquer prejuízo ao serviço público estadual e ao próprio interesse
público ínsito à segurança pública e ao sistema prisional, notadamente advindo
dos compromissos para com o parlamento de Porto Alegre, por certo será
procedido no pedido de licenciamento.
9 – No
que tange aos valores recebidos do erário estadual a título de salários deste
ano, nada de irregular existe, sendo que a remuneração do mês de janeiro foi
elevada por dois motivos. Primeiro, porque além da remuneração normal, recebeu
vantagens de férias e do um terço constitucional. Segundo, porque talvez diante
do ineditismo da situação de um agente penitenciário tornar-se vereador desta
Capital, o Estado do RS procedeu no pagamento dos valores referentes à função
gratificada que antes exercia na Escola do Serviço Penitenciário, valores estes
que foram devidamente descontados na folha de pagamento do mês seguinte.
10 – Logo, com exceção do mês de janeiro, que por equívoco já corrigido do próprio Estado do Rio Grande do Sul, em nenhum outro o servidor Alexandre Bobadra recebeu a referida função gratificada.”
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