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domingo, 16 de junho de 2024

Avenida Paulista volta a ser palco de protesto contra PL do aborto

Projeto de Lei (PL) 1.904/24 equipara o aborto de gestação acima de 22 semanas ao homicídio

Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil
Ato no MASP contra o Projeto de Lei (PL) 1.904/24, que equipara o aborto de gestação acima de 22 semanas ao homicídio. 

GH

Lula diz que projeto de lei que equipara aborto a homicídio é "insanidade"

Proposta altera o Código Penal, que atualmente não pune a interrupção de gravidez em caso de estupro nem define o tempo para realizar o procedimento. Presidente afirmou ser pessoalmente contra o aborto, mas que o tema deve ser tratado como um problema de saúde pública

Neste sábado (15), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se pronunciou sobre o projeto de lei (PL) 1904/24, que equipara aborto a homicídio. Em uma mensagem publicada na rede social X (atingo Twitter), Lula disse ser contra o aborto, mas afirmou que é "uma insanidade querer punir uma mulher vítima de estupro com uma pena maior que um criminoso que comete o estupro". O presidente também disse que o tema precisa ser tratado "como uma questão de saúde pública".

O projeto de lei que equipara o aborto após 22 semanas ao homicídio simples gerou um novo debate no país. Na quarta-feira (12), a Câmara dos Deputados aprovou a tramitação em regime de urgência do PL. A proposta altera o Código Penal, que atualmente não pune a interrupção de gravidez em caso de estupro nem define o tempo para realizar o procedimento nesse caso. O procedimento também é permitido quando há risco de morte da mulher e anencefalia fetal (quando não há formação do cérebro do feto).

quinta-feira, 13 de junho de 2024

Avanço do neofascismo levanta novos desafios para Lula

Derrotas recentes, sobre temas caros ao Planalto, mostraram que o governo precisa se reorganizar, tanto no campo político quanto na comunicação com os eleitores brasileiros. A velha fórmula, de ceder espaço no governo para legendas de campos opostos e abarrotar os cofres da Rede Globo, esgotou-se e já não surte mais efeito nas votações do Parlamento ou na melhoria da imagem do presidente.

Por Redação – de Brasília

Os fascistas tentado reviver um país obsoleto, racista e misógino

O avanço das forças neofascistas, no Brasil e no mundo, torna-se um desafio para o terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Apesar da experiência acumulada nos mandatos anteriores, Lula enfrenta agora uma série de novos desafios, no Congresso de maioria conservadora, para aprovar projetos que transcendem a pauta econômica.

Derrotas recentes, sobre temas caros ao Planalto, mostraram que o governo precisa se reorganizar, tanto no campo político quanto na comunicação com os eleitores brasileiros. A velha fórmula, de ceder espaço no governo para legendas de campos opostos e abarrotar os cofres da Rede Globo, esgotou-se e já não surte mais efeito nas votações do Parlamento ou na melhoria da imagem do presidente.

Independentes

O PSD, que ocupa três ministérios de peso (Minas e Energia, Agricultura e Pesca), representa a tendência. A obediência do partido às orientações governamentais caiu de 86% em 2023 para 74% em 2024. Um expoente dessa nova realidade ocorreu no mês passado, quando o partido votou em peso contra um destaque do PT no projeto que combate o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST).

O MDB, que detém outros três ministérios (Transportes, Cidades e Planejamento), viu sua taxa de apoio cair de 81% para 69%, em período semelhante. Presidente da legenda, o deputado Baleia Rossi (MDB-SP) concorda que o partido tem cumprido seu papel nas pautas econômicas prioritárias, mas enfrenta dificuldades em manter a unidade devido à diversidade de suas bancadas.

O Republicanos, por sua vez, que controla o Ministério de Portos e Aeroportos, também registra queda na adesão às orientações do governo, de 77% em 2023 para 70% este ano. O vice-líder da legenda na Câmara, Lafayette de Andrada (Republicanos-MG), justifica a queda como uma coincidência dos temas votados, destacando a posição independente do partido.

Controle

O União Brasil e o PP, ambos com ministérios na Esplanada, também reduziram o apoio às pautas governamentais. A taxa de alinhamento do União Brasil caiu de 71% para 63%, enquanto a do PP diminuiu de 75% para 65%, segundo levantamento produzido pela mídia conservadora.

Assim, as crises em curso entre o governo e o Congresso tiveram impacto no índice de governabilidade (I-Gov) do presidente Lula e colocam sua gestão em situação “de risco”. Esta realidade consta na conclusão de estudo elaborado pela empresa de inteligência de dados 4Intelligence, divulgada nesta segunda-feira pelo diário conservador paulistano O Estado de S. Paulo. Segundo o levantamento, o I-Gov de Lula registrou a taxa mais baixa em maio, atingindo 40,4%, no pior patamar deste terceiro mandato.

O índice de governabilidade é resultado de levantamento para medir as condições do governo de por em prática suas prioridades e emplacar sua agenda em relação aos demais Poderes e ainda sua repercussão na opinião pública. Segundo o estudo, a queda está “fortemente impactada pela relação com o Poder Legislativo”.

Comunicação

A empresa de inteligência analisa três fatores para montar o índice: se o governo consegue aprovar MPs no Congresso; se sofre derrotas em julgamentos no Supremo Tribunal Federal; e como está seu índice de aprovação nas pesquisas de opinião.

Já em relação à opinião pública, o índice chegou a 47,1%, o terceiro mês consecutivo no patamar de 47% e o quarto abaixo de 50%, o que não acontecia com Lula desde o início deste mandato. Segundo a pesquisa, “o resultado incomoda o Planalto, que busca reorganizar o trabalho de comunicação oficial em torno do desafio de aprimorar sua imagem junto a uma sociedade cindida politicamente”.

PF descobre outra joia de Bolsonaro, vendida os EUA

Segundo o diretor-geral da corporação, Andrei Rodrigues, a descoberta “robustece” a investigação; investigadores realizaram diligência nos Estados Unidos. A expectativa é que o inquérito seja concluído nos próximos meses.

Por Redação, com Poder360 – de Brasília

Venda de joias ilegais por aliados 

A PF (Polícia Federal) identificou que uma nova joia foi negociada por aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) nos Estados Unidos. A descoberta foi feita durante diligências dos investigadores no país junto com o FBI, em abril de 2024.

