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Por outro lado
terça-feira, 17 de dezembro de 2024
quinta-feira, 28 de novembro de 2024
‘Kids pretos’ que escreveram tuíte ameaçando STF ganharam cargos no governo Bolsonaro
Todos generais, eles estiveram à frente de estatais e ministérios entre 2019 e 2022
Por Igor Carvalho e Ananias Oliveira — Brasil de Fato
No dia 3 de abril de 2018, às vésperas do Supremo
Tribunal Federal (STF) analisar
um pedido de habeas corpus do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que
estava preso na época, o general da reserva Eduardo Villas Bôas, que comandou o
Exército entre 2014 e 2019, publicou dois tuítes pressionando e ameaçando a
corte.
Militares do entorno de Bolsonaro dominam a relação de indiciados pela PF em relatório obre tentativa de golpe no país. (Foto: Marcos Corrêa/ Presidência da República) |
No dia seguinte ao tuíte, o STF não acatou o habeas corpus
pedido pela defesa de Lula e o petista seguiu preso, impedido de disputar a
eleição presidencial de 2018, que terminou com a vitória de Jair Bolsonaro
(PL), aliado do general Villas Bôas.
Kids Pretos e Bolsonaro
Em fevereiro de 2021, a Fundação Getúlio Vargas publicou o
livro “General Villas Bôas: conversa com o comandante”, onde o militar narra
sua vida. Em um trecho, ele admite que o tuíte ameaçando o STF teria passado
pelas mãos de outros cinco generais: Guilherme Cals Theophilo Gaspar de
Oliveira, Augusto César Nardi de Souza, Paulo Humberto Cesar de Oliveira, Mauro
César Lourena Cid e Luiz Eduardo Ramos Baptista Pereira.
Em comum, os generais integraram o Comando de Operações
Especiais (Copesp), que forma os agentes de forças especiais do Exército, os
chamados “Kids Pretos”, que são considerados a elite das Forças Armadas do
país.
Os Kids Pretos ganharam destaque na imprensa no último dia
19 de novembro, quando a Polícia Federal prendeu integrantes do grupo de elite
por planejarem a morte de Lula, o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e
Alexandre de Moraes, ministro do STF.
Além de serem Kids Pretos, o quinteto de generais tem outro
traço em comum. Todos ganharam cargos no governo do ex-presidente Jair
Bolsonaro. Guilherme Cals Theophilo Gaspar de Oliveira foi ministro-chefe da
Casa Civil. Ele é irmão do general Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira,
que foi indiciado no relatório da Polícia Federal por tentativa de golpe.
Paulo Humberto Cesar de Oliveira presidiu o Instituto de
Previdência Complementar dos Correios (Postalis). Bolsonaro quis colocá-lo à
frente do Exército em 2019, mas ele recusou o convite e preferiu seguir no
comando da estatal.
Pai de Mauro Cid, que era ajudante de Bolsonaro no Palácio
do Planalto, o general Mauro César Lourena Cid assumiu a direção da Agência
Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex) em Miami, nos
Estados Unidos.
Augusto César Nardi de Souza se tornou chefe de Assuntos
Estratégicos do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas do Ministério da
Defesa ainda em 2019, primeiro ano do governo Bolsonaro.
Por fim, o general Luiz Eduardo Ramos Baptista Pereira, que
foi chefe de três pastas no governo Bolsonaro: Casa Civil, Secretaria de
Governo e Secretaria-Geral da Presidência da República.
Preso que teria ordenado morte de detento em Canoas é transferido para penitenciária federal
Operação sigilosa das polícias Penal, Civil e Militar transferiu Rafael Telles da Silva, conhecido como Sapo, na manhã desta quinta-feira (28). Ele é rival do grupo criminoso do qual Jackson Peixoto Rodrigues, baleado na Pecan 3, fazia parte
De Vitor Rosa
Rafael Telles da Silva havia sido removido para a Pasc após o ataque e, nesta quinta (28), foi enviado a presídio federal. divulgação / Brigada Militar/Divulgação |
O suspeito de ordenar a morte do
preso Jackson Peixoto Rodrigues dentro da Penitenciária
Estadual de Canoas foi enviado para uma penitenciária federal. Rafael
Telles da Silva, conhecido como Sapo, foi transferido em uma
operação sigilosa das polícias Penal, Civil e Militar na manhã desta
quinta-feira (28). A RBS TV apurou que o provável destino
é Brasília.
Sapo é apontado como um dos chefes de uma organização
criminosa baseada em Porto Alegre, rival do grupo do qual Jackson fazia
parte. Identificado pela Polícia Civil como envolvido no crime, ele havia
sido removido para a Penitenciária
de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc) após o ataque.
Nas primeiras horas do dia, o homem foi levado em um
comboio da Pasc até o aeroporto Salgado Filho. De lá, embarcou em uma
aeronave com destino ao sistema penitenciário federal.
A Secretaria dos Sistemas Penal e Socioeducativo se
manifestou sobre a tranferência por meio de nota: "A Polícia Penal informa
que no dia 7 de outubro foi deferida a inclusão de Rafael Teles da Silva no
Sistema Penitenciário Federal (SPF). No último dia 21, a Secretaria Nacional de
Políticas Penais confirmou e agendou a remoção para esta quinta-feira (28/11),
o que ocorreu dentro do previsto. O apenado já deixou o Rio Grande do Sul.
A decisão judicial para transferir Sapo foi tomada cerca de
10 dias antes do assassinato de Jackson, mas só foi efetivada nesta quinta. A
determinação levou em conta a posição do homem no grupo criminoso.
O outro preso, que seria o executor do crime,
é Luís Felipe de Jesus Brum, 21 anos. Ele é integrante da mesma
organização criminosa que Sapo e foi preso, em junho deste ano, por suspeita de envolvimento no assalto ao aeroporto de
Caxias do Sul. Luís Felipe permanece no sistema penitenciário do RS.
