Corregedoria do órgão determinou abertura de processos disciplinares contra Alexandre Bobadra na PGE, mas caso segue aguardando encaminhamento há mais de um ano
Alexandre Bobadra |
Um documento intitulado "relatório final", elaborado
pela comissão de sindicância número 140 da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe),
assinado em dezembro de 2019 e mantido em sigilo até então, apontou o possível
envolvimento do agente penitenciário e atual vereador porto-alegrense Alexandre
Bobadra (PSL) em supostas práticas de improbidade administrativa, peculato,
apropriação indébita, corrupção passiva e formação de quadrilha.
A
sindicância investiga, além de Bobadra, outros 12 servidores da
Susepe, todos eles por supostas atividades delituosas enquanto estiveram à
frente da direção do Sindicato dos Servidores Penitenciários do Rio Grande do
Sul (Amapergs-Sindicato). Constam, entre os possíveis delitos analisados pela
corregedoria da Susepe, a destinação indevida das contribuições dos associados,
ausência de atas de audiências de prestação de contas, transferências bancárias
sem justificativa e apropriação de recursos de honorários de processos
judiciais.
O denominado
"relatório final" da sindicância não individualiza as condutas nem
apresenta estimativa do eventual prejuízo causado pelo grupo ao caixa da
instituição sindical.
Bobadra atuou no Amapergs-Sindicato por mais de uma década, entre
2008 e 2020, conforme o currículo do vereador publicado no site da Câmara de
Vereadores de Porto Alegre. Neste período, exerceu cargos de tesoureiro-geral e
diretor-jurídico da instituição.
A
corregedoria da Susepe abriu a investigação interna após o recebimento de
denúncia feita por outro agente penitenciário que pertencia à mesma direção da
Amapergs. "É possível vislumbrar uma série de práticas graves na gestão da
instituição. (...) Demonstrada a materialidade das ilicitudes cometidas, sugiro
sejam os autos remetidos à Procuradoria-Geral do Estado (PGE), para fins de
instauração do Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD)", registrou
no relatório final a então corregedora penitenciária Denise Ferraresi, em 12 de
dezembro de 2019.
O PAD é
um procedimento que pode resultar em distintos desfechos, desde o arquivamento
do caso até a perda da função de servidor público. No dia seguinte à assinatura
do relatório final, em 13 de dezembro de 2019, a então corregedora-adjunta
penitenciária Renata Salgado emitiu despacho com considerações sobre o
relatório da sindicância.
"Verifica-se a presença de materialidade em desfavor dos implicados, cujas condutas descritas se apresentam revestidas de gravidade, considerando as práticas irregulares cometidas no âmbito da entidade sindical, as quais materializam crimes de apropriação indébita, peculato e prevaricação, entre outros. (...) Diante da magnitude das situações envolvidas, demonstrada a materialidade dos ilícitos e conhecidas as autorias, incontestável se apresenta a lesão aos princípios da administração pública (...). Determino a remessa do feito à PGE, com vistas à instauração do PAD", redigiu a corregedora-adjunta.
Semanas
depois, em 12 de março de 2020, a assessoria jurídica da Secretaria da
Administração Penitenciária (Seapen), controladora da Susepe, emitiu um parecer
para analisar os apontamentos da sindicância. Ao final, o documento recomendou
"adequações de minutas", o que consiste em ajustes burocráticos, e
concluiu que "não existe óbice ao prosseguimento" do caso. Contudo,
os autos não foram remetidos à PGE para a instauração de PADs contra os
suspeitos. Uma ordem interna sem data, assinado por um servidor do departamento
administrativo da Seapen, encaminhou a documentação de volta à corregedoria da
Susepe, que já havia atuado e publicado o "relatório final". O caso
permanece na corregedoria até os dias de hoje, mais de um ano depois, sem ter
sido encaminhado à PGE.
O
advogado Fabiano Barreto da Silva, defensor de Bobadra, afirmou que a
acusação é "totalmente mentirosa", manifestou convicção no
arquivamento do caso e avaliou que o denunciante original agiu por
"vingança" devido a desentendimentos sindicais (veja contraponto na íntegra ao final).
Procurada
pela reportagem, a Susepe emitiu nota no dia 13 de maio de 2021 para dizer que
a sindicância ainda não acabou, apesar de já terem transcorrido 18 meses da
publicação do denominado "relatório final" pela corregedoria e da
determinação de remessa à PGE. A Susepe ainda afirmou que, após a finalização
da investigação administrativa, o caso será remetido novamente à Seapen para
que ela decida se envia o processo à PGE. Em março de 2020, a assessoria
jurídica da Seapen já havia emitido parecer declarando que "não existe
óbice ao prosseguimento".