Em um café da manhã com jornalistas nesta terça-feira, o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, disse que a descoberta “robustece” a investigação. “A nossa diligência localizou que, além das joias que já sabíamos que existiam, houve negociação de outra joia que não estava no foco dessa investigação”, declarou o delegado.

A expectativa é que o inquérito seja concluído nos próximos meses. Apesar disso, Andrei Rodrigues disse não ter informações sobre o paradeiro da nova joia.

As joias foram dadas como presente por governos estrangeiros para Bolsonaro enquanto ele estava no Palácio do Planalto. Depois, foram vendidas a joalherias nos EUA por aliados do ex-presidente. Um relógio da marca de luxo Rolex avaliado em US$ 68 mil, por exemplo, foi recomprado por Frederick Wassef, advogado de Bolsonaro, depois das investigações sobre o caso.

O acordo de cooperação foi baseado no Tratado de Assistência Jurídica Mútua (Mutual Legal Assistance Treaties, do inglês), um pacto internacional para assistência ou cooperação jurídica em matéria criminal.

Entenda o caso

Em 11 agosto de 2023, a PF divulgou um relatório que mostra um suposto esquema de venda de presentes oficiais recebidos por Bolsonaro. O ex-ajudante de ordens do então presidente da República, tenente-coronel Mauro Cid, teria realizado a negociação.

Em 4 de abril de 2023, o kit de joias completo foi entregue à Caixa Econômica Federal. Leia mais sobre os kits aqui.

quinta-feira, 6 de junho de 2024

“É preciso reabilitar a natureza no espaço urbano”, diz arquiteta gaúcha radicada na Holanda

GH

Taneha Kuzniecow Bacchin é especializada nas chamadas cidades-esponja e aborda a gestão de riscos, com foco em assuntos relacionados ao desenho urbano, à fragilidade ambiental, ao aumento dos eventos meteorológicos e climáticos extremos e ao esgotamento de recursos naturais

Taneha Kuzniecow Bacchin, 47 anos, é professora de projeto urbano na Universidade Técnica de Delft, na Holanda.

Nascida na capital gaúcha, a pesquisadora é arquiteta urbanista e pesquisa gestão de riscos, com foco em assuntos relacionados ao desenho urbano, à fragilidade ambiental, ao aumento dos eventos meteorológicos e climáticos extremos e ao esgotamento de recursos. A profissional começou a estudar Arquitetura na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), mas se mudou aos 21 anos para Veneza, na Itália, onde concluiu a graduação. 

Nesta entrevista para GZH, a gaúcha aborda a temática de cidades-esponja, um conceito que define iniciativas urbanas projetadas para que a água da chuva seja mantida e absorvida por meio de sistemas de drenagem sustentáveis. O objetivo é trabalhar o ciclo completo da água, para reduzir o impacto de cheias, alagamentos e inundações.

A arquiteta também defende a necessidade de respeitar o espaço dos cursos d’água com a manutenção de ambientes verdes (vegetação), azuis (água) e solo permeável, além da ocupação inteligente de orlas e atenção à educação ambiental. A pesquisadora mora em Rotterdam, uma das cidades que servem de modelo no gerenciamento de risco hidrológico.

O que é uma cidade-esponja?

É uma cidade que trabalha o ciclo hidrológico completo, que tem um desenho sensível à água. Ou seja, ela tem uma série de medidas em espaços para receber a água da chuva. Algumas zonas são áreas de detenção e retenção, que podem ser canaletas verdes, pavimento permeável e jardins de chuva. Há infraestruturas verdes e azuis que conseguem gerenciar a precipitação. A água não é desperdiçada e não é drenada para outras áreas, e sim permanece no local o máximo possível, infiltrando-se no solo ou armazenada em reservatórios para ser reutilizada em um momento de seca. A cidade é como uma esponja, que mantém, de forma segura, a água da chuva.

Todas as cidades podem ser uma cidade-esponja?

Com certeza. É preciso colocar em rede o conjunto de praças, parques e áreas permeáveis que já existem e adaptá-los ao sistema de mobilidade urbana. Infelizmente, nós contamos muito com o uso do carro. Se existir investimento em transporte público, em ciclovias, você dá mais espaço para aberturas de corredores verdes e azuis no tecido da cidade. É um projeto integrado de repensar a integração entre a mobilidade urbana, a rede de drenagem, os sistemas paisagístico e ambiental, as condições de uso do solo e as densidades ocupacionais.

Cartão-postal de Porto Alegre, o Guaíba desperta hoje medo em parte da população devido à cheia. Como reverter isso?

A questão é o desenho da orla, do que ela é feita. Ela não deve ser uma linha, mas uma zona de transição capaz de amortecer um volume maior de água em um contexto de cheias. Ela deve ser adaptada em relação à condição fisiográfica e paisagística, em um limite entre corpo de água e terra. Porto Alegre é uma cidade com uma topografia variada, com zonas altas e baixas, o que faz com que a água da chuva escorra para dentro da cidade devido à gravidade. Na parte alta, o volume não se infiltra no solo, mas, isso sim, se move para baixo. Por isso, é muito importante, dentro do contexto do tecido de Porto Alegre, esse desenho de microbacias, de termos mais solo permeável. Sendo bem clara: é preciso reduzir a quantidade de impermeabilização do solo devido à urbanização. Também são importantes bacias de retenção e detenção, que podem ser espaços verdes, em parques e praças públicas. Essas bacias são locais para serem usados em momentos de grande vazão, para que a água seja armazenada ali, como se fossem pequenas bacias, mesmo, que é uma forma de dar mais espaço à precipitação em caso de chuva extrema. É uma questão de desenho da infraestrutura, de adaptação do ambiente já construído.

Por onde Porto Alegre deve começar para se tornar uma cidade-esponja?

Isso parte da identificação de áreas que podem ser adaptadas. É possível começar pela identificação dos grandes corredores de mobilidade urbana de Porto Alegre. Há um fluxo de transporte, que torna difícil adaptar esses locais. Mas outras vias, não tão hierarquicamente vitais, podem ser transformadas para receber uma mobilidade lenta, com ciclovia, áreas verdes e azuis. Isso é uma análise do tecido urbano. Áreas que estão recebendo novos empreendimentos são as ideais para ter essa concepção. Já a adaptação pode ser mais difícil em áreas consolidadas do ponto de vista de identidade cultural e valor econômico. Mas esse tipo de mudança deve começar com uma análise que integre hidrologia, geotecnia, transporte, urbanismo e paisagem. Na união desses campos disciplinares, você consegue identificar áreas de Porto Alegre que podem ser adaptadas.