Preso escreveu carta antes de morrer
Em carta
escrita um dia antes de ser morto, Jackson pediu transferência do
local temendo "alguma falha na segurança". Ele se dirige,
em terceira pessoa, ao diretor da penitenciária.
"Solicita que seja dada uma atenção de extrema urgência,
porque, como é sabido de todos, o requerente é inimigo histórico desse grupo.
E, pelo fato de permanecer tão próximo e teme em haver alguma falha na
segurança, pede que seja dada esta atenção", disse.
O detento apontou ainda que era separado apenas por uma
portinhola de outros apenados, inimigos da organização criminosa da qual
Jackson fazia parte. Foi justamente através
da portinhola que foram efetuados os disparos que atingiram o
detento.
Jackson, morto no sábado (23), tinha ligação com 29 homicídios, incluindo decaptações e esquartejamentos. Polícia do Paraguai / Divulgação |
Arma teria ingressado por drone
Conforme a Secretaria de Sistemas Penal e Socioeducativo, a
suspeita é de que a arma que matou Jackson tenha ingressado no presídio por
meio de um drone. Na madrugada anterior ao episódio, houve registro de sobrevoo
na região.
A arma utilizada no ataque dentro da cadeia, uma pistola
9 milímetros, foi apreendida. A Polícia Civil abriu um inquérito para
apurar as circunstâncias do crime.
O governador em exercício do Rio Grande do Sul, Gabriel Souza
(MDB), anunciou o afastamento
de um diretor e quatro servidores do Complexo Prisional de Canoas após
o ocorrido.
O preso morto dentro da cadeia foi identificado como Jackson
Peixoto Rodrigues, 41 anos. Nego Jackson, como era
conhecido, era apontado como chefe de uma organização criminosa do RS.
Conforme dados do Comando de Policiamento Metropolitano,
Jackson tem ligação com 29 homicídios. São assassinatos, com decapitações e esquartejamentos,
em que ele teria participação como mandante ou executor. A lista de
antecedentes criminais do homem ainda inclui tráfico de drogas, lavagem de
dinheiro e associação criminosa.
Em 2017, "Nego Jackson" foi preso pela polícia do
Paraguai. Ele foi capturado na cidade de Pedro Juan Caballero com outros três
comparsas. Na ocasião, o chefe de polícia do RS declarou que o criminoso era
o procurado número 1 do Estado.
terça-feira, 26 de novembro de 2024
O que se sabe até agora sobre assassinato de líder de facção a tiros dentro da Pecan
De Leticia Mendes
Jackson Peixoto Rodrigues, 41 anos, foi executado com sete
disparos no sábado. Dois apenados que estavam na mesma galeria e integram grupo
rival tiveram novas prisões preventivas decretadas. Episódio desencadeou crise
no sistema penitenciário
Em carta escrita à mão, Jackson Peixoto Rodrigues, 41 anos, o Nego Jackson, líder de uma facção criminosa, alertou na sexta-feira (22) que poderia ser vítima de “uma tragédia como nunca ocorrera no sistema penitenciário gaúcho”. No texto, diz que drones costumam se aproximar com facilidade das janelas das celas da Penitenciária Estadual de Canoas (Pecan) 3 e afirma que está sendo mantido numa galeria “há poucos metros de seus inimigos”.
Esse documento, segundo o próprio governo do Estado, foi
entregue a um servidor da casa prisional e repassado ao advogado do faccionado.
A defesa chegou a pedir na Justiça que ele fosse retirado da casa prisional e
retornasse à Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc).
No entanto, no dia seguinte, no fim da tarde, o preso foi executado com sete
disparos. Os tiros teriam sido efetuados por uma portinhola. A suspeita
é de que a arma tenha ingressado na unidade transportada por um drone.
O episódio desencadeou crise no sistema penitenciário
gaúcho. Na segunda-feira (25), o governo do Estado anunciou, em entrevista
coletiva, as medidas adotada até aqui. Entre
elas, está o afastamento de cinco servidores da penitenciária. O caso
passou ser apurado num procedimento administrativo e investigado pelo
Departamento de Homicídios em razão do crime. Mas ainda existem questionamentos
que precisam ser esclarecidos.
Confira o que se sabe até o momento e o que precisa ser
elucidado:
1 – Quem são os autores?
São apontados como suspeitos do crime Rafael
Telles da Silva, o Sapo, uma das lideranças de uma facção rival à de Nego
Jackson, e Luis Felipe de Jesus Brum, também integrante do mesmo
grupo e preso pelo assalto milionário ao aeroporto de Caxias do Sul, em
junho.
Os dois foram detidos em flagrante após a morte de Nego
Jackson e tiveram prisão preventiva decretada. Segundo a Polícia Civil, ao
serem ouvidos, optaram por se calar.
Os dois foram removidos da Pecan na madrugada de sábado para
domingo, segundo a Polícia Civil, “assim que foram realizadas as oitivas com a
Polícia Civil e demais procedimentos de praxe”. Por questões de segurança, não
é informado o local de destino dos presos.
2 – Qual o papel de cada um no crime?
A polícia ainda tenta esclarecer a dinâmica do crime. Não
foi apurado até o momento qual dos dois teria atirado contra o rival. A
polícia diz que aguarda perícias e outras diligências para elucidar o papel de
cada um.
3 – Há mais pessoas envolvidas?
A investigação ainda apura se houve envolvimento de outras
pessoas no crime. Isso não é descartado.
4 – Como a arma chegou à prisão?
A arma usada no crime é uma pistola de calibre 9 milímetros,
que foi apreendida na penitenciária. Uma das hipóteses é de que ela
tenha chegado até o local por meio de drone. Isso deve ser esclarecido
pelas investigações.
