Fim da estabilidade e mudança em concursos: reforma administrativa deve ser votada na CCJ da Câmara nesta terça
Texto tenta alterar o plano de carreira de futuros
servidores públicos
Uma das principais reformas do governo de Jair Bolsonaro deve passar
pelo primeiro teste de fogo no Congresso nesta terça-feira (25). A Comissão de
Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados deve votar a
admissibilidade da proposta de emenda Constitucional (PEC) da reforma administrativa. O texto,
enviado pelo governo federal em setembro do ano passado, tenta alterar o plano
de carreira de futuros servidores públicos.
O fim da
estabilidade para parte dos futuros servidores é uma das principais mudanças
previstas pela proposta. O governo tenta manter essa prerrogativa apenas para
cargos típicos de Estado, que existem apenas na administração pública. As
mudanças só valerão para futuros servidores e não atinge os funcionários
públicos atuais.
A CCJ
começou a discutir o texto nesta segunda-feira (24). Logo no início da sessão,
os membros rejeitaram um pedido para a retirada de pauta. A estimativa da
presidente da comissão, deputada Bia Kicis (PSL-DF), é continuar debatendo a
proposta na manhã de terça-feira e colocar em votação à tarde.
Relator da proposta na CCJ, o deputado Darci de Matos (PSD-SC)
apresentou mais uma mudança no seu relatório nesta segunda-feira. Matos sugere
que sejam suprimidos do texto todos os novos princípios da administração
pública previstos pelo governo: “imparcialidade”, “transparência, inovação,
responsabilidade, unidade, coordenação, boa governança pública” e
“subsidiariedade”.
"A inclusão de novos princípios no texto constitucional, embora seja boa a intenção, pode gerar interpretações múltiplas e completamente divergentes, o que consequentemente gerará provocações ao Supremo Tribunal Federal para dispor sobre sua efetiva aplicabilidade em situações, por exemplo, de improbidade administrativa" — afirmou o relator.
Na semana
passada, ao apresentar relatório defendendo a admissibilidade da PEC, Matos já
recomendava a exclusão de dois itens da proposta. Um deles proíbe que
servidores que ocupam cargos típicos de Estado possam exercer qualquer outra
atividade remunerada. O deputado diz que esse trecho é inconstitucional porque
barra o exercício de outra atividade mesmo nos casos onde existe
compatibilidade de horários.
O outro
estabelece que o presidente da República possa extinguir órgãos da
administração pública autárquica e fundacional por meio de decreto. No
entendimento de Matos, essas entidades são vinculadas e não subordinadas aos
ministérios, portanto, a exclusão via decreto presidencial prejudicaria a
separação de poderes.
Desde o
início dos trabalhos, a oposição tenta obstruir o processo, movimento que deve
seguir nesta terça-feira. Redução de direitos e de benefícios estão entre os
principais pontos levantados pelos deputados que criticam o projeto durante a
sessão. A PEC também é alvo de críticas de entidades que representam servidores
públicos.
No debate, nesta segunda-feira, o deputado Ivan Valente (PSOL-SP)
defendeu o concurso público e a estabilidade dos servidores.
"Agora querem cinco formas de regime, inclusive por contratação provisória" — criticou.
Já o
deputado Diego Garcia (Pode-PR) ressaltou itens em que a proposta dá maior
dinamismo, racionalidade e eficiência à atuação do Estado:
"Também visa aproximar o serviço público brasileiro da realidade do país."
Antes de
entrar em vigor, a proposta enfrentará um caminho longo pelo Congresso, onde
poderá sofrer mudanças. Passando pelo crivo do colegiado, a PEC será discutida
em uma comissão especial e no Plenário, onde terá de ser aprovada em dois
turnos antes de seguir para o Senado.
Alguns dos principais pontos da reforma administrativa
Fim do regime
jurídico único
A
proposta extingue o fim do chamado regime jurídico único e cria cinco novos
modelos de contrato:
1) Cargos típicos de Estado
São funções que não existem no setor privado, com estabilidade
similar aos moldes atuais após três anos. Uma lei complementar deve esclarecer
as carreiras que integram esse grupo. Hoje, inclui diplomatas e auditores
fiscais, por exemplo. O ingresso será via concurso público.
2) Cargos com vínculo por prazo indeterminado
O ingresso nesse cargo ocorrerá por meio de concurso público. No
entanto, os postos com prazo indeterminado não terão estabilidade assegurada,
como ocorre nos cargos típicos de Estado. Ou seja, funcionários contratados por
meio desse modelo poderiam ser demitidos.
3) Vínculo de experiência
Após a aprovação em concursos públicos, os candidatos às vagas de
cargos típicos de Estado ou de prazo indeterminado precisam passar por período
de experiência. O prazo mínimo é de dois anos para vínculos típicos e de um
para prazo indeterminado.
4) Vínculos por prazo determinado
Expande a possibilidade de contratação de servidores por período
definido, sem estabilidade. O ingresso não seria por meio de concurso público,
mas por seleção simplificada. Atualmente, esse modelo de seleção é permitido
apenas para casos específicos, como desastres naturais.
5) Cargos de liderança e assessoramento
Esse vínculo ocuparia o espaço de cargos comissionados e funções
gratificadas. Também valeria para postos específicos com atribuições
estratégicas, gerenciais ou técnicas. Não teria direito a estabilidade. A ideia
do governo seria uniformizar o regramento para as vagas e reduzir distorções.
Estabilidade
O texto
prevê o fim da estabilidade para futuros servidores. Essa prerrogativa valerá
apenas para cargos típicos de Estado, segundo a proposta. Cargos típicos de
Estado são aqueles que só existem na administração pública e não encontram
paralelo na iniciativa privada. De acordo com o projeto, uma lei complementar
vai definir quais serão essas carreiras e seus critérios.
Concursos
A
proposta mantém a previsão de realizar concurso para cargos permanentes fora
das carreiras típicas de Estado, mas destaca que haverá uma segunda etapa de
“vínculo de experiência" de, no mínimo, dois anos.
Férias
A PEC
prevê que servidores públicos não poderão ter mais de 30 dias de férias por
ano. Segundo o governo, esse é um dos pontos que corrigem “distorções
históricas” e “contribuem para melhorar a imagem do setor público”. Relator
destacou que eventuais mudanças em relação a algumas categorias deve ser alvo
de análise na Comissão especial.
Aposentadoria
compulsória
A
proposta veda a aposentadoria compulsória como modalidade de punição. Em seu
parecer, o relator afirma que a maioria dos servidores públicos atualmente não
têm essa prerrogativa e os que possuem, como magistrados e membros do
Ministério Público, não sofrem os impactos da reforma proposta pelo governo
federal.
Promoção por
tempo de serviço
O texto
elimina a possibilidade de promoções ou progressões exclusivamente por tempo de
serviço. O texto do governo estipula que isso vale para qualquer servidor ou
empregado da administração pública direta ou de autarquia, fundação, empresa
pública ou sociedade de economia mista.
Atuação do
Estado na atividade econômica
O texto também restringe a participação do Estado na atividade econômica. A proposta destaca que é vedado ao Estado instituir medidas que gerem reservas de mercado que beneficiem agentes econômicos privados, empresas públicas ou sociedades de economia mista, exceto em casos “expressamente previstas nesta Constituição”.