Quais cidades podem ser exemplos para a Capital e o Rio Grande do Sul como um todo?

Rotterdam, onde moro, é um exemplo mundialmente conhecido de cidade-esponja. Ela desenvolve um plano estratégico de adaptação climática, que é a base do plano diretor. Existem várias áreas específicas desse trabalho. Um exemplo é a Water Square (Praça de Águas), que é um equipamento público de esportes ao lado de uma escola. Há uma quadra de basquete rebaixada em relação ao nível da rua, como se fosse uma bacia de detenção. Ela é pintada de azul para identificar isso. Existe todo o desenho de rebaixamento de solo, que faz com que o fluxo de vazão em excesso da área adjacente chegue até ali e, de maneira segura, entre nessa bacia de detenção, que é a quadra de basquete. Outro exemplo é o chamado de jardim de chuva, um local rico na escolha de plantas, na densidade da vegetação, que é um mecanismo de drenagem. A água que ali chega é filtrada pela vegetação e permanece nesse solo por um determinado momento; depois, é absorvida pela rede de tubulação. Outra medida importante para um caso extremo é um grande estacionamento subterrâneo, que funciona como um enorme tanque. No caso de chuva extrema, parte da vazão é direcionada para esse lugar e armazenado no subsolo.

A cidade é desenhada para conviver com períodos chuvosos, mas, sem chuva, a estrutura segue tendo utilidade pública. É o resumo do que é feito na Holanda?

Todos os projetos no contexto holandês são desenhados para a segurança hídrica. No entanto, são acompanhados por um olhar para a melhoria da qualidade espacial e de equipamentos públicos, ou seja, há uma busca por uma paisagem que seja uma infraestrutura verde e azul multifuncional. As áreas verdes dão oportunidades de recreação, cultura e lazer, que melhoram a saúde física e ambiental da população. Também é cientificamente provado que exposição à natureza reduz o nível de estresse e estimula o exercício físico. Portanto, não são projetos que ajudam apenas na gestão da água, mas que melhoram o microclima, a qualidade do ar e da vida da população.

Os exemplos citados são projetos públicos focados na adaptação da cidade às mudanças climáticas. Qual é a parte da população nisso? Há cobranças, os habitantes ajudam?

Dois terços da Holanda estão abaixo do nível do mar. A cultura holandesa foi construída a partir da gestão hídrica, da dinâmica entre sistema de terra e água, então isso faz parte da identidade, de ser holandês. Existe uma consciência do risco, mas a infraestrutura é dimensionada para isso. O investimento de infraestrutura é feito com projeções de longo prazo, de 50, cem anos. Existe um constante trabalho também de produção de cenários, de como a sociedade, a economia, a política e o ambiente estarão em um futuro distante. A capacidade adaptativa de resiliência do ambiente construído e natural da sociedade é muito presente. Para que os Países Baixos permaneçam a salvo das águas, é preciso envolver a cidade inteira, não só a política. Na praia, a criança holandesa não constrói castelos, e sim diques, porque faz parte do imaginário, da base cultural do ser holandês o risco hidrológico. Ao mesmo tempo, isso faz com que seja uma sociedade que não aceita se expor a esse risco, busque o controle da situação e foque no planejamento de ações de longo prazo.

O que foi feito em Porto Alegre nos últimos anos ou décadas que podemos entender como contrário à ideia da construção de uma cidade-esponja, apta para lidar com o risco?

Houve uma drástica redução das áreas verdes da cidade, que se transformaram em corredores de mobilidade urbana. Há também uma intensidade alta de uso do solo em zonas baixas, expostas à inundação do Guaíba, como todo o projeto da orla, e, em especial, a Zona Sul, que recebeu um novo desenho de prédios nos últimos anos. São exemplos de locais que deveríamos ter tido um cuidado maior em relação a essa zona de transição entre o lago e a cidade. As escolhas de uma densificação alta de determinados pontos, que fizeram com que áreas abertas fossem reduzidas, leva ao desastre. Se você não consegue gerenciar a vazão que foi gerada pela água da chuva, ela vai chegar em zonas mais baixas da cidade. O problema ocorre quando não há um espaço de amortecimento, um ponto seguro para gerenciar essa água. Por isso, é fundamental entendermos como ocupamos a cidade, a impermeabilização extensiva e intensiva do solo urbano. É importante entender que a infraestrutura urbana não é só feita de tubulações, canaletas, condutos, ruas e avenidas. Esta é uma mudança de mentalidade que precisamos ter: espaço público, solo permeável, áreas verde e azul devem ser vistos também como parte da infraestrutura de Porto Alegre.

O Muro da Mauá é o principal ícone do sistema de proteção contra cheias na Capital. Esse tipo de estrutura dialoga com ser uma cidade apta para lidar com riscos climáticos?

O Muro da Mauá é uma medida estrutural possível, que foi muito importante no contexto vivido. Infelizmente, não foi bem mantido, mas funciona como uma linha de proteção do Centro Histórico. O debate importante é a mudança de paradigma. Então, o muro é uma das medidas possíveis, mas ela não deve ser a única: precisa ser colocado junto a uma série de ações que dão mais espaço de amortecimento, de retenção e detenção da vazão em excesso. É necessário um redesenho da orla em pontos críticos para que ela consiga ser um espaço amplo de transição entre o Guaíba e o tecido urbano. Não posso dar uma resposta sobre se é necessário aumentar ou retirar o muro, pois ele faz parte de uma combinação de medidas. O debate deve levar em conta os cenários possíveis. Quais são os espaços que podem estar colocados para receber o volume a mais de água em um contexto extremo? Aqui entra a importância de um desenho que trabalhe de maneira integrativa entre as infraestruturas do tecido urbano em diferentes escalas. A redução do risco não ocorre só com o muro, mas com união de medidas sistêmicas.

Porto Alegre teria lidado melhor com a cheia se fosse uma cidade-esponja?

Com certeza. O risco é reduzido em uma cidade que integra aumento de áreas abertas verdes e azuis, solo permeável e amortecimento ao longo da orla. Cito mais uma vez a Holanda, com o projeto Espaço para os Rios. A implementação dele, nessa condição de esponja em áreas ribeirinhas, fez com que, no início deste ano, houvesse risco reduzido ao longo dos rios mesmo em um período que foi de muita chuva.