5 – Por que a arma não foi encontrada na revista das
celas?
Segundo o governo, são realizadas revistas regulares nas
celas, mas, ainda assim, a arma não foi encontrada. Não foi esclarecido
até o momento por qual motivo a pistola não foi encontrada nem quanto
tempo ela ficou dentro da penitenciária. Na madrugada anterior ao crime, um
avistamento de drone teria ocorrido por volta das 3h. Chegaram a ser
apreendidos rádio e drogas.
6 – Quais são as facções envolvidas?
Estão envolvidas no crime duas facções. Nego Jackson chegou
a ser considerado o foragido mais procurado do RS, em 2017, período no qual o
Estado enfrentava disputas sangrentas nas ruas, especialmente na Capital. O
faccionado foi capturado no Paraguai, pela polícia da cidade de Pedro Juan
Caballero, e posteriormente transferido de volta para Brasil. Passou
pelo sistema penitenciário federal — sendo enviado a Rondônia — mas retornou ao
Estado.
Nego Jackson era rival da facção do bairro Bom
Jesus, os Bala na Cara, integrando uma coalização de grupos criminosos
denominada de Anti-Bala. Apontado como chefe do tráfico na Vila Jardim,
recentemente, segundo a polícia, foi um dos principais articuladores da
criação de uma nova facção, chamada de Família do Sul.
Do outro lado, Rafael Telles da Silva, o Sapo, é apontado
como um dos articuladores da facção Bala na Cara.
7 – Por que os líderes de facções rivais estavam na mesma
galeria?
Segundo o governo do Estado, a decisão de enviar presos
líderes de facções para a Pecan se deu porque os bloqueadores
de celulares não estavam funcionando na Pasc. Em razão disso,
apenados estariam determinando novos crimes de dentro da penitenciária. A Pecan
é a única prisão no RS que conta com bloqueadores.
Conforme a Secretaria de Sistemas Penal e Socioeducativo, os
presos estavam em celas separadas, mas na mesma galeria, na área de triagem.
Esse espaço, segundo a explicação do governo, é usado para o isolamento de
lideranças.
As celas que eles ocupavam são para dois presos e a
movimentação é realizada de forma separada — com controle superior
pelos policiais penais. Ainda assim, o governo não esclareceu até o momento
porque os dois presos, mesmo inimigos, estavam tão próximos.
8 – Quais medidas foram adotadas?
O governo anunciou o afastamento de cinco servidores da
Pecan 3 (dois servidores que estavam no turno, o chefe de segurança do complexo
prisional, o responsável pela segurança da galeria e o diretor responsável pela
Pecan 2, 3 e 4). Ainda foram determinadas três revistas diárias dentro da
galeria onde houve o crime, na penitenciária.
Além disso, foram anunciados o reforço de 520
policias militares nas ruas e ações de saturação nas áreas
conflagradas pelas facções. O intuito é tentar evitar o reflexo desse
conflito nas ruas.
Outra medida é o retorno das lideranças de facções para a
Pasc, após a inauguração do módulo de isolamento, com 76 celas
individuais e bloqueio de celulares, o que deve se iniciar em dezembro.
9 – Quantos servidores estavam trabalhando naquela data
na penitenciária?
Os servidores penitenciários reclamam de não haver policiais
penais suficientes para dar conta do serviço. Segundo o governador em
exercício, Gabriel Souza, havia 54 servidores na penitenciária no
momento do crime, para cerca de 2 mil presos.
10 – Por que os cinco servidores foram afastados?
Segundo o governo do Estado, a decisão foi tomada
como forma de manter a liberdade e lisura das investigações (administrativa
e criminal). Um dos servidores afastados, de acordo com o governador em
exercício, foi identificado como a pessoa que recebeu a carta escrita por Nego
Jackson.
"Isso não é por qualquer tipo de confirmação ou crença do
governo de culpabilidade de qualquer um dos servidores, mas no sentido de
buscar apuração isenta, rigorosa, e também que, na medida do possível, seja
célere, tanto do ponto de vista administrativo, como também pela própria
investigação policial" — disse Gabriel Souza.
Sistema penitenciário é um caldeirão e exige atenção redobrada
Não é de hoje que juízes, promotores, defensores e policiais penais alertam para o clima nos presídios
Tendas foram montadas no lado de fora da Pecan,
onde roteadores wi-fi clandestinos são instalados.
Ronaldo Bernardi / Agencia RBS
A execução
de um líder de facção na Penitenciária de Canoas, um presídio
construído para ser modelo de ressocialização, é o ápice de um processo
que há muito preocupa juízes, promotores, defensores públicos e
policiais penais.
A saída da Brigada Militar da segurança externa dos
presídios, demanda de muitos anos, não veio acompanhada da substituição pelo
mesmo número de policiais penais, como queriam os funcionários da Susepe. Mas
esse é apenas um dos problemas na gestão do sistema
carcerário.
Se é verdade que o governo de Eduardo Leite cumpriu o que
vários dos seus antecessores prometeram e pôs abaixo o velho Presídio Central,
substituído por uma cadeia pública destinada a presos transitórios, também é
verdade que os perigosos líderes de facções foram espalhados por outras
penitenciárias.
A Pecan não deveria estar recebendo líderes de facções.
Recebeu porque é a única que tem bloqueadores de celular, mas os
telefones funcionam graças a roteadores e modens instalados nas proximidades.
Tem bloqueadores de celular, mas está longe de ser um presídio de segurança
máxima, como se exige para presos de alta periculosidade. Inexplicavelmente,
a Penitenciária
de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc) tem pronto um módulo que
poderia ser usado para presos de regime disciplinar diferenciado e
ainda não foi ocupado.