"A sindicância nº 140/2019 ainda não foi efetivamente concluída. O processo foi devolvido, na época, à corregedoria-geral para que fosse possibilitado o direito à ampla defesa dos envolvidos na fase de interrogatórios (já concluída) e na fase de instrução (apuração das provas - ainda em curso). Após a conclusão da sindicância, o processo volta para a Secretaria de Administração Penitenciária (Seapen), que decidirá se o mesmo será encaminhado à Procuradoria-Geral do Estado (PGE) para a instauração de Processo Administrativo Disciplinar (PAD)", informou, em nota, a Susepe.
Sem sucesso, suspeitos tentaram
anular sindicância na Justiça
O
vereador Alexandre Bobadra e outros 12 investigados recorreram ao Judiciário
para tentar anular a investigação administrativa e "excluir dos assentos
funcionais qualquer anotação relativa à sindicância". A alegação da defesa
foi de que as condutas descritas ocorreram na Amapergs, fora do âmbito da
administração pública, de modo que não caberia apuração da corregedoria da
Susepe. O pedido foi rejeitado em duas instâncias da Justiça e a sindicância
foi mantida.
"Resta esclarecido, em que pese tais fatos tenham ocorrido na esfera privada, tem relação com o serviço público. Veja-se que tais servidores somente estavam na gestão do sindicato em virtude do cargo que ocupam", reproduziu, em decisão emitida no dia 29 de março de 2021, o desembargador-relator Alexandre Mussoi Moreira, acompanhado por outros dois magistrados da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça ao negar o pedido dos investigados.
Atual gestão do Amapergs-Sindicato aprovou contratação de
auditoria
A atual
direção do Sindicato dos Servidores Penitenciários do Rio Grande do Sul
(Amapergs-Sindicato) assumiu em abril de 2020. O atual presidente do entidade,
Saulo Felipe Basso dos Santos, diz que a eleição da sua chapa representou a
"quebra do ciclo de um grupo que estava à frente da entidade há cerca de
20 anos".
Ele
afirmou que, na última assembleia, foi aprovada a contratação de um auditoria,
cujo objetivo será avaliar aspectos financeiros e administrativos do
Amapergs-Sindicato nos últimos anos. Santos afirmou que, recentemente, esteve
reunido com a corregedoria da Susepe para solicitar prioridade ao
encaminhamento definitivo da sindicância 140/19.
"Pedimos à corregedoria para que seja priorizado. Enquanto isso fica rolando de um lado para o outro, ficamos meio perdidos" — avaliou Santos, referindo-se aos atos da gestão anterior.
Contraponto
O
advogado Fabiano Barreto da Silva, defensor do vereador Alexandre Bobadra, se
manifestou em nota:
"Primeiramente, informo que não existe qualquer decisão ou
relatório final, eis que o expediente está em seu inicial momento, qual seja o
de oitiva dos investigados. Nem mesmo a instrução probatória (oitiva de
testemunhas) iniciou-se.
GZH, ainda em 2019, fez uma ampla investigação sobre exatamente
esta situação, a qual desde então não teve qualquer avanço significativo.
Ademais, a corregedoria apenas está investigando o caso por força
da solicitação da Procuradoria-Geral do Estado, que por seu turno solicitou o
trabalho porque recebeu uma denúncia e tem o dever legal e constitucional de
investigar.
No entanto e sem qualquer dúvida, a denúncia é totalmente mentirosa,
tanto que tão logo superada a questão na corregedoria e arquivado o expediente,
o que se tem a convicção que ocorrerá após o devido processo legal, uma série
de ações judiciais, cíveis e penais, serão manejadas por todos os
"denunciados" contra o denunciante.
Aliás, o denunciante apenas assim agiu por vingança, pois lavrou
acusações apenas contra os diretores do sindicato que haviam solicitado o seu
afastamento do cargo. O denunciante foi efetivamente afastado das funções,
tentou retornar com a tutela judicial e não lhe foi permitido o retorno, sendo
que inclusive até hoje é corréu em processos movidos pelo sindicato, os quais
buscam o ressarcimento dos prejuízos causados.
Por fim, respeitosamente informo que, ao contrário de outros
assuntos, neste, há o necessário sigilo, por natureza jurídica dos assuntos que
gravitam qualquer expediente na corregedoria e, também, por respeito às
inúmeras pessoas que estão injustamente respondendo tal expediente, as quais
grande parte, como inicialmente informado, são minhas
clientes/representadas."