Atitudes individuais podem ajudar na criação de uma cidade-esponja?

Sim. Algumas atividades em pequena escala podem contribuir, tanto do ponto de vista da conscientização ambiental, quanto da parte prática. Se você tira uma pedra, um pedaço de pavimento, e deixa o solo exposto, potencialmente permeável, você já está melhorando, por pouco que possa parecer. Na Holanda, moradores pedem para a prefeitura retirar a pavimentação da calçada adjacente ao edifício e ali são plantados pequenos jardins. Isso ocorre em pequena escala, mas contribui para reduzir a superfície impermeável do solo. Se isso é feito de maneira sistêmica, você cria um corredor verde na cidade. Temos a tendência a pavimentar áreas onde passam automóveis. Isso pode ser substituído por um pavimento permeável, que já traz um impacto positivo muito grande. Se você está trabalhando com jardins de chuva, que têm tecnologia de drenagem, você também ajuda.

Quais exemplos de cidades que mudaram de postura após a ocorrência de desastres?

Copenhague, na Dinamarca, sofreu com chuva intensa nos últimos anos. A cidade repensou seu sistema de planejamento urbano para adaptação climática. Várias zonas da cidade foram redesenhadas a partir desse conceito de infraestrutura verde e azul. As praças também foram readaptadas com bacias de retenção e detenção, além de jardins de chuva. A Austrália tem investido muito, principalmente em Melbourne, onde o conceito de desenho sensível às águas, water-sensitive urban design, foi desenvolvido. No contexto brasileiro, Belo Horizonte, Curitiba e São Paulo são cidades com algumas boas iniciativas.

Porto Alegre e o Rio Grande do Sul buscam o que fazer para evitar novas cheias no futuro apenas depois de uma tragédia. É comum que a mudança de paradigma em relação ao clima ocorra em situações assim ou há exemplos de prevenção?

Muitos dos que trabalham na minha área, com gestão de risco, costumam dizer que, infelizmente, você precisa da catástrofe para mudar mentalidades. Isso acontece em qualquer lugar. É necessária uma situação de emergência para repensar os planos e os projetos. Você tem que chegar nesse ponto, no que aconteceu no Rio Grande do Sul, para que exista uma sensação de urgência, de que precisamos fazer alguma coisa, repensar como construímos, como ocupamos e urbanizamos. No dia a dia, todos nós, em diferentes escalas, estamos envolvidos com nossas vidas, e não nos damos conta das escolhas que fazemos. Não pensamos em como o mercado impõe uma determinada forma de ocupação e produção do espaço, que é destrutiva em relação à qualidade das condições naturais. Sem uma saúde de processos naturais, teremos catástrofe como a que estamos vendo (no Rio Grande do Sul). Espero que a dimensão do que aconteceu no Estado traga uma conscientização pública e individual na sociedade, da relação entre ambiente construído e o ambiente natural. É necessário um respeito. É preciso reabilitar a natureza no espaço urbano, pois é ela que sustenta a qualidade de vida nas cidades. Precisamos de conscientização não só a curto prazo, no contexto da emergência, mas capaz de definir ações de médio e longo prazos.

domingo, 19 de maio de 2024

Tragédia histórica expõe o quanto governo Leite ignora alertas e atropela política ambiental

Governo desfigurou Código Estadual do Meio Ambiente e sancionou construção de barragens em áreas de preservação, entre outras medidas

Por Luciano Valleda

Poucos dias antes do início das chuvas que infligem ao Rio Grande do Sul a sua maior tragédia climática, a Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan) enviou ao governador Eduardo Leite (PSDB) um ofício com o incomum título de “Alerta ao Estado do Rio Grande do Sul e ao Governador do Estado”, seguido pelo subtítulo que dizia: “Registro para fins de tomada de conhecimento sobre alertas emitidos há várias décadas”. O documento foi entregue no último dia 26 de abril.

Logo no início, o ofício deixa claro o objetivo de avisar o governador de que o mundo “está enfrentando uma crise climática”. Antes de parecer estranho que a entidade ambientalista mais antiga do RS e do Brasil se disponha a produzir um documento para informar Leite de algo amplamente discutido no planeta, o ofício revela a péssima relação do governador gaúcho com os ambientalistas do estado.

No documento, a Agapan enfatiza que a crise climática é divulgada pela ciência e imprensa há várias décadas e explica que o problema “tem o fator antropogênico como um de seus principais ingredientes de intensificação, sem desconsiderar outros de caráter cíclico e universal que possam somar”. Antropogênico, no caso, significa a ação do ser humano no meio ambiente.

O parágrafo seguinte do documento expõe a distância que separa o governador, apesar do figurino de colete da Defesa Civil quando a tragédia acontece, e os ambientalistas que há anos criticam as medidas adotadas pelo governo Leite.

Neste sentido, alertamos que a falta de atitudes para estancar e reverter processos que contribuem para o avanço da crise – a exemplo da liberação de mais venenos agrícolas, da autorização para destruir Áreas de Preservação Permanente, da falta de uma política permanente de recuperação de matas ciliares, do incentivo anacrônico à construção de polos carboquímicos e de instalações de infraestrutura que não reconheçam os direitos das comunidades tradicionais, da falta de cuidados e ingerência dos recursos hídricos, entre outros – será motivo de proposta de Ação Civil Pública de nossa parte. É apenas um alerta com o objetivo claro de contar com a parceria para encontrar ‘soluções coletivas’ para estancar e fazer a nossa parte, enquanto povo gaúcho, para ajudar a reverter as mudanças climáticas.”

No ofício, a Agapan afirma não poder mais, por princípio de precaução diante da crise climática alertada há décadas, “ser complacentes com governos que têm demonstrado pouca ou nenhuma sensibilidade para a situação, em especial, da população mais vulnerável, que primeiro sofre e sofrerá com a ampliação do ritmo de avanço das mudanças climáticas”.

Presidente da Agapan, Heverton Lacerda pondera que a crise climática vivida no planeta pode levar séculos para ser revertida – ou nunca ser. A única chance é se, nos próximos anos e décadas, as sociedades conseguirem, de forma muito drástica, primeiro estancar tudo o que está causando e ampliando a crise climática, e depois realizar ações para a reversão.