Operadores do Direito e policiais penais alertam que há
presos morrendo de calor na Penitenciária Estadual de Charqueadas (PEC 1 e 2),
e a direção da Susepe ignora os alertas de que essas condições aumentam
o risco de uma rebelião. Denunciam falta de medicamentos e são
ignorados.
É verdade que a sociedade tem uma ideia
equivocada sobre presídios, e qualquer melhoria nas instalações é criticada
por uma parcela da população que defende o tratamento desumano aos presos, na
ideia de que não basta a pena de privação da liberdade, o preso tem de ser
humilhado. O senso comum esquece que um dia esse preso será libertado
e, se não houver ressocialização, cometerá outros crimes contra essa
mesma sociedade.
A Pecan era um modelo de ressocialização. Muitas empresas
estavam lá, oferecendo trabalho aos apenados. Não havia facções. Hoje, dizem os
funcionários da Susepe, está dominada pelo crime organizado. Três
módulos são ocupados por presos de uma mesma facção. Isso afastou as empresas
que ofereciam trabalho.
A reação do governo foi afastar
a direção da Pecan, mas será que isso resolve? Nego Jackson, o preso
assassinado, escreveu
uma carta de próprio punho alertando sobre um plano para matá-lo dentro
da Pecan. Seus advogados pediram e conseguiram um habeas corpus para tirá-lo de
lá, mas o crime ocorreu antes da transferência.
Você pode achar, como muita gente acha, que enquanto os
bandidos estiverem se matando entre eles está tudo bem. Não, não está. O crime
organizado transcende a área geográfica onde os líderes se instalam e
transformam os moradores em reféns. Além de exigir que as forças de
segurança sejam deslocadas para essas áreas, desguarnecendo outras, a guerra de
facções espalha a violência na forma de balas perdidas, assaltos, roubo de
carros.
quinta-feira, 21 de novembro de 2024
Golpistas de 2022 deixaram rastro por todos os lados, de Rosane de Oliveira
Sorte do Brasil que os estrategistas eram trapalhões, porque isso evitou uma ditadura mais sangrenta que a de 1964
O amadorismo dos civis e militares envolvidos
no planejamento do golpe fracassado de 2022 livrou o Brasil de uma
ditadura que começaria mais sangrenta do que a de 1964. Mais
sangrenta porque de largada previa o assassinato do presidente Lula, do vice
Geraldo Alckmin e do ministro Alexandre de Moraes.
Os trapalhões não só bolaram um plano cheio de furos,
como deixaram rastros por todos os lados. Acabaram facilitando o
trabalho da Polícia Federal na apuração do planejamento do golpe, que
teve desde reunião na casa do general Braga Netto até impressão do plano
criminoso numa máquina do Palácio do Planalto.
O número
inédito de integrantes das Forças Armadas indiciados pela Polícia
Federal só existe porque o golpe fracassou. Se tivesse sido consumado, seria
como em 1964, sem militares presos. Por isso não cola a justificativa de
que planejar não é crime e que não se pode punir os idealizadores. O
Código Penal prevê, sim, a punição para quem se organiza em grupos na tentativa
de abolir de forma violenta o Estado democrático de direito.
Os crimes
atribuídos a Bolsonaro somam cerca de 40 anos de prisão, na hipótese de
ser denunciado e condenado em todos, sem atenuantes. Como esse é um processo
relativamente demorado, a maior punição será a política. Que
político ficará atrelado a um ex-presidente que hoje já está inelegível e que
tende a desmoronar nos próximos meses? É óbvio que a direita não ficará
esperando por Bolsonaro e tratará de se organizar para ter um
candidato viável em 2026.
Os rastros deixados em celulares, que permitiram
identificar até a campana feita pra tentar sequestrar Alexandre de Moraes, só
podem ter duas explicações: falta de inteligência ou certeza de
impunidade. Se os generais próximos de Bolsonaro foram capazes de uma
patacoada como essa, imagine-se o que fariam se o Brasil estivesse em guerra
contra um inimigo externo. Sorte do Brasil que as Forças Armadas são
maiores do que o grupelho golpista e que ainda há generais como Freire
Gomes e brigadeiros como Baptista Júnior, que frearam a aventura.
De Bolsonaro, que foi um mau militar e incitou a baderna
nos quartéis quando era capitão, não surpreende a trapalhada. De
generais como Augusto Heleno e Braga Netto era de se imaginar que
tinham alguma noção de estratégia militar.
ALIÁS
Duas consequências imediatas do indiciamento
de Jair Bolsonaro e de outras 36 pessoas envolvidas na selvageria do 8 de
janeiro: o projeto de anistia perde força no Congresso e o ex-presidente pode
dar adeus ao sonho de voar para os Estados Unidos a fim de assistir à posse de
Donald Trump. Ele teve o passaporte apreendido e precisaria de uma licença
especial do ministro Alexandre de Moraes para sair do país.
Em áudio, general afirmou que Bolsonaro deu aval para golpe até 31/12
General da
reserva Mário Fernandes relatou conversa a Mauro Cid, auxiliar de Bolsonaro
Por André
Richter
Da Agência Brasil
Foto: Tânia Rego/Agência Brasil
O general da
reserva Mário Fernandes, um dos presos na Operação Contragolpe, da Polícia
Federal, afirmou que o ex-presidente Jair Bolsonaro deu aval para um plano
golpista até 31 de dezembro de 2022.
A conversa
consta no relatório de inteligência da operação, deflagrada nesta terça-feira
(19) para prender cinco militares que pretendiam impedir a posse do presidente
Luiz Inácio Lula da Silva e do vice, Geraldo Alckmin, eleitos em outubro de
2022.
No áudio
enviado a Mauro Cid, Fernandes disse ao ex-ajudante de ordens de Bolsonaro que
o ex-presidente teria dito a ele que a “ação” poderia ocorrer até o último dia
do mandato.
