De Rosane de Oliveira/ZH
O que ocorreu em Brasília ontem não
tem precedentes na história da democracia brasileira. É muitíssimo mais grave
do que o que aconteceu nos Estados Unidos na invasão do Capitólio por
simpatizantes do ex-presidente Donald Trump, que se recusava a aceitar o
resultado da eleição.
No Capitólio, mais de 900 pessoas foram presas e estão
enfrentando processo. As forças de segurança agiram rápido e abortaram a
tentativa de Trump de tomar o poder à força, impedindo a sessão que confirmou a
vitória de Joe Biden. Os atos terroristas no Brasil atingiram os três Poderes.
São chocantes as imagens do vandalismo no plenário do Supremo Tribunal Federal,
no Congresso Nacional e no Palácio do Planalto. Vidros quebrados, salas
alagadas, cadeiras quebradas. Não foi uma manifestação espontânea. Teve
articulação, teve planejamento, teve financiadores, teve executores. Quem são e
a serviço de quem estavam é o que os inquéritos deverão apurar agora.
A Polícia do Distrito Federal não foi apenas omissa. Foi
conivente. Não por acaso, o secretário da Segurança Pública, Anderson Torres,
ex-ministro da Justiça de Jair Bolsonaro, estava fora de Brasília. Onde? Em
viagem aos Estados Unidos, mais especificamente na Flórida, local escolhido por
Bolsonaro para se refugiar com a esposa e a filha. O governador Ibaneis Rocha,
que nomeou Anderson Torres, sabendo de quem se tratava, tem sua parcela de
culpa pelo que aconteceu. Como pode o secretário da Segurança que assumiu há
menos de 10 dias tirar férias, sabendo-se que o clima em Brasília era tenso?
Ninguém pode dizer que foi surpreendido pela invasão dos prédios
públicos. Foi anunciada nas redes sociais, com ônibus saindo de diferentes
pontos do país. O governo do DF não viu, e a "inteligência" do
governo federal não detectou o perigo. Porteira aberta aos golpistas.
O que se viu foi mais do que uma tentativa fracassada de golpe
de Estado. Terroristas ultrajaram a bandeira do Brasil, usando-a como adereço
no ataque às instituições. Vilipendiaram o brasão da República, arrancado do
prédio do Supremo Tribunal Federal para colocá-lo sobre uma cadeira de ministro
do lado de fora. Afrontaram as instituições que sustentam a democracia.
Blasfemaram contra o Hino Nacional ao cantá-lo em celebração aos destroços do
Congresso.
Conseguiriam o efeito contrário ao pretendido golpe: a união dos
governadores, que ofereceram ajuda ao governo federal para restabelecer a paz
em Brasília e o repúdio de instituições internacionais e de governos dos
Estados Unidos, Europa e América Latina.