Não adianta apenas resiliência ou mitigação de danos. O que precisa ser combatido é a causa da mudança climática. O que os governos estão fazendo é ligado à questão da resiliência e da mitigação de danos, tirando a população de locais atingidos, mas vão continuar fazendo aquilo que causa a crise climática”, afirma, sem esconder na voz a insatisfação com os rumos da política ambiental.

A calamidade que assola o RS, com 78 mortos e mais de cem desaparecidos até o momento, número que tende a crescer nos próximos dias, é uma “tragédia anunciada” na visão de Lacerda. “Não existe nada que possa ser feito para evitar o próximo evento climático extremo que vai acontecer porque estamos dentro da crise climática.”

Se no curto prazo há pouco a fazer, no médio e longo prazo a perspectiva pode ser outra. O presidente da Agapan cita como prioridades a recomposição das Áreas de Preservação Permanente (APP), a recomposição das matas ciliares e o aumento do calado dos rios. A última medida com resultado mais rápido.

Desassorear rios seria uma solução de forma imediata, cara e trabalhosa, mas o melhor seria a gente recompor as florestas”, defende. “Um dos grandes problemas é o assoreamento dos rios por causa de um modelo agrícola de desenvolvimento que desmata as bordas dos rios, tanto para construir casas quanto lavouras. Nossos rios estão assoreados, nossas cidades estão sendo construídas na beira dos rios, as encostas dos morros estão sendo impactadas, mesmo quando têm vegetação já tiraram as árvores grandes com raízes profundas, não é mais a mata natural.”

Ao citar os rumos para estancar a devastação ambiental que influencia diretamente na mudança climática e abre caminho para a força das águas dos rios, as divergências entre a Agapan (e outras entidades ambientalistas gaúchas) e o governo Leite se tornam evidentes. Mais que isso, explicam o ofício enviado poucos dias antes da atual tragédia causada pelas enchentes.

O governo do Rio Grande do Sul vai na contramão da ecologia. Estamos regredindo na legislação ambiental enquanto estado que foi precursor na criação de leis ambientalistas. Outros estados que criaram a sua legislação ambiental, inclusive a nacional, se basearam no que foi criado aqui no Rio Grande do Sul”, destaca Lacerda.

A revolta remonta ao começo do primeiro mandato de Leite, em 2020, quando o governador aprovou na Assembleia Legislativa a Lei 15.434. Chamada de Novo Código Estadual do Meio Ambiente, a lei suprimiu ou flexibilizou mais de 500 artigos e incisos do Código Estadual de Meio Ambiente criado no ano 2000, afrouxando regras de proteção ambiental dos biomas Pampa e Mata Atlântica.

Em outubro de 2023, já depois da trágica enchente que devastou o Vale do Taquari, durante evento de lançamento do Plano de Governança e Conformidade Climática, a secretária estadual do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema), Marjorie Kauffmann, chegou a dizer que o novo Código Estadual do Meio Ambiente “trouxe mais elementos para analisar” o tema das mudanças climáticas.

Quando entra um governo com essa visão mais neoliberal e anti-ecológica, ele se baseia nas legislações de fora que estão mais permissivas do que as nossas para fragilizar e enfraquecer a nossa legislação. As que se basearam nas nossas foram criadas de uma forma mais flexível”, explica o presidente da Agapan.

No mesmo evento em outubro do ano passado, ao apresentar as ações de enfrentamento às mudanças do clima que o governo estadual entende já teriam sido realizadas, outros episódios que tiveram ampla repercussão negativa junto as entidades ambientalistas do RS chamaram a atenção. Foi o caso do Licenciamento por Adesão e Compromisso (LAC), conhecido como autolicenciamento privado, criado em dezembro de 2021 e muito criticado por afrouxar a fiscalização ambiental. A medida permite que 49 atividades econômicas, sendo 31 com alto e médio potenciais poluidores, sejam autorizadas independente do seu porte.

Quando a LAC foi aprovada pelo Consema, o Centro de Estudos Ambientais (CAE), sediado em Pelotas, declarou que o caso representou o “maior retrocesso ambiental promovido por um governo nesse colegiado”. A ONG diz que o órgão atualmente está dominado por uma aliança anti-sociedade e anti-natureza, reunindo o governo estadual e o agronegócio, a indústria e a construção civil.

Ainda no evento de lançamento do Plano de Governança e Conformidade Climática, entre as medidas listadas pelo governo estadual como ações para enfrentar a crise climática no RS esteve a participação na Conferência do Clima (COP 26), em Glasgow, e na COP 27, no Egito; a adesão ao programa Race to Zero e Race to Resilience; a criação do Fórum Gaúcho de Mudanças Climáticas; o incentivo a criação de Comissões Municipais sobre Mudanças Climáticas; assim como a assinatura do protocolo de intenções para a descarbonização das cadeias produtivas do RS e o Programa de Desenvolvimento da Cadeia de Hidrogênio Verde no RS, entre outras ações consideradas inócuas ou insuficientes pelas entidades ambientalistas do estado.

Discurso x prática

No dia 14 de setembro de 2023, enquanto as famílias no Vale do Taquari ainda choravam seu parentes mortos, procuravam desaparecidos e contabilizam os prejuízos econômicos causados pela enchente, o Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema) aprovou a atualização do Zoneamento Ambiental para a Atividade da Silvicultura (ZAS) no estado. Pela decisão, a alteração será aplicada aos novos plantios ou na renovação dos plantios florestais já existentes.

As áreas de plantios da silvicultura passarão dos atuais 900 mil ou 1 milhão de hectares para 4 milhões de hectares em cada Unidade de Paisagem Natural (UPN) x Bacia Hidrográfica (BH). A silvicultura é o cultivo de florestas por meio do manejo agrícola, com o objetivo de suprir o mercado de madeira e aproveitar o uso racional das florestas. No RS, o eucalipto é um dos principais cultivos da silvicultura.

A mudança foi comemorada pela secretária estadual do Meio Ambiente, Marjorie Kauffmann. A aprovação se concretizou mesmo com os alertas de perda de biodiversidade feitos por técnicos da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam). Membro do Consema, o Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (InGá) também emitiu parecer contrário a mudança. No documento, a entidade afirmou que a aprovação poderá representar uma “irreversível e extraordinária perda adicional ao Pampa e aos Campos Sulinos”. O InGá ainda considerou que a proposta aprovada teve vício de origem por ter sido elaborada por empresas contratadas pelo próprio setor a ser regulado pelo governo estadual.