“Cid, boa
noite. Meu amigo, antes de mais nada me desculpa estar te incomodando tanto no
dia de hoje. Mas, porra, a gente não pode perder oportunidade. São duas coisas.
A primeira, durante a conversa que eu tive com o presidente, ele citou que o
dia 12, pela diplomação do vagabundo, não seria uma restrição, que isso pode,
que qualquer ação nossa pode acontecer até 31 de dezembro e tudo. Mas, porra,
aí na hora eu disse, pô presidente, mas o quanto antes, a gente já perdeu
tantas oportunidades”, disse Fernandes.
Durante o
governo Bolsonaro, o general ocupou o cargo de secretário-executivo da Secretaria-Geral da
Presidência da República e foi responsável, segundo a PF, pela
elaboração do arquivo de word intitulado “Punhal Verde e Amarelo”, com
planejamento “voltado ao sequestro ou homicídio” do ministro
Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e de Lula e Alckmin.
Segundo a PF,
o documento foi impresso no Palácio do Planalto e levado para o
Palácio da Alvorada, residência oficial de Jair Bolsonaro. O ex-presidente não
é citado no caso como investigado.
“A
investigação, mediante diligências probatórias, identificou que o documento
contendo o planejamento operacional denominado Punhal Verde Amarelo foi
impresso pelo investigado Mário Fernandes no Palácio do Planalto, no dia
09/11/2022 e, posteriormente, levado até o Palácio do Alvorada, local de
residência do presidente da República, Jair Bolsonaro”, completou a PF.
Outro lado
O
ex-presidente Jair Bolsonaro não se pronunciou sobre a operação da Polícia
Federal. Pelas redes sociais, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) declarou que
“pensar em matar alguém não é crime”.
“Por mais que seja repugnante pensar em matar alguém, isso não é crime. E para haver uma tentativa é preciso que sua execução seja interrompida por alguma situação alheia à vontade dos agentes. O que não parece ter ocorrido. Sou autor do projeto de lei 2109/2023, que criminaliza ato preparatório de crime que implique lesão ou morte de 3 ou mais pessoas, pois hoje isso simplesmente não é crime. Decisões judiciais sem amparo legal são repugnantes e antidemocráticas”, declarou.
Erika Hilton e PSOL pedem prisão preventiva de Bolsonaro e Braga Netto ao STF
O partido alega graves suspeitas envolvendo os dois em um suposto plano de assassinato de autoridades e tentativa de golpe de Estado
©Foto: Facebook
A deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP) anunciou na
última terça-feira (19) que o PSOL protocolou um pedido no Supremo Tribunal
Federal (STF) pela prisão preventiva do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e do
ex-ministro da Defesa Walter Braga Netto. O partido alega graves suspeitas
envolvendo os dois em um suposto plano de assassinato de autoridades e
tentativa de golpe de Estado.
“Não há argumentos plausíveis para que eles estejam em
liberdade. Segundo a PF , eles podem estar envolvidos em um plano de
assassinato de autoridades públicas e de golpe de Estado”, declarou Erika
Hilton em suas redes sociais.
A Polícia Federal revelou detalhes do esquema, que teria
sido discutido em 12 de novembro de 2022 na casa de Braga Netto. Conforme
depoimento do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, em
delação premiada, o plano incluía o assassinato do presidente Lula (PT), do
vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e do ministro do STF Alexandre de Moraes.
O objetivo seria impedir a posse da chapa eleita e desestabilizar o STF.
Erika Hilton destacou que a saída de Bolsonaro e Braga
Netto do poder não elimina os riscos que eles representariam. “Não dá pra
fingir normalidade. São dois assassinos em potencial nas ruas”, afirmou a
deputada.
O Correio tentou contato com os representantes de
Bolsonaro e Braga Netto, mas não obteve resposta até o fechamento desta edição.
O espaço segue aberto para manifestações.
terça-feira, 19 de novembro de 2024
Operação da PF prende ‘Kids Pretos’ por plano para matar Lula, Moraes e Alckmin
Grupo é suspeito por participar de tentativa
de golpe de Estado
A Polícia Federal faz uma operação de busca e apreensão
na manhã desta terça-feira (19) sobre o grupo de militares conhecido como “Kids
Pretos”. Eles são investigados pela participação na tentativa de golpe
de Estado e por um plano para matar Lula, Geraldo Alckmin e o ministro
Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), conforme
a coluna revelou no dia 12 de novembro. Esse plano faz parte dos
preparativos para a tentativa de golpe de estado após a derrota de Jair
Bolsonaro nas eleições de 2022.
A PF cumpre cinco mandados de prisão preventiva, três de
busca e apreensão, além de outras 15 medidas cautelares na ação, batizada de
Operação Contragolpe. Os alvos são endereços no Rio de Janeiro, Goiás, Amazonas
e Distrito Federal.
Os militares alvos de prisão são Hélio Ferreira Lima,
Mario Fernandes, Rafael Martins de Oliveira e Rodrigo Bezerra de Azevedo.
Também é alvo Wladimir Matos Soares, policial federal.
A coluna apurou com fontes próximas à investigação que um
dos alvos é o general Mário Fernandes, peça-central da atuação dos Kids Pretos
na investigação. Antes de comandar a Secretaria-Geral da Presidência, ele
esteve à frente do Comando de Operações Especiais, em Goiânia. O coronel Mauro
Cid, ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, afirmou aos investigadores que
Fernandes integrava o grupo de militares mais radicais envolvidos no
planejamento do golpe.
“Punhal Verde e Amarelo”
A PF identificou um planejamento operacional detalhado,
batizado como “Punhal Verde e Amarelo” para que militares, a
maioria deles kids pretos, executassem ações golpistas, entre elas a prisão e
execução do ministro Alexandre de Moraes, como a coluna revelou na semana
passada. O plano também incluía a execução do presidente Lula e do vice-presidente
Geraldo Alckmin, segundo a PF.
