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quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

Susepe desorganizada II

Com R$ 4,8 milhões disponíveis, Instituto Psiquiátrico Forense continua sem reforma

IPF deveria ter sido reformado há sete anos, mas Estado não cumpriu acordo firmado com o Ministério Público

Por: Schirlei Alves/ZH

Na última década, o Instituto Psiquiátrico Forense Maurício Cardoso (IPF) — responsável pela custódia de pacientes psiquiátricos que cometeram delitos em todo o Estado —, tem sido palco de interdições, descaso e uma série de descumprimentos de ordens judiciais.

Em um dos acordos mais recentes, assinado em dezembro de 2015, o Governo do Estado se comprometeu a reformar seis pavilhões, o prédio da triagem e a cozinha, que foram deteriorados pelo tempo e falta de manutenção, com doação de R$ 4,8 milhões do Tribunal de Justiça. O dinheiro foi arrecadado pelas prestações pecuniárias (pena alternativa paga em dinheiro) de 52 Varas de Execução Criminal do RS. 

"Antes da assinatura (do convênio) já sabíamos que haveria necessidade de aditamento, pois não foi incluído no orçamento a execução da parte elétrica. O Poder Executivo irá verificar se tem como custear o restante ou se a reforma deixará de lado um dos prédios para se adequar ao valor" — diz o documento assinado em julho pela procuradora do Estado Roberta Aribiane Siqueira.
Questionada pela reportagem, a Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe), que é responsável pela gestão do IPF, justificou que a Secretaria de Obras precisa atualizar mais uma vez o orçamento, por isso não iniciou o processo de licitação.
"É inadmissível o Poder Executivo ter quase R$ 5 milhões (disponíveis) há um ano e se comporta como se não fosse prioridade. Eles tem que dar prioridade (à reforma do IPF) e fazer uma força-tarefa para atender a essa demanda" — avalia o juiz-corregedor do Tribunal de Justiça, Alexandre de Souza Costa Pacheco.

Enquanto o convênio da reforma não anda, o IPF acabou sendo novamente interditado, em julho, pelo juiz da Vara de Execução de Penas e Medidas Alternativas de Porto Alegre, Luciano Losekann. O motivo foi a falta de limpeza e de cuidados com a manipulação dos alimentos. Segundo o procedimento de interdição, as empresas terceirizadas haviam deixado de prestar os serviços por falta de pagamento do Estado. Em inspeção, o magistrado flagrou os próprios pacientes limpando os pavilhões e cozinhando.
"O que se viu é estarrecedor: as unidades, quase todas, invariavelmente sujas, pois os pacientes judiciários, diferentemente de segregados comuns, não possuem o mesmo discernimento e condições de realizar as atividades diárias" — destaca o juiz.

Dois meses após Losekann ter considerado tortura o uso de mão de obra de pacientes, ter responsabilizado pessoalmente o governador do Estado e o secretário de Segurança Pública pelo descaso e ter encaminhado o caso à Procuradoria-Geral da República, os serviços terceirizados foram retomados por meio de contrato emergencial de 180 dias e o instituto foi desinterditado. A Susepe garante que está providenciando licitação antes que o contrato termine.

A inspeção deste ano foi realizada com o intuito de verificar se a interdição parcial que já havia sido decretada em junho de 2015 estava sendo cumprida. O objetivo era reduzir o número de segregados oferecendo condições e tratamento para eles retomarem o convívio familiar, recuperar o mínimo da estrutura e possibilitar condições mais humanas aos pacientes.