A empresa que construiu a proposta foi a Codex, sob financiamento da multinacional chilena CMPC, e protocolada no Consema pela Fiergs. No último dia 29 de abril, cerca de seis meses após a mudança na regra e quando já chovia no RS, o governo estadual e justamente a CMPC firmaram um protocolo de intenções para a instalação de uma nova planta industrial de produção de celulose em Barra do Ribeiro. Com aporte de R$ 24 bilhões da empresa, o negócio foi festejado pelo governo como “um dos maiores investimentos privados da história do Rio Grande do Sul”.

Recentemente, outro projeto com alto potencial de impacto ambiental colocou Leite e entidades ambientalistas em lados opostos. Trata-se da lei que flexibiliza ainda mais o Código Estadual de Meio Ambiente para permitir a construção de barragens e açudes em Áreas de Preservação Permanente (APP). O objetivo é proporcionar alternativas de armazenamento de água para agricultura e pecuária, de modo a enfrentar períodos de estiagem. Leite sancionou no dia 9 de abril o projeto aprovado em março na Assembleia Legislativa.

Na ocasião da aprovação do projeto, Rodrigo Dutra, mestre em Ecologia e integrante da Coalisão pelo Pampa, avaliou que a medida é resultado da vulgarização dos conceitos de utilidade pública e interesse social. “Em geral, são exceções para obras e empreendimentos de interesse coletivo, e nos PLs entram várias atividades particulares como a irrigação e até a mineração”, disse.

Para Dutra, o pano de fundo para a discussão sobre o tema é a omissão estadual em implementar o Programa de Regularização Ambiental (PRA), previsto desde 2012 para recuperar passivos de APPs e reserva legal nos biomas Pampa e a Mata Atlântica – a Reserva Legal determina a preservação de no mínimo 20% de todo imóvel rural. Ele pontuou ainda que, segundo o Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (PLANAVEG), apenas no bioma Pampa deveriam estar sendo recuperados 300 mil hectares de APPs e Reserva Legal. “Nada disso está acontecendo, e o PL prevê destruir mais APPs para barragens”, lamentou.

Também após a aprovação pela Assembleia do projeto que flexibiliza o Código Estadual de Meio Ambiente, a Agapan emitiu nota denunciando o que definiu como a “destruição ambiental” que está sendo incentivada e legalizada no estado. A entidade destacou haver muitas provas científicas sobre o impacto das atividades humanas no planeta, com enormes danos ao meio ambiente. E neste contexto de crise ambiental intensificada pelas mudanças climáticas, disse que a nova lei aprovada no RS é “antiecológica” e “irresponsável”.

Outro lado

Questionado pela reportagem do Sul21 sobre as ações de enfrentamento a crise climática implementadas desde a enchente de setembro do ano passado, o governo estadual informou apenas que, neste momento, “trabalha 24 horas por dia com prioridade total no resgate e atendimento às vítimas das chuvas históricas”, com toda sua estrutura agindo de forma descentralizada e em conjunto com as forças nacionais de segurança.

Pensando na adaptação e resiliência climática, em novembro de 2023 foi instituído o Gabinete de Crise Climática, que tem como principal função conectar as secretarias de Estado, instituições e pesquisadores no monitoramento e implementação de ações práticas de resposta à crise do clima”, respondeu, em nota.

Entre as medidas em andamento citadas pelo governo Leite para enfrentar a crise climática, estão a contratação de serviço de radar meteorológico pela Defesa Civil, que será instalado na Região Metropolitana de Porto Alegre e está em fase final de implementação; melhorias na Sala de Situação, responsável pelo monitoramento das chuvas e dos níveis dos rios; e a implementação do roadmap climático dos municípios, que mapeará as ações relacionadas ao clima em esfera municipal.

O governo reforça o seu compromisso, neste momento, em garantir a vida e a segurança da população gaúcha neste momento de emergência”, afirma, sem citar nenhuma das ações defendidas pelos ambientalistas para mudar a trajetória dos futuros eventos climáticos extremos.

Em novembro do ano passado, um dia depois da Assembleia Legislativa aprovar o orçamento do governo estadual para 2024, com receitas totais de R$ 80,3 bilhões e despesas totais de R$ 83 bilhões (um déficit de R$ 2,7 bilhões), o governo Leite celebrou a fatia do orçamento de R$ 115 milhões para enfrentar os eventos climáticos no RS no ano de 2024. O governo definiu o valor previsto como um “orçamento robusto”, embora a cifra represente menos de 0,2% do orçamento total aprovado.


sexta-feira, 17 de maio de 2024

Grêmio inicia viagem para realizar treinos em São Paulo

Clube treinará até o dia 26 no CT do Corinthians e mandará jogos no Couto Pereira, em Curitiba

Grêmio já está a caminho de São Paulo, onde vai permanecer até o dia 26 e maio, em preparação para a retomada da temporada 2024. Os funcionários do estafe do clube desembarcam na capital paulista na tarde desta quinta (16) e os trabalhos com os jogadores já serão iniciados na sexta (17), no CT Joaquim Grava, do Corinthians.

A operação começou nos primeiros dias da semana, quando parte dos funcionários precisou resgatar alguns dos materiais de trabalho que estavam no CT Luiz Carvalho. Em função do alagamento no CT, botes e barcos foram utilizados para o transporte dos equipamentos, que foram levados diretamente para São Paulo. Para viabilizar tudo isso, o clube precisou do apoio de órgãos como a PRF e a EPTC, por exemplo.

Já na madrugada desta quinta (16), foi iniciado o trajeto por volta de 1h, quando parte dos funcionários que estava em Porto Alegre embarcou no ônibus do clube rumo a Florianópolis. São ao menos 15 pessoas do clube fazendo este itinerário, entre auxiliares técnicos, médico, analistas de desempenho, fisiologista, fisioterapeuta e preparadores. Após o desembarque na capital de Santa Catarina, que aconteceu às 7h, a delegação segue viagem através de um voo comercial até São Paulo.

Até sexta (17), os jogadores também se encontrarão com os demais funcionários na capital paulista. A maioria dos atletas já estava fora do RS, assim como o técnico Renato Portaluppi, que está no Rio de Janeiro. Também por isso, o Grêmio entendeu que São Paulo seria sede mais acessível para todos. Em princípio, apenas Rodrigo Ely, Edenilson e Ronald haviam ficado no Estado durante a enchente, mas em locais seguros. O trio também está a caminho do sudeste brasileiro.