O plano detalhava os recursos bélicos e de pessoal
necessários para executar as ações golpistas. Os Kids Pretos montariam ainda um
“Gabinete Institucional de Gestão de Crise” para lidar com as
repercussões institucionais dos crimes.
Alvos organizaram reunião para planejamento
do golpe
A PF apurou que alguns dos alvos da operação de hoje
participaram da organização de uma reunião entre Kids Pretos para planejar as
ações golpistas, em 12 de novembro de 2022. As informações constam no relatório
da PF da Operação Tempus Veritatis, deflagrada em fevereiro deste ano.
Segundo os investigadores, o tenente-coronel Helio
Ferreira Lima e o major Rafael Martins de Oliveira trocaram mensagens com Mauro
Cid para tratar da reunião, realizada na SQS 112, Bloco B, em
Brasília. Os detalhes do plano foram encontrados em mensagens recuperadas no
celular do tenente-coronel Mauro Cid, que fez colaboração premiada com a PF.
Cid foi chamada para depor nesta terça-feira (19).
Nos últimos meses, investigadores arrecadaram novos dados
em computadores e celulares apreendidos durante as ações anteriores e as novas
informações permitiram detalhar como se deu a preparação do golpe. Além das
minutas já conhecidas, militares fizeram o levantamento dos nomes, das rotinas
e até do armamento usado pelos responsáveis pela segurança do presidente Luiz
Inácio Lula da Silva e do ministro Alexandre de Moraes. A coluna apurou que
esse levantamento foi feito pelo grupo de Kids Pretos.
“Kid preto” é o apelido dado a militares
que se formam no curso de Operações Especiais do Exército Brasileiro. Uma
das unidades militares onde eles atuam é no Comando de Operações Especiais, em
Goiânia. Segundo as investigações, a trama golpista tentou fazer com que
militares dessa unidade tomassem parte no golpe de Estado. Entre as atribuições
deles estaria prender o ministro Alexandre de Moraes e outras autoridades, sob
ordem de Jair Bolsonaro.
General citado pela PF comandou Kids Pretos
Conversas obtidas pela PF mostram que outros envolvidos
contavam com a interferência dele para garantir a adesão dos Kids Pretos ao
plano golpista, influenciando diretamente o comandante da unidade na época,
general Carlos Alberto Rodrigues Pimentel.
Um dos indícios encontrados na investigação sobre o papel
central do general Mário no plano de emboscada contra Moraes é um áudio. A
gravação encaminhada pelo coronel Hélcio Franco ao ex-militar Ailton Barros —
também envolvido na trama golpista.
“Quem tem a tropa na mão é o comandante de
Operações Especiais. Por exemplo: o comandante deu a ordem, né? Tem que ver
esse fenômeno aí do que é a tropa na mão, né? De qualquer forma, eu acho melhor
coordenar esse assunto com o Mário, tá? Eu já falei pro Borges que eu não tenho
contato com o Mário, e acho que o Borges deve encaminhar esse assunto pro
Mário, que é a minha sugestão”.
sexta-feira, 15 de novembro de 2024
CCD: "Renato não fica no Grêmio para 2025, e direção já busca novo treinador"
De acordo com informações do colunista de Zero Hora e comentarista da Rádio Gaúcha, o clube já abriu negociação com um técnico argentino
Lucas Uebel / Grêmio/Divulgação |
A quarta passagem de Renato como treinador do Grêmio está
com os dias contados, segundo informações do colunista de Zero Hora e
comentarista da Rádio Gaúcha Cesar Cidade Dias. O técnico não ficará no
Tricolor para 2025, informou o comunicador no Sala de Redação desta
sexta-feira (15).
Gremista identificado, CCD ainda citou, no Sala, que o clube já abriu negociação
com um treinador argentino. No entanto, o nome deste profissional ainda é
desconhecido.
"Eu recebi ontem (quinta-feira, 14), no final do
dia, a informação de que o Grêmio procura treinador no mercado e já abriu
negócios com um técnico argentino. Confesso que eu não consegui, não cheguei
nem perto do nome. Mas isso está sendo falado. Fui atrás, liguei para algumas
pessoas de mercado e realmente já é meio que definido internamente que o Renato
não fica para 2025 e que o Grêmio vai ser um clube com outro pensamento de
trabalho" — disse CCD.
Também colunista de Zero Hora, Marco Aurélio de
Souza indicou que o nome em sigilo pode ser o de Hernan Crespo. O
argentino, ex-treinador do São Paulo, está livre no mercado após ter pedido
demissão do Al-Ain, dos Emirados Árabes Unidos.
Bolsonarismo rima com terrorismo
Nem todo bolsonarista é terrorista, mas os únicos
terroristas que existem no Brasil são bolsonaristas
“Maluco”
Foi assim que Jair Bolsonaro se referiu a Francisco Wanderley Luiz, o homem que detonou uma carga de fogos de artifícios em um carro, para logo em seguida se matar explodindo uma bomba sobre a própria cabeça, em frente ao Supremo Tribunal Federal.
Essa foi a primeira manifestação de Jair sobre o ataque, em entrevista ao colunista Igor Gadelha.
Algum tempo depois, comentou o caso com mais detalhes. O dublê de ex-presidente e articulista político da Folha de S. Paulo disse o seguinte, em trecho da postagem nas redes sociais: “Apesar de configurar um fato isolado, e ao que tudo indica causado por perturbações na saúde mental da pessoa que, infelizmente, acabou falecendo, é um acontecimento que nos deve levar à reflexão”.