Nos últimos dois anos, o número de pacientes foi reduzido pela metade. Losekann está responsabilizando os municípios nos casos em que é possível manter os pacientes em residenciais terapêuticos ou sob os cuidados dos centros especializados em saúde mental.
"A situação está um pouco melhor. A intenção (de limitar entrada) é reservar (o IPF) para os que são psicóticos e precisam de tratamento rigoroso. Quando o paciente é morador de rua e não tem família, aí a dificuldade é grande. Os residenciais terapêuticos para onde deveriam ser levados, nem sempre existem nos municípios" — destacou Losekann.
A reportagem visitou as instalações do IPF e constatou que os serviços de limpeza e alimentação foram retomados pelas empresas terceirizadas. Embora não estejam mais convivendo com o lixo e a sujeira, os funcionários reclamaram da falta de profissionais e da precariedade na estrutura física.
"Temos carência de pessoal, de material, de tudo. Houve um tempo aí que a gente não tinha nem papel higiênico para oferecer aos pacientes" — disse um agente penitenciário que não quis se identificar.
Na ala da triagem, onde ficam os presos que aguardam resultado de laudo psiquiátrico e os apenados do sistema prisional que sofreram algum tipo de surto, boa parte das câmeras de vigilância das celas estão quebradas. Segundo um dos agentes, o contrato com a empresa que fazia a manutenção das câmeras foi cancelado.
"As câmeras são enormes porque são muito antigas, então facilita que o preso quebre o equipamento. E quando quebra, não tem conserto" — contou.
Detectores de metais que sobraram do investimento em segurança nos jogos da Copa do Mundo, enfeitam as entradas dos pavilhões, já que nunca foram ligados. Segundo a administração, não há dinheiro para fazer a instalação técnica dos equipamentos.
Exames ficam para 2018

A falta de profissionais de saúde e de agentes para cuidar da segurança dos presos foi um reclamação unânime entre os funcionários.
"Falta médico psiquiatra e técnico de enfermagem. Deveria ter, no mínimo, um técnico em cada unidade" — observou um médico.
Funcionários denunciaram que a administração da unidade solicitou formalmente à Susepe contratação de pelo menos 17 psiquiatras, neurologista, clínico-geral, cinco assistentes sociais, seis terapeutas ocupacionais, 15 auxiliares ou técnicos de enfermagem, 24 agentes de segurança e profissionais para a área administrativa.

Até agora, os pedidos não teriam sido atendidos. Dois psiquiatras que passaram no concurso público de 2014 não quiseram assumir, mas o terceiro e quarto lugar ainda não teriam sido chamados.

A falta de profissionais impacta não só no atendimento aos pacientes, mas na fila de exames. O IPF é responsável pelos exames psiquiátricos solicitados em processos judiciais de todo o Estado. A prioridade é para os réus presos, mas tem exame de réu solto sendo agendado para maio de 2018. Segundo a administração da unidade, existem mais de mil réus aguardando resultados de exames. A demora acaba emperrando os processos judiciais.
Mal a Susepe
Marli Ane Stock, Superintendente da Susepe, respondeu as perguntas por meio da assessoria de imprensa

Por que, em sete anos, a Susepe não conseguiu cumprir o acordo de reforma e contratação de profissionais para o IPF?
Marli Ane Stock: Para a realização de concurso há necessidade de autorização do Governo do Estado, para 2017 já foi autorizado a contratação de 720 agentes penitenciários e agente penitenciários administrativo.
A Susepe tem um plano para cumprir essas obrigações previstas no TAC?
Marli: 
Assim que a Secretaria de Obras analisar e atualizar o orçamento disponibilizado pelo Tribunal de Justiça.
O Tribunal de Justiça disponibilizou o valor de R$ 4,8 milhões para ajudar nas reformas. Por que este dinheiro ainda não foi aproveitado? Há alguma previsão para usar o recurso na reforma?
Marli: 
O recurso disponibilizado pelo judiciário se refere a reforma de todos os pavilhões, no entanto a responsabilidade é da Secretaria de Obras, tanto o projeto como o orçamento. Neste momento, está em análise na Secretaria de Obras a atualização orçamentária, tão logo conclua este diagnóstico a Susepe dará início ao processo de licitação. Esta é uma obra com duração de 18 meses, em função do IPF ter paciente e não presos.
A Susepe pretende contratar mais profissionais para resolver o problema de recursos humanos no IPF?
Marli: 
A Susepe lançou no segundo semestre deste ano, o Edital Emergencial para a contratação de médico Psiquiátrico o qual resultou deserto, por falta de interessados também solicitou a Casa Civil a nomeação de médicos já aprovados em concurso público onde apenas um tomou posse.

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