Agência de inteligência teria
sido "instrumentalizada" para espionar ilegalmente autoridades e
adversários políticos do ex-presidente Jair Bolsonaro, segundo a Polícia
Federal
Com autorização do ministro do
Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, a Polícia Federal (PF) realizou nesta segunda-feira (29)
uma nova etapa da Operação
Vigilância Aproximada, que investiga as atividades da Agência
Brasileira de Inteligência (Abin) durante o mandato de Jair Bolsonaro. Entre os alvos desta ação está
Carlos Bolsonaro, vereador do Rio e filho do ex-presidente Jair
Bolsonaro.
As investigações da PF indicam que a Abin
teria sido "instrumentalizada" para monitorar ilegalmente diversas autoridades e
pessoas envolvidas em investigações, bem como adversários políticos do ex-presidente.
Qual o foco da investigação?
A Operação Vigilância Aproximada, que é uma continuidade
da Operação Última Milha, deflagrada em outubro do ano
passado, investiga suposta organização criminosa na Agência Brasileira de
Inteligência (Abin) que teria realizado espionagens sem autorização judicial
durante o governo Bolsonaro.
A investigação foi aberta depois que a
PF descobriu que a Abin usou o software First Mile, que dá acesso à
geolocalização em tempo real com base na localização
de aparelhos que usam as redes 2G, 3G e 4G.
Houve uma primeira etapa da operação,
na última quinta-feira (25), na qual um dos alvos foi o ex-diretor da Abin,
deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), que comandou a
agência durante o governo Jair Bolsonaro (PL). Nesta segunda-feira, na nova
fase, Carlos Bolsonaro é um dos investigados.
O que a PF já
investigou?
A investigação apontou até o momento
que há indícios de que a Abin tenha atuado ilegalmente nos seguintes casos:
·
apuração sobre o caso das "rachadinhas" no gabinete do senador Flávio Bolsonaro,
filho do ex-presidente
·
investigação a respeito do tráfico de influência contra Jair Renan Bolsonaro,
também filho do ex-presidente
·
suspeita de que Carlos Bolsonaro recebia informações por meio de seus
assessores da "Abin paralela"
·
apuração se a estrutura paralela da Abin promoveu "ações de
inteligência" para atacar as urnas eletrônicas
·
monitoramento indevido de promotora do caso Marielle
Franco;
·
vigilância indevida dos ex-deputados Rodrigo Maia e Joice
Hasselmann;
·
espionagem, sem justificativas, do ministro da Educação, Camilo
Santana, na época governador do Ceará
·
suposta ação para associar autoridades, como os ministros do STF
Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, ao Primeiro Comando da Capital (PCC)
Quem teria
sido espionado?
Ao todo, cerca
de 30 mil pessoas teriam sido monitoradas clandestinamente. A
PF apontou ainda que servidores da Abin produziram informações que teriam
ajudado na defesa dos filhos de Bolsonaro em investigações criminais.
Os indícios encontrados apontam que a
"Abin paralela" tentou produzir provas que relacionassem os ministros
Moraes e Mendes, do STF, ao PCC. Também teriam sido monitorados nomes como o
então governador do Ceará, Camilo Santana, o ex-presidente da Câmara Rodrigo
Maia e a promotora do Rio de Janeiro Simone Sibilio, que investigou milícias e
o assassinato da vereadora Marielle Franco, entre outros.
Quem é e qual
a suspeita sobre Alexandre Ramagem?
Atualmente deputado federal pelo PL do
Rio de Janeiro, Alexandre Ramagem foi diretor-geral da Abin entre julho de 2019
e abril de 2022, durante o governo Bolsonaro. Ele é pré-candidato à prefeitura
do Rio, com apoio do ex- presidente. Segundo a PF, ele teria "incentivado e acobertado" as
espionagens irregulares.
Ramagem foi alvo da primeira fase da operação,
na última quinta-feira (25). Foram feitas buscas nas quais foram encontrados um
celular e um computador que pertencem à Abin em endereços dele.
Qual a
suspeita sobre Carlos Bolsonaro?
Vereador no Rio de Janeiro e filho do ex-presidente Jair
Bolsonaro, Carlos foi alvo da etapa da operação que
investiga os destinatário das informações supostamente obtidas de forma
ilegal.
A PF obteve, por exemplo, um diálogo no qual uma assessora de Carlos pede a uma
assessora de Ramagem informações sobre inquéritos que envolviam o ex-presidente
e seus filhos.
O que diz o despacho do Moraes?
A nova etapa da operação, que foca agora no clã Bolsonaro,
foi autorizada por Alexandre de Moraes. O despacho
autorizando a investida foi assinado pelo ministro no último sábado (leia
a íntegra abaixo). O ministro retirou o sigilo da decisão nesta
tarde.
"Os elementos de prova colhidos
até o momento indicam, de maneira significativa, que a organização
criminosa infiltrada na Abin também se valeu de métodos ilegais para a
realização de ações clandestinas direcionadas contra
pessoas ideologicamente qualificadas como opositoras", diz Moraes no
despacho.
O objetivo da espionagem ilegal seria
obter ganhos políticos ao "criar narrativas" para envolver
autoridades da oposição, jornalistas e políticos, além de fiscalizar o
andamento de investigações de aliados, de acordo com a PF.
O que dizem os investigados?
Em entrevista à GloboNews, Alexandre
Ramagem negou que tenha cometido irregularidades.
"Nós, da direção da Polícia Federal,
policiais federais que estavam comigo, nunca tivemos a utilização, execução,
gestão ou senha desses sistemas" — afirmou.
Carlos
Bolsonaro não havia se pronunciado até a última atualização desta
reportagem. Em entrevista à CNN Brasil, o ex-presidente Jair Bolsonaro defendeu
o filho, afirmando que não recebeu qualquer informação ou relatório da agência
e falou em "perseguição claríssima" contra ele e os filhos.
"Jamais meu filho pediria algo que
não é legal para o Ramagem" — afirmou o ex-presidente.