Das opções avaliadas, o CT do Corinthians é um dos que oferecia a melhor estrutura. Além dos campos em ótimas condições, há também uma academia espaçosa, com equipamentos de ponta e demais estruturas utilizadas pelos jogadores. O grupo se hospedará em um hotel próximo ao local, o que também minimiza o tempo perdido em deslocamentos.

No CT Joaquim Grava, do Corinthians, o Grêmio fará sua primeira parte da preparação na retomada da temporada, até o dia 26 de maio. Depois disso, o planejamento será reavaliado. Enquanto isso, mandará os dois próximos da Libertadores, contra o The Strongest, dia 29 de maio, e contra o Estudiantes, dia 8 de junho, no estádio Couto Pereira, em Curitiba.

segunda-feira, 13 de maio de 2024

Governo Eduardo Leite não colocou em prática estudos contra desastres pagos pelo estado

Servidores, técnicos e cientistas propuseram medidas que poderiam diminuir impacto do desastre

No final de outubro do ano passado, o governo de Eduardo Leite (PSDB) anunciou a criação do Programa de Estratégias para as Ações Climáticas, o ProClima 2050, descrito como um roteiro para ações e medidas de mitigação dos efeitos e de adaptação Rio Grande do Sul diante da emergência climática. Naquele momento, os desastres climáticos já se sucediam desde março, fechando 2023 com um total de 81 mortes em diversas regiões do estado, conforme a Defesa Civil gaúcha. Um plano anterior, a Política Estadual de Gestão de Riscos de Desastres, de 2017, já havia sido engavetado, como mostrou reportagem da Agência Pública do ano passado.

O ProClima, porém, até agora não resultou em medidas concretas do governo, segundo fontes ouvidas pela reportagem. “O governador Eduardo Leite ignora qualquer alerta ambientalista e do corpo técnico da Sema [Secretaria de Meio Ambiente e Infraestrutura] e da Fepam [Fundação Estadual de Proteção Ambiental]. Suas ações afrouxam os regramentos ambientais, sucateiam a estrutura pública, contribuindo para agravar as vulnerabilidades diante desse evento climático extremo”, resume o ambientalista e biólogo Rafael Altenhofen, presidente do Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio Caí, uma das mais afetadas pelas águas tanto no ano passado como neste ano.

Altenhofen, que também é coordenador da União Protetora do Ambiente Natural (Upan), mora em Montenegro, um município obrigado em Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) a contratar estudos de áreas de risco há mais de 20 anos. Segundo ele, já foram feitos nove estudos semelhantes pagos com dinheiro público, além de outros feitos por universidades e outras instituições, que não foram traduzidos em ações pelo governo.

De tempos em tempos contratam novos, ignorando os anteriores, talvez por seus resultados contrariarem interesses de certos empresários. Eles desejam que a ciência valide certas vontades prévias. Como isso não acontece, nada foi feito para reduzir as vulnerabilidades”, diz o biólogo.

Entre os estudos pagos pelo governo está, por exemplo, o Zoneamento Ecológico Econômico (ZEE) – previsto na Política Nacional do Meio Ambiente e definido como instrumento da Política Estadual do Meio Ambiente (Lei 15.434/2020). O trabalho, que trata da organização do território, estabelece medidas e padrões de proteção ambiental, levou mais de quatro anos para ser elaborado, contou com intenso envolvimento de servidores, instituições e da sociedade civil e foi pago com dinheiro público. Mas também acabou em alguma gaveta da Sema.

Foi com surpresa, portanto, que ele e outros especialistas ambientais  do Rio Grande do Sul tomaram conhecimento pela imprensa de que agora, com a catástrofe em curso, um grupo de empresários sugeriu ao governo do estado contratar empresa ou especialista em evitar catástrofes. “Inacreditável! Então tudo que se aprendeu, ensinou, se fez e divulgou no Rio Grande do Sul, em ciência e tecnologia, não é suficiente?”, pergunta, lembrando que o estado dispõe de gente capacitada para evitar e prevenir catástrofes, mas que nunca são ouvidas pelos tomadores de decisão do Executivo.

O professor Francisco Aquino, do Centro Polar e Climático da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)., em novembro do ano passado, já havia chamado atenção para a probabilidade de ocorrerem novos eventos extremos em 2024, como tempestades extremas e inundações, por influência do El Niño, o que, infelizmente, se confirmou.

Suas declarações foram feitas no seminário “Realidade das mudanças climáticas: os desafios da governança e da reconstrução”, promovido pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul para anunciar o GabClima, um gabinete para dar subsídios para “estimular, induzir ou até cobrar do Poder Público algumas medidas emergenciais ou a médio e a longo prazos de forma contínua”, nas palavras do promotor Regional Ambiental da Bacia dos Rios Taquari-Antas, Sérgio Diefenbach.

Aquino é chefe do Departamento de Geografia da UFRGS, onde os docentes lançaram na sexta-feira, 10 de maio, um manifesto em que explicitam: “Nosso curso é atual e pode oferecer inúmeras soluções para a crise que enfrentamos face aos desastres naturais que assolaram as regiões mais populosas do Estado”.

Questionada pela Agência Pública sobre o ProClima, a assessoria de imprensa da Sema enviou nota informando que uma das iniciativas no âmbito do programa foi a criação de um grupo de trabalho para conectar secretarias de estado, instituições e pesquisadores no monitoramento e implementação de ações práticas de resposta à crise do clima. Afirma também que, entre as medidas em andamento, estão a contratação de serviço de radar meteorológico pela Defesa Civil na região metropolitana de Porto Alegre que está em fase final de implementação; melhorias na Sala de Situação – responsável pelo monitoramento das chuvas e dos níveis dos rios –; e a implementação do roadmap climático dos municípios, que mapeará as ações relacionadas ao clima em esfera municipal.

Recomendações de técnicos dos órgãos ambientais do estado são ignoradas

Técnicos concursados dos órgãos ambientais também vêm denunciando desde o primeiro mandato de Leite a insuficiência de pessoal para lidar com os impactos da crise climática, incluindo a pouca atenção dada à prevenção e ao atendimento aos desastres. Segundo os servidores, há também a necessidade de concurso público para suprir a falta de pessoal em divisões como a de Meteorologia, Mudanças Climáticas e Eventos Críticos do estado.

