A crise provocada pelo vazamento de mensagens
entre o então juiz Sergio Moro e os procuradores da força-tarefa da Operação Lava Jato parece
longe do fim. Neste domingo, a Folha de S. Paulo
publicou, em parceria com o The Intercept, mais
uma reportagem com base em diálogo travado entre Moro e o procurador Deltan
Dellagnol, parte do acervo que o site diz ter recebido de uma fonte anônima.
© EVARISTO SA (AFP)
Moro durante audiência no Senado.
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Como nas reportagens
anteriores, o agora ministro do Governo Bolsonaro aparece repreendendo e
aconselhando Dellagnol a respeito de passos da investigação, conduta que se
choca com a previsão de juiz distanciado das partes no direito brasileiro. Os
diálogos, segundo as publicações, acontecem durante um capítulo emblemáticos da
Lava Jato, dias depois do movimento mais controverso e de mais impacto de Moro
até então: a divulgação de interceptações telefônicas entre Luiz Inácio Lula da
Silva e Dilma Rousseff que incendiaram as ruas do país e acelerariam a marcha
do impeachment.
Moro e os procuradores
têm atacado a publicação dos diálogos, que se deram via aplicativo Telegram, e têm dito que não podem garantir que as mensagens, que
segundo eles foram obtidas por hackers, não foram adulteradas. Seja
como for, a associação entre The Intercept e Folha,
que o jornal anuncia que seguirá nos próximos dias, dá mais voltagem política
ao material e debilita a estratégia do ministro de atacar a divulgação e a
própria reputação do site progressista.
O The Intercept diz que
procurou parceiros para análise dado o volume do material e rechaça ainda todas
as acusações de que suas reportagens buscam proteger o ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva. Já a Folha, o maior jornal brasileiro, afirma não
ter encontrado indícios de que o acervo fornecido pelo site tenha sido
adulterado e já havia advertido na semana passada que publicaria o material,
mesmo que se provasse que o pacote de mensagens é fruto da invasão dos
celulares —há uma investigação da Polícia Federal a respeito. O jornal
considera que a divulgação é de interesse público.
Na reportagem deste domingo, as
publicações exploram mensagens trocadas entre Moro e Dellagnol a partir de 23
de março de 2016. O então juiz parece preocupado com a repercussão negativa com
a divulgação das gravação de Lula e Dilma e todo um pacote de interceptações
envolvendo a família do ex-presidente, algumas sem qualquer ligação com as
investigações. Havia críticas pelo açodamento de Moro em divulgar os áudios
minutos depois de recebê-lo, especialmente por causa do trecho envolvendo
Dilma, que como presidenta tinha foro privilegiado, ou seja, fora da alçada de
Moro. Oytra crítica era o fato de que a captação se dera fora do período legal
autorizado. Moro havia sido advertido pelo ministro Teori Zavaski, então
relator da Lava Jato do Supremo, e também temia punições no âmbito do CNJ
(Conselho Nacional de Justiça), o que não aconteceu.
Foi neste contexto que ele avaliou
que a Lava Jato cometera "uma lambança". A Polícia Federal havia
permitido a divulgação de uma lista apreendida em escritórios da Odebrecht que
supostamente implicava parlamentares e outros políticos com foro privilegiado
em doações ilegais, o que levava o caso para a alçada do Supremo Tribunal
Federal.
"Não pode cometer esse tipo de erro agora", disse S Moro a Deltan Dalagnol. O procurador da Lava Jato busca animar Moro e promete apoio: "Faremos tudo o que for necessário para defender você de injustas acusações", escreveu. Em outro momento, Moro critica os "tontos" do MBL (Movimento Brasil Livre), um dos principais movimentos de defesa da Lava Jato e do impeachment de Dilma, por protestarem no condomínio do ministro Zavaski. "Isso não ajuda evidentemente".
Todos os holofotes no STF
A guerra política em torno do caso
nos próximos dias deve se dar em duas frentes principais: a política e a
jurídica. Na primeira, a oposição tentará manter viva a pressão sobre Moro para
coletar assinaturas para uma eventual investigação parlamentar sobre o caso,
algo que soa pouco provável à luz das revelações até agora. A segunda e mais
importante é o Supremo Tribunal Federal. Uma das duas turmas da corte prevê
analisar na próxima terça-feira um pedido da defesa do ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva, condenado por corrupção no âmbito da Lava Jato. Lula
reclama que não teve julgamento justo dada a parcialidade que atribui a Moro. A
equipe legal do petista já pediu que as revelações do The Intercept
sejam incorporadas.
Ainda não é certo que haverá
julgamento —os ministros do STF, como já fizeram em outras oportunidades,
sempre podem lançar mão de instrumentos legais para adiar a análise, apesar do
desgaste que o movimento provocaria em parte da opinião pública a essa altura.
Na sexta, a procuradora-geral, Raquel Dodge, já se antecipou tentando bloquear
a investida da defesa de Lula.
Ela destacou que "o material publicado pelo site The InterceptBrasil ainda não havia sido apresentado às autoridades públicas para que sua integridade seja aferida" e disse que ainda está sendo investigado se o vazamento foi criminoso. Em linha com Moro, Dodge diz ainda que não se sabe se as mensagens "foram corrompidas, adulteradas ou se procedem em sua inteireza, dos citados interlocutores".
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