Mais uma vez, Bolsonaro quis reforçar a ideia de que o suicida tinha graves problemas psiquiátricos e nenhuma motivação política. Usa a expressão “fato isolado” para tentar desvincular Francisco de seu grupo partidário, apesar de o homem ter sido candidato a vereador pelo PL.
Mesmo que o autor do ataque tivesse algum problema mental, não é difícil concluir o que o levou a escolher esse tipo de ato para manifestar seu extremismo político. Francisco Wanderley Luiz teve a cabeça feita por um tipo específico de fundamentalismo: o bolsonarismo.
Defendeu estado de sítio, participou de acampamento golpista, comparou a Polícia Federal à Gestapo, replicou as fake news de Damares Alves sobre Marajó, ameaçou os “comunistas” FHC, Sarney e Alckmin e jurou matar Alexandre de Moraes.
Ou seja: Francisco Wanderley Luiz era um bolsonarista que seguia o ideário do seu líder.
Afinal, não foi Bolsonaro que fazia plateias repetirem que a luta pela liberdade é mais importante que a vida? Pois bem: para defender sua definição canhestra de liberdade, Francisco acabou com a vida.
Em outro trecho de sua postagem, Jair escreveu o seguinte:
“Já passou da hora de o Brasil voltar a cultivar um ambiente adequado para que as diferentes ideias possam se confrontar pacificamente, e que a força dos argumentos valha mais que o argumento da força. A defesa da democracia e da liberdade não será consequente enquanto não se restaurar no nosso país a possibilidade de diálogo entre todas as forças da nação”.
Nem parece que esse belo chamado à pacificação foi feito pelo mesmo homem que do alto de um palanque gritou, simulando ter uma arma: “Vamos fuzilar a petralhada!”
Trata-se do mesmo pacifista cujos seguidores quase concluíram um atentado a bomba no aeroporto de Brasília e perpetraram o 8/1.
Não engana ninguém. O que a versão Gandhi de Bolsonaro chama de “restaurar o diálogo” é na verdade anistia para os golpistas.
Pouco tempo depois da postagem, Bolsonaro teve a resposta que merecia. Em uma solenidade, o ministro Alexandre de Moraes referiu-se ao ataque dizendo que aquele não foi um “ato isolado”. E que “crime anistiado é crime impune”.
Não se pode generalizar, nem todo bolsonarista é terrorista. Mas, sem dúvida, os únicos terroristas que existem no Brasil são bolsonaristas.
Essa é uma característica do próprio Jair, que no Exército planejou explodir quartéis.
Com todos esses extremistas, seja o “Mito” ou seus seguidores, as instituições devem agir de forma rigorosa para, através das ações, transmitirem o seguinte recado:
Aceitem a democracia.
De Chico
Alves
Jornalista, por duas vezes ganhou o Prêmio Embratel de
Jornalismo e foi menção honrosa no Prêmio Vladimir Herzog. Foi
editor-assistente na revista ISTOÉ e editor-chefe do jornal O DIA. É co-autor
do livro 'Paraíso Armado', sobre a crise na Segurança Pública no Rio, em
parceria com Aziz Filho. Atualmente é editor-chefe do site ICL Notícias.
terça-feira, 12 de novembro de 2024
Há dois anos o governador só nomeou apenas 27% dos classificados no concurso para a Polícia Penal
Quase dois anos após a homologação do concurso para a Polícia Penal no RS, e dezembro de 2022, mais de 1.700 aprovados ainda aguardam convocação para o cargo de agente penitenciário.
Desde então, o governo estadual nomeou apenas 27% dos classificados, ou seja, 648 pessoas, deixando uma parcela significativa sem perspectivas de entrada no serviço público.
terça-feira, 29 de outubro de 2024
‘Precisamos reinaugurar o diálogo e o que estamos fazendo é uma guerra. E guerra, ganha quem é mais idiota’
Ambientalista Francisco Milanez avalia os impactos sociais da crise ambiental pelas perspectivas da saúde e da educação
Por
Luciano Velleda
Milanez diz que as pessoas estão vivendo em nome das urgências e não estão pensando no que é importante, como o destino da vida. Foto: Guilherme Santos/Sul21 |
Atualmente fazendo pós-doutorado em que pesquisa a Teoria da Complexidade é aplicada na saúde, Milanez tem feito a leitura da sociedade também pela ótica da educação, na qual tem formação com mestrado e doutorado. Ao avaliar o atual momento e a inserção da pauta ambiental na campanha eleitoral, diz que observa o cenário de duas formas. Inicialmente, argumenta que o mundo está vivendo um processo fascista e destaca o quanto os processos fascistas “surfam” na desgraça. “É interessante como eles destroem as condições de vida do povo e depois oferecem promessas óbvias”, pondera.
Para ele, as pessoas estão vivendo em nome das urgências e não estão pensando no que é importante. Nesse contexto, a melhor forma de “distrair” as pessoas é falar das urgências, como é o caso das consequências da enchente.
“A urgência talvez seja reconstruir a economia, reconstruir a sociedade e as casas, e a gente vai reconstruir igualzinho como estava antes para derrubar de novo”, critica. “Todo mundo que vive de urgências, mesmo que sejam artificiais, mas com a sensação de urgência de insegurança ou de faltar trabalho, geralmente não se dedica a pensar as coisas importantes, e a coisa importante é o destino do planeta, o destino da nossa vida. Só que ele não tem espaço diante das coisas urgentes. Então, ocupar as pessoas com desgraça é a melhor coisa para manipulá-las”, explica.
Em outro sentido e num caminho complementar, Milanez destaca o papel da educação na transformação social e elogia o trabalho de inclusão de alunos nas série iniciais no passado recente de Porto Alegre e do País. No plano federal, elogia a inclusão de milhares de jovens no ensino superior por meio do financiamento estudantil, do programa de cotas e outras ações afirmativas. “É a maior obra prima do futuro do Brasil”, acredita.