Em setembro de 2023, depois das tragédias do Vale do Taquari, a Associação dos Servidores da Sema (Assema) enviou um ofício à secretária de Meio Ambiente, Marjorie Kauffmann, destacando que os servidores estavam dispostos a “a reforçar à sociedade e ao Governo do Estado o compromisso e a competência de seus servidores para auxiliar na construção de alternativas para superar aquele cenário de destruição” e sugerindo ações e medidas imediatas.

Entre elas a de iniciar imediatamente a análise da inscrição de imóveis no Cadastro Ambiental Rural (CAR), pelo menos em áreas especialmente protegidas, prioritárias para conservação ou em maior risco de desastres naturais. “Infelizmente não tivemos retorno”, comenta o presidente da Assema, Pablo Pereira, lembrando que o Rio Grande do Sul é um dos estados mais atrasados do país nas análises do CAR.

Os servidores propuseram também o melhor aproveitamento do quadro técnico da secretaria para implementar a regulamentação do Programa de Regularização Ambiental (PRA), pois há um expressivo passivo de adequação à legislação para áreas de preservação permanente (APP), de uso restrito e reserva legal. “O atraso em sua implementação fez com que se tenha deixado de exigir até o momento a recuperação de milhares de hectares, principalmente em áreas de maior risco, frente aos eventos climáticos que exercem importante papel na minimização de seus efeitos, como estiagens e enchentes”, aponta o documento.

Outro item identificado como prioridade pelos servidores foi a retomada do debate sobre a Política Estadual de Gestão de Riscos de Desastres, que já poderia ter sido encaminhada para apreciação da Assembleia Legislativa. Um dos argumentos é que o Brasil é signatário do Marco de Ação de Sendai para Redução do Risco de Desastres e existe uma proposta, que poderia ser aproveitada, construída com ampla participação popular e financiamento do Banco Mundial, que destinou R$ 670 mil em 2017 para a formulação do projeto, que poderia ter reduzido a gravidade dos estragos na situação que vivem os gaúchos agora.

A Assema ainda manifestou a necessidade de fortalecer a atuação dos Comitês de Bacia Hidrográfica, instrumentos da Política Estadual de Recursos Hídricos, que não recebem recursos para suas ações essenciais. Seus membros atuam totalmente de forma voluntária, o que distorce a representatividade dos comitês, com a presença desproporcional de pessoas que defendem interesses de empresas, por exemplo.

“Dinheiro do próprio bolso” dos trabalhadores na Defesa Civil

No início das chuvas deste ano, quando a água ainda não tinha atingido a região metropolitana de Porto Alegre, o Sindicato dos Técnicos Ambientais e Fundações (Semapi) publicou uma nota criticando o governo por priorizar o discurso – e não as ações – em relação à prevenção e adaptação à crise climática. De acordo com o sindicato, a falta de recursos muitas vezes obriga os trabalhadores das defesas civis a colocar “dinheiro do próprio bolso para resolver questões, o que é inconcebível”.

Ainda em 2023, o governo do Estado anunciou um orçamento de R$115 milhões para o enfrentamento de eventos climáticos. No entanto, o que não especificou foi que o valor é a soma total de recursos de três secretarias, do Corpo de Bombeiros e, por fim, a Defesa Civil, misturando esta última com toda política para eventos climáticos extremos. Já no Orçamento 2024 aprovado, o recurso relevante previsto é de R$ 2,5 milhões para qualificar o Centro de Operações da Defesa Civil – um valor que não chega nem perto do necessário para resolver as deficiências estruturais” , afirma o sindicato.

Outra solicitação que também não teve resposta da Sema, feita em novembro de 2023, veio da Rede Sul de Restauração Ecológica, uma iniciativa lançada em 2021 que conta com representantes da própria secretaria, entre mais de uma centena de integrantes de instituições públicas e privadas que trabalham na cadeia da restauração de ecossistemas florestais e campestres nos biomas Pampa e Mata Atlântica.

Em ofício enviado duas vezes para a Sema e uma para o governador Eduardo Leite, a Rede Sul se ofereceu para colaborar para a recuperação de áreas degradadas nos dois biomas, mas foi sumariamente ignorada. “Nos colocamos à disposição para contribuir com nossa expertise no processo de implementação do Tratado da Mata Atlântica no âmbito do Estado do Rio Grande do Sul; tratado este recentemente noticiado e firmado entre os representantes de sete Estados Brasileiros que compõem o Consórcio de Integração Sul e Sudeste (COSUD), com a perspectiva de plantio de mais de 100 milhões de árvores de espécies nativas”, dizia o ofício.

Essa inatividade da gestão estadual acaba por comprometer inclusive o cumprimento da já fragilizada legislação ambiental, como explica o promotor de justiça Sérgio Diefenbach, que acompanhou de perto as tragédias no Vale do Taquari. “Muitas vezes nós temos a expectativa de que a lei, por si só, resolva as situações. Precisa vontade política de implementação da lei e muitas vezes o Ministério Público é o propulsor da implementação desta lei”, diz.

Para Diefenbach, embora tenhamos uma das maiores estruturas de legislação ambiental do mundo, é difícil a implementação de algumas leis. “Nós ainda convivemos com uma legislação oscilante. Ou seja, conforme linhas de governo vão, alguns regramentos são amaciados e afrouxados. Em outros momentos, são criadas estruturas de maior rigor e fiscalização”, diz, usando como exemplo a legislação de recursos hídricos. “Isso não se resolve por ação judicial. É preciso criar uma consciência coletiva e de gestão da necessidade da existência deles.

O promotor destaca que o mesmo acontece com relação ao desmatamento, à disposição de resíduos sólidos e líquidos, na concessão de licenças e na fiscalização pelo estado, entre outras ações de controle. “Sem a presença forte de Estado fiscalizador por todos os seus entes, não há legislação que sobreviva”, conclui.

Para ele, as mudanças climáticas impõem um novo pensamento sobre a ordem das cidades. E isso é uma tarefa que envolve uma construção coletiva. Exigirá compreensão dos poderes legislativos, do Executivo, das forças econômicas. “Precisamos dar uma guinada de posicionamento nas nossas condutas. E a postura do Ministério Público é de contribuir para que isto aconteça.”