Apesar de apontar esses avanços, Milanez lamenta que o País ainda não tenha realmente transformado sua educação. Ao menos não como ele defende. Com a experiência de quem há mais de 30 anos trabalha com capacitação de professores, avalia que o avanço do ensino pressupõe agir junto aos professores, pois, segundo ele, não adianta ter o “mais lindo” propósito de educação se os professores estão enfraquecidos e descapacitados. Além da educação das crianças, ele enfatiza a necessidade de educar também os adultos, pois não há mais tempo para esperar as crianças crescerem para transformar o mundo. “Ninguém ensina ninguém a pensar. O Paulo Freire deu a receita. A gente faz as perguntas e as pessoas aprendem a pensar, porque se aprende a pensar, não se pode é ensinar a pensar”, afirma.
O especialista em educação defende a criação de um ambiente favorável para que as pessoas pensem, algo que, ele avalia, a escola ainda não consegue fazer do modo idealizado por Paulo Freire. A mesma questão se coloca com os adultos, sendo que estes já não estão mais na escola. “Tínhamos que fazer uma educação popular de adultos em massa. Não para fazer pensar como nós. Não é fazer catequese, é fazer perguntas para levar a reflexões. Se quiser ser de direita, tudo bem, só que seja com alguma razão. Hoje as pessoas são de direita e, às vezes, de esquerda, e não sabem o porquê. Quando não se sabe o porquê, a pessoa é uma besta sempre manipulada”, define, sem medir as palavras.
Milanez ainda acrescenta o mundo das redes sociais e a superficialidade da informação à sua análise. Por acreditar que é esse caldo cultural que leva uma sociedade a eleger governos autoritários e ditatoriais, ele defende a necessidade de construir cidadãos com pensamentos críticos e diferentes, porque tal diversidade é “a riqueza do ser humano”.
sexta-feira, 25 de outubro de 2024
O pobre de direita nos Estados Unidos, Brasil e no mundo
Se não há direção, se
nunca se identifica os reais causadores da pobreza
Jamil Chade fez uma reportagem muito interessante há poucos dias sobre uma fila quilométrica de milhares de pessoas nos Estados Unidos. Davam voltas em vários quarteirões, querendo uma vaga dos poucos empregos oferecidos por uma empresa. Cada um tinha um formulário preenchido e ficaram horas em pé na espera. Para Jamil, são muito prováveis eleitores de Trump, no que eu acredito também. O trabalhador médio americano tem seu salário estagnado há 50 anos. Se reclamar, outros ocupam o seu lugar.
O Coringa do filme
famoso, ou seja, na sua primeira versão, espelhava exatamente este desalento e
a raiva sem direção que ela provoca. O sentimento originário da extrema direita
é a desorientação de não se saber quem ou o que causa o sofrimento. Se
não há direção, se nunca se identifica os reais causadores da pobreza, então a
extrema direita entra realizando o seu trabalho de canalizar a raiva sem
explicação de modo a criar um estado de guerra entre os pobres.
A questão principal
aqui é como compreender essa opção de pessoas e partidos de elite pelos pobres?
O ponto principal aqui é a desinformação que acompanha a privatização da mídia
e das redes sociais no mundo todo.
A mídia não explica
como e por quem essas pessoas são oprimidas e humilhadas. Sem saber o que causa
seu sofrimento, as pessoas podem ser abusadas na sua vulnerabilidade pelo apelo
da extrema direita que é o de basicamente apontar como causa da pobreza grupos
já estigmatizados e ainda mais vulneráveis por conta disso. Os bodes
expiatórios são muitos e todos intercambiáveis, dependendo do contexto e
momento. Podem ser mexicanos ou muçulmanos nos Estado Unidos, assim como o
nordestino, tido como preguiçoso, e o negro, visto como bandido no Brasil.
Paralelamente, para
fazer a tragédia grande, os sindicatos foram enfraquecidos e não podem mais
manter o contraponto de uma visão específica para os de baixo da escala social.
Sem isso, a mídia e redes sociais movidas pelo dinheiro fazem a festa. Também falta
um mínimo de inteligência e imaginação política aos partidos do campo
democrático. A reação ao discurso dominante é praticamente nula. E este é o
quadro muito especialmente nos Estados Unidos e Brasil, países de
empobrecimento visível dos grupos marginalizados como os negros e os
marginalizados.
Na Europa, a tradição
social-democrata é mais forte e você não tem partidos defendendo a demagogia de
um Pablo Marçal e dizendo que tudo depende do empenho individual. O que
distingue um partido como o linke na Alemanha, mais à esquerda, e o partido
nazista, o AFD, é a questão da imigração, mas se protege do mesmo modo nos dois
casos os ganhos do trabalhador médio. Também não tem a influência nefasta da
religiosidade neopentecostal.
Este é ponto central aqui: a singularidade da extrema direita americana e brasileira é muito parecida e tem a ver com empobrecimento não compreendido nas suas causas. Aí entra o racismo, por meio de suas máscaras, para transformar o negro em criminoso e o nordestino em aproveitador, como explicação espontânea do mundo social para quem não tem outra explicação. O “mapa racial” vem ocupar este lugar vazio. Outra similaridade fundamental com a política americana. Por conta disso, as extremas direitas que mais se parecem são a americana e a brasileira. Não por acaso existe até similitude nos casos de tentativa de golpe de Estado.
Jessé Souza
Escritor, pesquisador e professor universitário. Autor de mais de 30 livros dentre eles os bestsellers “A elite do Atraso”, “A classe média no espelho”, “A ralé brasileira” e “Como o racismo criou o Brasil”. Doutor em sociologia pela universidade Heidelberg, Alemanha, e pós doutor em filosofia e psicanálise pela New School for Social Research, Nova Iorque, EUA.